Marina de Campos
"Agora eu tive as melhores horas da minha vida." Pode parecer muito, mas quando eles começaram a tocar (I've had) The time of my life, trilha do filme Dirty Dancing, não era preciso que alguém dissesse de que falava a letra. Cada um daqueles pares de olhos compenetrados no próprio instrumento, mas que de vez em quando se erguiam para o público timidamente, escapando junto um sorriso infantil mesmo nos rostos mais crescidos, cada uma daquelas expressões dizia simplesmente: "Essa é a chance da minha vida, as melhores horas da minha vida", sendo quase possível ouvir no fundo de toda aquela fusão de sons a voz de Bill Medley e Jennifer Warnes, como na emocionante cena final do filme de 1987. Não bastasse isso, provavelmente a menina mais nova a integrar a orquestra desceu de sua cadeira e veio até a beira do palco chamar a plateia para acompanhá-la com palmas, destruindo qualquer chance de indiferença da parte de quem assistia. Pronto, o show estava feito.
E o mais incrível desta noite de terça-feira foi, justamente, o fato de ambas apresentações não terem sido especiais apenas pela história de vida que cada uma daquelas crianças carrega, mas sim pelo verdadeiro espetáculo que proporcionaram, um show de boa música livre de erros ou mesmo execuções medianas, uma reunião de jovens cheios de talento e todas as possibilidades indicando um futuro brilhante, através da música ou do que for. Quem, talvez, esperasse aplaudir as apresentações da Orquestra Beija-Flor do Lar Emiliano Lopes e da Banda do programa Bombeiro Mirim somente ou mais por incentivo, se surpreendeu: aplaudiu de pé com toda a admiração que é possível, como aplaudiria um espetáculo profissional, pouco acreditando na energia do que ouvia e no milagre que acontece quando alguém aposta na cultura como agente transformador.
Provavelmente o ponto alto da programação da Prefeitura Municipal em comemoração aos 153 anos de Passo Fundo, o concerto intitulado Tocando a vida representou, sim, um dos melhores momentos da vida de muita gente, como diz a música. Era o que afirmavam os olhos cheios de lágrimas da primeira menina na primeira fila, tentando se concentrar no violino e não pensar no que estava acontecendo, como também faziam alguns na plateia tentando fugir do constrangimento de chorar. Do contrário ela não teria colocado seus melhores sapatos, convidado seus pais ou quem quer que tenha apreço, ensaiado incansavelmente nos dias anteriores e feito daquela a melhor apresentação da sua vida. Ela, assim como todos da orquestra Beija-Flor e também o maestro Rodrigo Ávila, um dos grandes responsáveis pela qualidade do show. Assim como Giu Sanderi, maestro da Banda Bombeiro Mirim, que deixou sem palavras o público quando iniciou um duelo que se tornou gigante desafio musical com a luta entre sax, trombone, trompete e quem mais aceitasse a briga, na música Mercy, Mercy, Mercy. No palco, a disputa; na plateia, o delírio. Um acontecimento, como disse Ávila antes mesmo de terça, para ficar na história de Passo Fundo. O aniversário é do município, mas - e quem esteve lá sabe - são eles que merecem o parabéns.