Chuvas provocam impactos na bacia leiteira da região

Com queda no número de propriedades desde 2014, agricultores enfrentam dificuldades para manutenção da produtividade dos animais

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A maioria dos animais tem como sistema predominante de produção o pasto com complementação de silagem, pré-secado e farelo de soja e milho. (Foto: Isabel Gewehr)A maioria dos animais tem como sistema predominante de produção o pasto com complementação de silagem, pré-secado e farelo de soja e milho. (Foto: Isabel Gewehr)
A maioria dos animais tem como sistema predominante de produção o pasto com complementação de silagem, pré-secado e farelo de soja e milho. (Foto: Isabel Gewehr)
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Gradualmente a agricultura se afasta dos reflexos da estiagem que atingiu o Estado no último verão. No mesmo passo, atividades como a da produção leiteira são afetadas com o retorno expressivo das chuvas na região de Passo Fundo. Segundo o relatório socioeconômico da cadeia produtiva do leite no Rio Grande do Sul, publicado em 2021, nos 42 municípios pertencentes à região o leite está em 34% das propriedades como uma atividade econômica, número que vem diminuindo ano a ano desde 2014.


Impacto das chuvas 

Até o ano passado, 113.870 animais eram ordenhados na região de Passo Fundo, desses, 95,75% tinham como sistema predominante de produção o pasto com complementação. É por isso que o acumulado de chuvas dos últimos dias acionou alertas para a bacia leiteira, devido aos prejuízos a curto e médio prazo que o excesso de água e umidade provocam nas pastagens. “O que acontece é que onde você tem a necessidade de fazer o pastoreio e se tem excesso de umidade no solo, isso deixa a planta mais suscetível ao animal, no momento do pastoreio, arrancar essas plantas”, explicou o extensionista rural da Emater RS, Vilmar Leitzke, pontuando que com isso ocorre a redução das pastagens e a quantidade de plantas por hectare, o que deve afetar o próximo ciclo de pastoreio, que dura cerca de 30 dias.

No entanto, a médio prazo, a perda mais significativa acontece pela lixiviação, quando a força da água faz a lavagem superficial dos fertilizantes. Nesse processo há a retirada dos nutrientes da planta, como o nitrogênio, fósforo e potássio, que possuem um alto custo de aplicação. “Produtores que fizeram aplicação dois a três dias antes da chuva, acabaram perdendo todo esse nutriente e terão que refazer a aplicação. Isso atrasa em cerca de 10 dias o pastoreio e por outro lado aumenta o custo de produção”, disse o extensionista rural, ressaltando, além disso, a pausa no crescimento das pastagens, dada a menor incidência de luz nos dias chuvosos e a necessidade do sol para o desenvolvimento pleno das plantas.


Dois anos guiados pelo sol 

Os percalços dentro da atividade leiteira remontam desde o verão 2020/21, onde a produção de alimento conservado começou a ser prejudicada devido a falta de chuvas para as lavouras de soja e milho. “Temos que pensar que produzimos alimento conversado, incluindo a silagem e o pré-secado, no período de verão para armazenarmos para o período de inverno. Nos últimos dois anos, a nossa silagem não tem conseguido produzir seu máximo potencial”, esclareceu Vilmar. Tanto a qualidade quanto a quantidade dos alimentos conversados produzidos foram comprometidas, o que passa a refletir na alimentação dos animais no período do inverno. “E a silagem é um componente importante no sistema de alimentação”, relembrou o extensionista. 

Esse cenário coloca o produtor de leite em uma gangorra, se equilibrando para manter os índices de produção e produtividade altos, o que exige muito trabalho e manobras para se organizar. “O produtor tem que buscar e sempre dizemos que ele tem que diminuir o custo de produção, mas na atividade leiteira isso nem sempre funciona”, refletiu Vilmar Leitzke. Isso acontece porque a primeira resposta à redução de custos de produção no leite seria o corte nos insumos mais caros, ou seja, na alimentação. No entanto, reduzir a alimentação passa a interferir a longo prazo em aspectos produtivos do animal. “Então eu preciso utilizar com eficiência os recursos e tentar buscar possibilidades que otimizem o meu sistema, para fazer esses ajustes e tirar o máximo dos meus animais”, disse o extensionista rural da Emater. 


Queda no número de produtores de leite

Porém, isso não é fácil para os 5.758 produtores que fazem a comercialização do leite na região de Passo Fundo. Desses, 95,8% são agricultores familiares. “São produtores que estão ali no limiar. Para dar um passo a mais, eles teriam que fazer grandes investimentos em infraestrutura, animais, equipamentos e inclusive contratação de mão de obra”, pontuou Vilmar. 

Esse cenário reflete na redução do número de produtores de leite de baixa litragem e na permanência dos mais capitalizados. Nesse sentido, tem-se observado que apesar dessa queda, o número de vacas em lactação e de produção de leite no Rio Grande tem se mantido. Conforme o relatório socioeconômico da cadeia produtiva do leite no Rio Grande do Sul de 2021, são produzidos anualmente cerca de 4,4 bilhões de litros de leite, incluindo produtores que vendem o leite para indústria, comercializam diretamente, produzem apenas para o consumo familiar, entre outros. Na região de Passo Fundo são mais de 582,5 milhões de litros de leite. 

A desistência dos produtores é atrelada a diferentes fatores do custo de produção como a alimentação, visto que os animais precisam, além da pastagem, da complementação com a soja e o milho, produtos que têm apresentado preço elevado no mercado. Somado a isso, tem-se a subida dos fertilizantes necessários para as lavouras e os custos associados à energia, como o petróleo e a energia elétrica. “A nossa produção é maior do que o nosso consumo e o Brasil não é exportador, então nós dependemos também dos fluxos da economia para que o consumo seja mantido”, apontou Vilmar Leitzke, acrescentando que o RS acaba dependendo da venda para outros estados, o que torna esse um embate entre a pressão dos custos de produção e a questão econômica brasileira.

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