Presídio tem mais presos hoje do que quando foi interditado

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Nova tentativa de fuga recoloca em evidência a superlotação da casa prisional, hoje com 854 apenados. Nova lei das execuções penais, em vigor desde 2007, pode ter ajudado a inflar a massa carcerária e exaltar o clima de tensão entre os presos

Bruno Todero/ON


Uma bomba prestes a explodir. Assim pode ser resumida a situação de momento do Presídio Regional de Passo Fundo. Projetado para abrigar, no regime fechado, 300 presos, conta hoje com 639. Somam-se a esses os 215 detentos dos regimes aberto e semiaberto para se chegar ao contingente atual, de 854 presos, em um espaço destinado para 407 vagas. A lotação é maior inclusive do que a registrada no ano passado, quando, em março, a Justiça local decidiu pela interdição da casa prisional, que ficou impedida, pelo período de três meses, de receber novos presos. Na época, o número de vagas era de 287 no regime fechado e 140 no semiaberto, com uma população total de aproximadamente 740 detentos.

As fugas e tentativas de fugas registradas neste ano – foram cinco somente de julho para cá – dão a dimensão exata do problema que está sendo até agora administrado pela direção da casa, agentes penitenciários, Brigada Militar e Delegacia Penitenciária Regional. O próprio delegado regional da Susepe, João Carlos de Oliveira, afirma que a qualquer momento uma situação mais grave pode acontecer. Ele cita como exemplo o último tumulto, registrado neste domingo (22), quando vários presos tentaram fugir e promoveram um princípio de motim no pátio da casa prisional.

“A situação só foi contornada devido ao trabalho dos agentes penitenciários e da Brigada”, afirma Oliveira, que garante que estão sendo tomadas providências no sentido de coibir novas confusões. A primeira delas foi a transferência, naquele mesmo dia, de 15 presos - alguns deles envolvidos na confusão de domingo e outros identificados como lideranças negativas - para a Penitenciária Modulada de Charqueadas. “Devido a superlotação, qualquer trabalho fica prejudicado”, reconhece o delegado.
A direção do Presídio e a delegacia regional também estudam uma medida para melhor distribuir o número de visitantes que entram na casa prisional nos dias permitidos. Atualmente, a média fica entre 250 e 300 pessoas, a maioria familiares. De acordo com o delegado, esse aumento populacional acarreta em uma dificuldade maior de atuação em caso de confusão ou conflito no interior da casa. A alternativa que está sendo estudada é fracionar as visitas em mais dias da semana.
 
Faltam 1,3 mil vagas na região
Apesar de o maior problema estar na cidade, a superlotação não é exclusividade do Presídio de Passo Fundo. É o que mostram os números da 4ª Delegacia Penitenciária, responsável por 10 casas prisionais localizadas na região Norte do Estado. Os números impressionam: existem 2.520 presos nas 10 cadeias, mais do que o dobro de vagas: 1239. O déficit atualmente é de quase 1.300 postos. “A construção da nova Penitenciária ajudaria e muito a amenizar o nosso problema”, afirma o delegado João Carlos.

Nova lei inflou o sistema
Para o advogado Eduardo Foscarin Pedroso, da Defensoria Pública de Passo Fundo, a alteração da Lei das Execuções Penais (LEP), ocorrida em março de 2007, está contribuindo para o caos do sistema carcerário, que, segundo ele, não é característica apenas do Rio Grande do Sul, mas da maioria dos estados do Brasil. A lei a que se refere o advogado é a nº 11.464/2007, em vigor desde 27 de março daquele ano, que mudou as regras para progressão de regime para presos condenados por crimes hediondos ou equiparados a hediondos, como homicídio e tráfico de drogas.
Antes da alteração, o apenado cumpria 1/6 (16%) da pena e podia ser beneficiado com a transferência ao regime semiaberto, voltando para as ruas. Hoje, se o mesmo apenado for réu primário, precisa cumprir 2/5 (40%) da pena para progredir de regime, e 3/5 (60%) se for reincidente. Pedroso cita como exemplo um apenado com condenação de 12 anos de reclusão por homicídio. Antes da alteração da LEP, ele passaria ao semiaberto em dois anos e dois meses. Com a nova lei, se o preso é primário, tem de cumprir quatro anos e oito meses. Se for reincidente, é obrigado a permanecer fechado por sete anos e dois meses. “A mudança na Lei, além de ter provocado o inchamento dos presídios, provoca revolta nos próprios presos, que são obrigados a permanecer muito mais tempo no regime fechado”, explica o defensor público. “Motins e rebeliões eram menos comuns porque antes da mudança na lei a rotatividade nas casas prisionais era muito maior”, completa Pedroso.

Projeção é alarmante
Especificamente sobre o caso do Presídio de Passo Fundo, Pedroso revela que a sequência de fugas expõe a instabilidade da casa. “Pela situação de superlotação em que se encontra o presídio, está demorando a acontecer algo ainda mais grave”, afirma. O advogado projeta que, se a nova Penitenciária Estadual de Passo Fundo não sair do papel, o cenário poderá ficar ainda pior. “Se não sair o novo presídio ou novas vagas não forem criadas no Estado, logo vai chegar o momento em que a Susepe não terá mais onde empilhar novos presos”, prevê o defensor público.

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