Clarissa Ganzer/ON
Ao ir para o trabalho, ao voltar da escola ou circulando pelo centro de Passo Fundo, você já deve ter observado que alguns automóveis soltam do seu cano de descarga uma fumaça bem escura, a fumaça preta. Quando o motor desregulado de um veículo movido a óleo diesel é forçado, ele emite essa fumaça. Por mais que depois de alguns segundos você não consiga mais enxergá-la, ela continua na atmosfera. A fumaça preta (partículas sólidas) permanece por três dias no ar e se propaga por até três quilômetros. Além de danos ao meio ambiente, ela faz mal diretamente a saúde, já que é formada por diferentes gases.
Pesquisa
Motivados por inquietudes ambientais e referentes ao bem-estar, os alunos do curso superior de tecnologia em Gestão Ambiental da Faculdade Portal, Sidnei Souto Castanheira e Michele Melo Caon de Lima, tiveram a ideia de organizar uma análise em Passo Fundo para descobrir a porcentagem de fumaça preta emitida por veículos movidos a óleo na cidade. A ideia nasceu em março deste ano. “Sou voluntário do Grupo Ecológico Guardiões da Vida e isso me estimulou. Além disso, sou motorista profissional e observava o problema da poluição”, comenta Castanheira, 48 anos. Os acadêmicos, que na época estavam no primeiro semestre, conversaram com o coordenador do curso (e do projeto), Alcindo Neckel e juntos elaboraram uma metodologia em pesquisa.
Com a mão na fumaça
Em uma tarde de maio - especificamente na semana do meio ambiente -, 12 estudantes do curso se reuniram na avenida Sete de Setembro, em frente ao Parque da Gare e abordaram aleatoriamente cem veículos (caminhões de pequeno, médio e grande porte, ônibus, micro-ônibus e camionete) movidos a óleo diesel. A Blitz Educativa foi promovida pela Faculdade Portal, Secretaria Municipal do Meio Ambiente, com o apoio do Batalhão Ambiental da Brigada Militar, Guarda Municipal de Trânsito, Grupo Ecológico Guardiões da Vida e Agenda 21.
Munidos com duas placas de acrílico e com a Escala de Ringelmann - uma escala de cinco padrões com variações de tonalidade entre o branco e o preto. É usada pela cidade de São Paulo. (ver box) -, os estudantes mediam o nível de fumaça preta emitido pelos veículos. Os acadêmicos pediam para os motoristas pararem e acelerem os automóveis três vezes. O resultado que se repetia mais vezes e de maior intensidade era validado pela pesquisa. “Pelo que a gente vê no dia a dia, imaginava que fosse dar uma quantidade alta [de poluição dos veículos]”, conta Leandro Lacerda Castilhos, 40 anos, um dos estudantes que colaborou com a avaliação.
38 de 100
No dia 20 de outubro, uma reunião, na Faculdade Portal com as instituições que participaram da Blitz Educativa, mostrou os resultados da pesquisa. Dos cem veículos examinados, 38 emitem fumaça preta acima do limite (padrão 4 e 5 da Escala de Ringelmann). 30 veículos emitem fumaça no limite permitido (padrão 3 da Escala de Ringelmann). E 62 veículos da frota avaliada de cem está dentro dos limites estabelecidos pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran).
O limite aceitável para a emissão de fumaça preta em Passo Fundo é o de número 3 da Escala de Ringelmann, que indica uma densidade de 60% de fumaça preta expelida pelos veículos. A determinação do nível 3 da escala considera que cidades até 500 metros acima do nível do mar equivalem ao limite 2, já cidades acima de 500 metros do nível do mar equivalem ao limite 3. Passo Fundo está a 687 metros acima do nível do nível do mar, por isso seu limite é o 3, conforme determina a resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Segundo o Detran, na cidade existem 7.348 veículos movidos a óleo diesel.
Os resultados obtidos durante a pesquisa revelaram que 62% (9% - faixa 1, 23% - faixa 2 e 30% - faixa 3) da frota avaliada está dentro dos limites estabelecidos pelo Contran e 38% (20% - faixa 4 e 18% - faixa 5) não está em conformidade
Fiscalização
O objetivo dos pesquisadores, a partir de agora, é iniciar uma discussão sobre a fumaça preta e pensar sobre uma legislação para o município através de mecanismos de controle similares ao da Escala de Ringelmann. Um opacímetro, por exemplo é um instrumento que mede a fumaça, mas é incontestável, diferente da escala, que usa a verificação humana. “Se investirmos em fiscalização e aquisição de aparelhos para medir isso ou usando até a própria escala, nós diminuiríamos os custos hospitalares. E esse dinheiro poderia ser investido em educação, saúde. O grande passo é despertar a população, fazer um estudo de valoração ambiental. Quanto as pessoas pagariam para ter um ar limpo”, finaliza Neckel. O trabalho da instituição é pioneiro no Rio Grande do Sul.
Os efeitos para a saúde
De acordo com a doutora em pneumologia pela Universidade de São Paulo (USP), a médica pneumologista Janaina Pilau, essa fumaça, que parece inofensiva, é rica em monóxido de carbono, que compete com o oxigênio na corrente sanguínea, tendo mais facilidade para ser transportado no sangue que o oxigênio. Ou seja, dessa maneira, a taxa de oxigênio no sangue diminui. Além disso, ela pode aumentar a produção de secreções, causando tosse e expectoração. “Quando a concentração dessa fumaça no ambiente aumenta, pessoas com doenças respiratórias podem descompensar suas patologias. Isso pode levar a broncoespasmo em pessoas mais sensíveis ou com enfisema ou asma”, explica a médica.
Escala de Ringelmann
A Escala de Ringelmann é uma escala gráfica para avaliação visual colorimétrica de densidade de fumaça, constituída de cinco padrões com variações uniformes de tonalidade entre o branco e o preto. O observador coloca a placa de acrílico – depois de marcada pela fumaça da averiguação dos veículos – embaixo da escala. Através dos padrões de cor da escala é possível saber o nível de fumaça preta emitido em cada veículo.
Do bolso
O Código Brasileiro de Trânsito no Artigo 231 alerta que é proibido:
Art. 231. Transitar com o veículo:
III - produzindo fumaça, gases ou partículas em níveis superiores aos fixados pelo CONTRAN;
Sujeito a penalidade