Olhos, ouvidos e coração no Chile

Mais de mil jornalistas acompanharam o resgate dos 33 mineiros no deserto chileno. Redes de televisão comentaram e mostraram ao vivo cada passo da história. Por que isso interessa tanto?

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Clarissa Ganzer/ON

Todos os 33 mineiros soterrados desde cinco de agosto na mina San José, no deserto do Atacama, já foram retirados. Todos passam bem e tudo ocorreu conforme o esperado pelo governo do Chile.

Provavelmente para quem está lendo esta matéria agora isso não é novidade. Aliás, essa é uma informação ultrapassada, se levar em conta o trabalho dos cerca de 1,5 mil  jornalistas de todo o mundo que noticiaram em tempo real o resgate desde terça-feira (12) a tarde. Eles foram os olhos, ouvidos e, sobretudo, o coração de cada pessoa que assistiu de longe a esse momento histórico, do maior resgate da história da mineração, como afirma a própria imprensa chilena.   
Seja pela televisão, rádio, internet não há como ficar imune às informações transmitidas in loco sobre o assunto. Mas por que a situação dos 32 chilenos e um boliviano abaixo de 700 metros desperta tanta curiosidade? A pergunta é retórica. Essa é a história de pessoas comuns que, como eu e você, estão suscetíveis a passar por circunstâncias de extremo risco.    

Espelho, espelho meu
Há uma identificação com o fato, justamente por não haver uma explicação plausível para que isso ocorra. A doutoranda em comunicação social que desenvolve tese sobre jornalismo sensacionalista na virada do século, Bibiana de Paula Friderichs, pontua que além de ser um acontecimento substancialmente significativo, existe uma projeção da condição daqueles homens. “O leitor tem interesse nisso, porque é através desses fenômenos que nos identificamos. Embora nossa vida seja ordinária e comum, todos estamos sujeitos a vivenciar situações de tragédia. É o extraordinário que acontece com o ordinário, mas ao mesmo tempo acontece com o outro, que está longe de mim, é uma espécie de alivio”, justifica.

Big Brother Chile
Além da empatia que o episódio causa, os meios de comunicação nutrem a vontade de acompanhar o desenvolvimento do episódio. Mas, muita calma nessa hora. Nada de fazer caça as bruxas com a mídia. Isso só acontece pela curiosidade inerente dos espectadores. “Muito difícil não existir uma cobertura jornalística. É o tipo de historia que nos alimenta. O problema que essa historia se arrasta e a mídia precisa alimentar esse tempo, não só com as informações dos mineiros lá embaixo, mas com o drama das famílias. Isso só funciona porque queremos. A mídia é o espaço lúdico do adulto. O adulto faz suas projeções e abstrai seus conflitos [através da mídia]”, esclarece.

Eu vi um passarinho azul
Essa necessidade faz com que a mesma narrativa seja reproduzida em diferentes meios, como é o caso do twitter e das redes sociais. Na tarde de ontem (14), as palavras “Chilean miner (mineradora chilena); Esteban Rojas (o 18º homem a sair da mina, que prometeu se casar na Igreja com sua mulher, com quem é casado no civil); Mineiros Chilenos; Miners Rescue (resgate dos mineiros); e as hashtags  #silosminerosfueranmexicanos (se os mineiros fossem mexicanos) e  #rescatemineros (resgate dos mineiros) estavam no Trending Topics, ou seja, eram os nomes mais postados no Twitter  pelo mundo todo.

“O Chile pode conseguir qualquer coisa”
O engenheiro civil industrial, Fabrizio Martini, 25 anos, é um dos chilenos que acompanhou e escreveu em seus perfis na internet percepções sobre a retirada dos trabalhadores. Segundo ele, o povo chileno está impactado com a situação e muitas pessoas ficaram acordadas até a madrugada para ver como removeriam os primeiros mineiros.  

Para Martini, que vive em Vinã Del Mar, todos estão conscientes de que o que estão acompanhando é algo histórico para o mundo e, principalmente, para o Chile. Mais que isso, esta é uma prova de que o país se reergueu após ter sua autoestima abalada com o terremoto no final de fevereiro. Exatamente no dia 27, o Chile sofreu o segundo maior sismo da história do país e um dos cinco mais fortes registrados pela humanidade. “O Chile pode conseguir qualquer coisa que se proponha, nas boas e nas ruins”, enaltece o engenheiro.

Se a projeção mundial do Chile vai ajudar efetivamente o país é impossível assegurar agora, entretanto é possível afirmar com segurança que a popularidade do presidente Sebastián Piñera vai crescer e, se bem direcionada, auxiliá-lo em todo o seu governo. “Ele [Piñera] é o líder, quem colocou todos os recursos, sem importar o custo, para concluir o resgate dos 33 mineiros”, finaliza Martini.

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