Bruno Todero e Daiane Colla/ON
O afastamento de Adelar Aguiar da secretaria municipal de Transporte, Mobilidade Urbana e Segurança (STMUS), na última segunda-feira, mexeu nas bases do Partido dos Trabalhadores em Passo Fundo. Apesar de a executiva não declarar abertamente, a decisão do prefeito Airton Dipp pode provocar a adoção de uma nova postura por parte dos petistas no restante do período em que a atual gestão (PDT/PT) comandará o município. Pelo menos foi isso o que deixou transparecer o presidente do diretório municipal, Sebastião dos Santos, durante entrevista coletiva concedida na manhã de ontem. Quando perguntado se o afastamento de Adelar iria levar o PT a iniciar um momento de maior vigilância com relação ao governo Dipp, Sebastião respondeu que a própria pergunta era uma afirmação.
Antes disso, porém, o presidente do partido fora perguntado se o fato poderia causar ruptura entre o PT e a base do governo. Sebastião respondeu que não, e foi além, garantindo que a situação motivaria a ampliação do debate entre o PT e o governo. “Este é um fato que pode sim motivar um debate qualificado, que pode aproximar o partido ainda mais da administração. Falar em ruptura seria dizer que nós estamos atirando a corda. Isso jamais nós vamos fazer”, assinalou.
A coletiva foi marcada, porém, por outra declaração, a do próprio Adelar Aguiar, que reafirmou tudo aquilo que disse a reportagem de ON no final de semana e creditou a sua franqueza o motivo do afastamento. “Não fui afastado por qualquer ato, por incapacidade de gestão ou por incapacidade de gerenciar todos os espaços da secretaria. Fui afastado porque expressei uma opinião. Num governo democrático, penso que expressar opinião tem de ser um direito legítimo dos gestores, sejam secretários ou não. Qualquer governo democrático não pode encarar isso como uma afronta a autoridade do prefeito”, afirmou.
Partido não concorda com decisão
Logo no início da entrevista, o presidente do partido afirmou que o PT entendeu a decisão do prefeito, mas que não concordava com tal atitude. Para Sebastião, o ex-secretário Adelar, enquanto homem público, “sempre cumpriu bem seu papel”. “O partido dos trabalhadores entende a decisão do prefeito, mas é necessário reafirmar que não concordamos”.
Sebastião criticou ainda a forma como o processo de afastamento foi conduzido, tendo sido o PT apenas comunicado da decisão. “Foi uma demissão sumária, sem diálogo. Enquanto instituição partidária, fomos comunicados do ato, não fomos consultados”, revelou. O líder dos petistas também assinalou que o então secretário Adelar pode ter sido mal interpretado em suas falas, principalmente pelas pessoas que sentem-se atingidas. Mesmo sem ter citado nomes, Sebastião fazia com essa colocação referência ao ex-secretário e atual vereador José Eurides de Moraes (PSB), para quem a maioria das críticas feitas por Adelar Aguiar na entrevista que culminou na sua demissão foram dirigidas. “Quero dizer que respeitamos e não desautorizamos o conteúdo da fala do companheiro Adelar na imprensa. Agora, as interpretações são livres, e são muito mais daqueles que sentem-se atingidos”, disse o presidente do partido.
Assim como havia declarado na segunda-feira, Sebastião voltou a afirmar que o partido não abre mão da direção da STMUS. Ele surpreendeu, porém, ao revelar que tem a garantia do prefeito Dipp de que, em menos de um mês, o cargo será novamente ocupado por alguém indicado pelo PT. “Prefeito nos garantiu que falará a imprensa que o (Ermindo) Simonetti é secretário interino. Não vamos esperar mais do que 30 dias para retomarmos este espaço na administração, pois quando assumimos a composição assumimos obrigação administrativa em setores, e este é um setor que nos interessa contribuir com a comunidade”, disse Sebastião. Quanto a nomes para ocupar o cargo, manifestou-se apenas dizendo que o partido tem várias opções com capacidade para assumir a secretaria.
“Paguei por falar a verdade”
Após a fala do presidente do partido, o ex-secretário Adelar Aguiar atendeu aos questionamentos da imprensa. Acompanhe:
1 - Quando o senhor concedeu a entrevista ao jornal, sabia que teria essa repercussão?
Adelar Aguiar – Dei a entrevista justamente na intenção de construir paradigma de um processo que se deu antes de eu assumir a secretaria para um novo processo que nós estávamos prestes a desenvolver na cidade. Era justamente na perspectiva de um corte objetivo e final naquilo que tinha representado a gestão do ex-secretário que saiu da secretaria e assumiu a câmara (José Eurides). Nunca pensei em atacar a administração e muito menos o prefeito. Apenas reagi a um conjunto de críticas feita pelo ex-secretário à nossa postura dentro da secretaria. Pagamos um preço muito alto por uma ação que não era originariamente nossa. E o pior disso tudo é que, na Câmara de Vereadores, nós tínhamos por parte do ex-secretário uma oposição mais ferrenha do que dos próprios oposicionistas. Isso foi demonstrado claramente e está provado nos meios de comunicação, especialmente em alguns veículos de comunicação (O Nacional) onde o ex-secretário fez tour pela cidade apontando o que ele achava que estava errado e o que tinha que ser feito. Como se ele não tivesse sido secretário por quatro anos. Isso foi levado ao prefeito Dipp, foi levado ao presidente do PDT na época, o atual secretário Bilibio, para que governo desse uma resposta àquilo, porque era um absurdo do ponto de vista da gestão. Neste momento qual foi a postura? O governo disse para deixar como estava. É evidente que a minha entrevista era para dar um corte final nisso. Mostrar que o PT não poderia ficar com esse débito que não era dele. Não poderíamos sair daquele processo para assumir um novo processo com um ônus nas costas de que foi o PT que implantou o sistema de monitoramento.
Agora reafirmamos o que dissemos ao jornal: que a recuperação das vias auxiliares, das vias alternativas, era fundamental para que pudéssemos implementar o sistema de monitoramento. E foi feito o contrário. Foi instalado monitoramento eletrônico antes. Punimos a população sem que ela tivesse recebido qualquer melhoria ou alternativa de melhoria na sua mobilidade. Porque na medida em que eu monitorei as principais vias da cidade, e não melhorei as vias alternativas, automaticamente eu joguei a população em um brete. Isto não é mobilidade urbana. Eu saio da secretaria não porque cometi algum deslize, por incapacidade administrativa, eu só saio da secretaria porque falei. E a pergunta eu faço: qual é o crime que eu cometi?
2 - O senhor acredita que o seu afastamento pode representar a ruptura entre o PT e o governo?
AA – O PT já se manifestou dessa forma e eu estou reafirmando que não existe qualquer condição de ruptura dentro do governo. Agora, a postura do prefeito de me afastar, de forma sumária, sem discutir nem com o vice (Rene Cecconello, também do PT), sem chamar partido para aprofundar tema, tudo isso gera por parte do PT uma preocupação em relação ao governo. Nos perguntamos como é a relação? É recíproca a respeitabilidade ou não? Ou o PT foi convidado a ser vice só pelos belos olhos do Cecconello? Não. Foi convidado porque tinha um partido, porque tinha relação com governo federal. Olha para essa cidade, quais são os recursos que estão aqui? São recursos federais que estão aqui em vários programas. Foi por isso que o Dipp quis o Cecconello como vice. Porque tinha um partido por trás, porque tinha um governo por trás. Dizer que continua a mesma coisa, não podemos, não é a mesma coisa que antes. Foi uma atitude unilateral e única do prefeito. Tem legitimidade para isso? Tem. Agora que esbarra numa relação política complicada esbarra, porque o partido atingido é o partido do vice-prefeito.
3 – O senhor reconhece que foi infeliz nas declarações?
AA - Infeliz eu estou pelas conseqüências que a entrevista causou. Não estou arrependido do que eu falei, porque falei a pura verdade. Repito que em nenhum momento quis desconstituir o prefeito e a administração. Se eu soubesse o que iria acontecer, eu jamais teria dado essa entrevista.
?EURoeNão saio por incapacidade, saio porque falei?EUR?
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