Natália Fávero/ON
A comercialização do leite in natura está com os dias contados. A partir do dia 1º de setembro não será mais permitido vender o produto em Passo Fundo. Os agricultores foram comunicados ontem da determinação por meio de ofício da Secretaria do Interior. A proibição está prevista desde 1969, através do Decreto-Lei nº 923, mas ela nunca foi fiscalizada efetivamente no município. Em fevereiro, a prefeitura e o Conselho Municipal de Desenvolvimento Agrário (CMDA) deram um prazo de seis meses para adequação à legislação, que autoriza a venda apenas se o leite for pasteurizado. Quem descumprir estará sujeito a penalidades. Essa proibição está provocando polêmica entre os produtores e o descontentamento dos clientes.
O leite in natura, mais conhecido pela comunidade como "leite de vaca" ou "cru", geralmente é vendido em garrafas pet, direto nas casas ou na Feira do Produtor em Passo Fundo. Especialistas afirmam que esse leite não é próprio para o consumo humano.
Os leiteiros da Feira do Produtor, na Gare, estão preocupados. Cada um chega a vender entre 300 a 500 litros a cada feira realizada três vezes por semana. A alternativa será comercializar para as cooperativas que fazem a pasteurização. No entanto, os produtores explicaram que na feira, o litro é vendido a R$ 1,00 e as cooperativas pagam R$ 0,53. O leiteiro Rogério Macedo vende o leite in natura há 13 anos na feira e disse que os prejuízos serão significativos. "Vamos ter que entregar para uma empresa ou cooperativa para pasteurizar, mas eles pagam muito pouco comparado com o que ganhamos aqui. Mas, vamos ter que cumprir a lei", disse Macedo.
O leiteiro Milton Wilhen disse que as perdas financeiras chegarão a 50% com a proibição e também enfatizou que o prazo de seis meses concedido pela prefeitura para a adequação foi insuficiente. "Eles estão obrigando a pasteurização para acabar com os produtores. Precisaríamos no mínimo, de dois anos para mudar o sistema de produção", argumentou o leiteiro.
Os consumidores da feira não aprovaram a proibição. Maria Helena Ficanha compra toda semana 12 litros e afirmou que nunca fez mal. "Ele é limpinho e gostoso. Tenho filhos e netos que consomem apenas esse leite. Sentirei falta. Se não tiver outra opção vou ter que comprar os de caixinha, mas não será a mesma coisa", lamentou Maria.
Infratores poderão ser autuados
Segundo o secretário de Interior, Décio Ramos de Lima, a lei existe há muitos anos, mas não era fiscalizada porque não havia empresas capacitadas para beneficiar o leite in natura. Atualmente, o mercado oferece esse serviço. Lima disse que o prazo concedido aos produtores de leite para adequação foi um discutido e aceito pelos produtores, representantes e sindicato da categoria, registrado em ata. "É nossa obrigação cumprir com a lei. Os especialistas afirmam que o leite in natura contaminado pode trazer danos à saúde das pessoas", explicou o secretário. Lima enfatizou que a partir do dia 1º de setembro, haverá fiscalização e aqueles que descumprirem a lei terão o produto recolhido e poderão ser autuados.
Leite in natura pode ser prejudicial à saúde
Segundo o médico-veterinário, professor da Universidade de Passo Fundo e coordenador do Serviço de Análises de Rebanhos Leiteiros (Sarle), Carlos Bondan, o leite in natura pode trazer danos à saúde por três motivos principais. Segundo ele, esse tipo de leite pode ser adulterado, conter resíduos de medicamentos utilizados para o tratamento dos animais ou transmitir doenças.
Bondan explicou que pelo leite in natura ser fluído, ele pode ser facilmente adulterado através de diversos métodos. O mais comum é adicionar água para aumentar o volume do produto. "Caso essa água esteja contaminada com microorganismos, poderá provocar distúrbios gastrointestinais e outros danos, podendo levar, inclusive, ao óbito", explicou o especialista.
Outro problema é a possibilidade desse leite conter resíduos de medicamentos utilizados para o tratamento dos animais, como os antibióticos e vermífugos. Quando consumido pela população pode causar um quadro de alergia.
O leite in natura também pode transmitir as doenças dos animais para os seres humanos. Entre as principais estão a tuberculose e a brucelose. "A importância da fiscalização é para evitar prejuízos para a saúde das pessoas. Também é necessário um controle laboratorial para ver se existem estes resíduos para adulterar o leite e aumentar o volume, detectar medicamentos e doenças. A pasteurização é importante para que o leite ofereça segurança para o consumo", explicou Bondan.