Mesmo com “todos os elementos de um sistema de inovação desenvolvido”, o Brasil ainda encontra dificuldade para interconectá-los e definir uma agenda estratégica de longo prazo para as áreas de educação, pesquisa, produção, inovação e financiamento. A constatação faz parte de estudo apresentado nesta quarta-feira (6) pela economista e PhD ítalo-americana Mariana Mazzucato ao ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Celso Pansera.
A dificuldade de interação foi identificada nas relações entre organizações públicas e privadas e entre elas mesmas. Segundo Mariana, há ineficiências nos sistemas de política e de regulação que precisam de ações legislativas para que possam ser superadas. “Parece não haver confiança entre cada uma dessas partes, aqui no Brasil”, disse a economista.
De acordo com o estudo, intitulado The Brazilian Innovation System: A Mission-Oriented Policy Proposal, o país já conta com um sistema de inovação desenvolvido, que inclui instituições-chave em todos os seus subsistemas. "No entanto, o país ainda não conta com uma agenda estratégica consistente, de longo prazo, que dê coerência às políticas públicas, e que oriente a pesquisa científica e os agentes privados em seus esforços para a inovação", afirmou.
Para a pesquisadora, a dificuldades da população brasileira, hoje, são campo fértil para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras. Uma das recomendações é que os desafios do país devem ser concebidos de forma a contribuir para o combate à desigualdade social. O que, ressaltou, já vinha sendo observado no Brasil, mas acabou sendo prejudicado nos últimos anos, devido à atual crise política.
“Algumas pessoas disseram que este é o pior período pelo qual o país passou nos últimos anos. Para mim, trata-se do melhor momento para crescer e aumentar os investimentos. O momento é difícil, mas, digo a vocês, a razão que há três anos me despertou para o Brasil foi a de ser um dos poucos países que conseguiram conciliar desenvolvimento com crescimento inclusivo. Isso chamou muito a atenção”, disse Mariana Mazzucato, após criticar o que chamou de “obsessão" de países europeus pelo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) “sem que haja retorno para as pessoas”.
Ela destacou como "característica negativa" a falta de investimentos privados, o que resulta na necessidade de o Estado ter que cumprir tal papel por meio de órgãos como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes). Mas isso, acrescentou, também tem sido prejudicado após tantas denúncias de corrupção.
“O Brasil carece de investimentos privados [no setor de inovação], e isso aumentou com a crise [pela qual passa o país]. O setor público investe, mas isso também foi prejudicado em decorrência das denúncias de corrupção. Para focar na inovação, que é necessária ao país, temos que promover uma discussão horizontal, visando a uma agenda inclusiva, porque investimentos são inevitáveis e precisam ser feitos. O problema é que, em situações de crise, sempre aparecem economistas defendendo cortes na parte de baixo [da pirâmide social]”, disse.
Segundo o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Celso Pansera, o estudo “consolida a sensação” que já vinha sendo percebida pelas autoridades brasileiras. “Temos, agora, que identificar o que faz algumas políticas darem certo e outras não, e a partir daí copiar as que dão certo”, disse. “E, à luz do estudo, vamos escolher as políticas a desenvolver nos próximos anos e torcer para que essa estratégia não seja paralisada. O desafio, agora, é subir o nível de investimento da iniciativa privada”, acrescentou.
Encomendado pelo ministério, e envolvendo parceria do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) com a Universidade de Sussex (EUA), o estudo avaliou uma série de iniciativas de incentivo à inovação implementadas nos últimos anos pelo governo federal, com destaque para programas como Inova Empresa. Segundo a pesquisadora, este programa representa “um exemplo positivo” de política orientada por missões, ao ser lançado com forte articulação entre ministérios, agências e demais instituições, com o objetivo de impulsionar a economia e elevar a produtividade.
Agência Brasil