O endividamento da família brasileira é crescente, apesar da diminuição dos juros, e ainda há um estoque considerável de dívidas de longo prazo, o que “inviabiliza a substituição” de bens de consumo durável na velocidade que o governo imagina para girar o mercado e alavancar o crescimento da economia. Mesmo se considerando as reduções de tributos nas compras de carros, de produtos da linha branca e de material de construção, de acordo com diagnóstico do professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), Roberto Bocaccio Piscitelli.
Ele cita números do Banco Central (BC) segundo os quais a evolução do crédito foi 18,3% nos 12 meses encerrados em maio último, impulsionada principalmente pela tomada de empréstimos pessoais. “Foi um crescimento bastante acelerado”, no seu entender, mas ressalta que tal dinâmica só tem sustentação em um processo de crescimento econômico, com geração de emprego e renda. Ele acha, no entanto, que “as dificuldades tendem a aumentar nas atuais circunstâncias”, como sinaliza o alto nível de inadimplência, que hoje é 8% nos atrasos com mais de 90 dias.
O professor da UnB até admite a incorporação de novos contingentes da população entre os consumidores de bens duráveis (automóveis, máquina de lavar roupa, fogão e outros), mas ressalta que isso ocorrerá de forma residual. O potencial de expandir essa categoria de consumidores “está quase esgotado”, segundo ele. Além disso, lembra que o aumento da inadimplência deixou as instituições privadas (bancos e lojas) mais “seletivas” na classificação dos mutuários, e em função disso reduzem prazos e exigem maiores parcelas de entrada nos financiamentos.
Embora a oferta de crédito tenha crescido bastante, a ponto de a contratação equivaler, atualmente, a 50,1% do Produto Interno Bruto (PIB), soma das riquezas produzidas no país, Piscitelli ressalta que o crescimento sustentável da economia carece muito mais que crédito. Precisa de políticas duradouras, abrangentes, de reforma tributária e de mais investimentos em infraestrutura, em educação e em inovação, dentre outros.
Ele diz que o brasileiro está cansando de tantos “pacotes” de privilégios recorrentes aos lobbies mais poderosos, em detrimento de outros setores da atividade produtiva. Segundo Piscitelli, “o arsenal de renúncias fiscais e de créditos subsidiados têm alto custo social, são aleatórios e injustos, não têm contrapartidas e desorganizam ainda mais o já caótico sistema tributário”. O professor disse ainda que vê “nuvens carregadas” no horizonte, e lembrou que “a conta será paga pelos mesmos de sempre”.
Especialista em macroeconomia, a professora Sílvia Matos, da Fundação Getulio Vargas (FGV), também manifesta ceticismo em relação ao impulso esperado do crédito no consumo. Ela diz que a pessoa física está muito endividada, pois, apesar dos juros terem cedido um pouco, o brasileiro está “pendurado” nas modalidades de crédito mais caras como o cartão de crédito e o cheque especial.
Com informações da Agência Brasil