Mais uma safra de trigo foi concluída. E apesar dos desafios enfrentados pelos produtores em diversas regiões, a safra de 2021 reservou resultados que marcam este ciclo. Nela, o país registrou a maior produção de trigo de sua história, com 7,8 milhões de toneladas do cereal. Em um ano de números crescentes para a cultura no Brasil, há de se destacar a constante superação por parte dos agricultores, especialmente no período em que o cereal está valorizado e em escassez no mercado local, fator que ajuda toda a cadeia tritícola.
Tratado como cultura marginal por longo período, o trigo vem ganhando papel protagonista nos últimos anos. A família Gomes, que cultiva trigo em Campinas do Sul (RS) desde a década de 1950, é um exemplo de como os triticultores vivenciaram momentos diferentes ao longo de décadas de produção do cereal. Atualmente, a propriedade da família é conduzida por Norberto, João Roberto e Manoel, três irmãos que, aos passos de seus pais, seguem investindo ano após ano na cultura. “Meu pai foi um dos primeiros da região a plantar trigo. Ele sempre foi uma pessoa pioneira e que gostava de investir em inovação. O trigo foi muito importante para a família. Tudo começou com ele”, afirma Manoel. Para o agricultor, uma das principais mudanças do início da história da família com o trigo foi em relação à comercialização. “Em meados dos anos 1980, tivemos épocas com problemas de vendas. Hoje em dia está melhor e no último ano os preços foram excelentes”, destaca Gomes.
O cenário de crescimento no preço do trigo foi um dos fatores que incentivaram a permanência da família na cultura. Além do destaque na composição da renda durante o ano agrícola, as vantagens agronômicas são fundamentais no planejamento das safras. “Estamos conscientes que queremos continuar plantando trigo, não apenas pela rotação de terra, como também pela maior facilidade de fazer a cultura sucessora”, pontua João Roberto Gomes. Casos como o da família Gomes e de tantas outras, que movem a cultura do cereal no país, ajudaram o Brasil a colher a maior safra de trigo da sua história. Segundo dados divulgados em dezembro pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) do Ministério da Agricultura, o Brasil produziu, na safra 2021, 25% a mais do que na safra anterior.
Em sintonia com o cenário nacional, a Emater/RS também estimou a maior produção de trigo da história do Rio Grande do Sul, com 3,4 milhões de toneladas. A área semeada, de 1,17 milhão de hectares, foi a segunda maior da última década. Já a produtividade média de trigo no Estado cresceu cerca de 31% em comparação à safra anterior, passando de 2.207 kg/ha na safra 2020, para 2.893 kg/ha em 2021.
Se na composição o cenário nacional mostra crescimento, é importante destacar que algumas regiões tiveram desafios durante a safra que se encerrou. No Paraná, por exemplo, a produção ficou abaixo do esperado, mas ainda assim apresentou números relevantes. “Havia a expectativa da produção recorde de quase 4 milhões de toneladas de trigo, porém com a ocorrência de alguns problemas climáticos, o Estado colheu 3,2 milhões de toneladas”, indica o analista de trigo do Departamento de Economia Rural do Paraná (Deral/PR), Carlos Hugo Godinho. Dentre os problemas que resultaram na redução do volume colhido, estão as chuvas em pré-colheita, vistas em algumas regiões, e a ocorrência de geadas. “Mas de maneira geral, a seca foi o fator mais impactante dessa safra”, destaca Godinho.
De acordo com o gerente comercial para a América Latina da Biotrigo Genética, Fernando Michel Wagner, as regiões mais quentes do Brasil que semeiam trigo em sequeiro tiveram na falta de chuvas o maior desafio dessa safra. “Além de algumas regiões do Paraná, esse cenário se repetiu no Cerrado, oeste de Santa Catarina e noroeste do Rio Grande do Sul. Junto à falta de chuvas, algumas regiões registraram excesso de umidade durante o florescimento da cultura, tendo a ocorrência de giberela, o que exigiu esforços extras no beneficiamento dos grãos e, em consequência, na comercialização”, afirma.
As regiões do Planalto Médio e dos Campos de Cima da Serra, no Rio Grande do Sul, de Campos Novos, em Santa Catarina, e de Campos Gerais e sudoeste, no Paraná, foram fundamentais para que o Brasil atingisse essa safra recorde. A união do clima adequado, manejo ajustado e genética de alto potencial construíram um cenário perfeito, levando as regiões à colheita de uma safra histórica. “Apesar de termos tido algumas regiões com colheitas abaixo do esperado, justificado pelas geadas e seca, a avaliação geral é positiva. Perder uma safra é algo frustrante para a cadeia como um todo e, mesmo com intercorrências, a comercialização desta safra segue em ritmo acelerado e em ótimos patamares”, aponta. Conforme Wagner, mesmo com os custos de todas as culturas em patamares superiores comparados ao ciclo que se encerra, o triticultor teve mostras da importância que o cereal tem na composição de sua renda. “Com um cenário de dúvidas na safra corrente de soja e milho verão, o trigo deve seguir como opção firme para 2022”, finaliza.