Daniella Faria/ON
No fluxo normal da vida, o comum seria que os pais partissem antes que os filhos. Mas nem sempre isso acontece. A tragédia que aconteceu no Rio de Janeiro é um entre muitos exemplos: vidas de crianças inocentes que são tiradas repentinamente e sem motivo. O desespero e o sofrimento dos pais são imensos. Para ajudar a compreender os fatos e superar a dor, o auxílio de profissionais da área da psicologia e grupos de apoio é de extrema valia.
Em Passo Fundo existe um grupo de mães que se reúne uma vez por mês para compartilhar experiências e dar força para cada uma que já perdeu seus filhos. O Grupo Renascer atende mães há dois anos, e agora está em um novo local devido ao aumento de participantes. Zenaide Valério, de 62 anos, perdeu um filho há oito anos em um acidente. Foi ela quem teve a ideia de criar o grupo. Com a perda do filho, Zenaide conta que depois de um ano ainda se sentia mal e só conseguia dormir com ajuda de medicamentos. Ela chegou a levar as flores ganhadas por uma das filhas no Dia das Mães até o túmulo do filho, tamanha a dor e a saudade que sentia.
Vendo o sofrimento da mãe, as filhas de Zenaide tomaram a decisão de interná-la em uma clínica em Porto Alegre para receber um tratamento psicológico apropriado. Nas conversas com o terapeuta, ela chegou à conclusão de que poderia usar aquela dor para ajudar e confortar outras pessoas. Alguns anos depois, conhecendo e conversando com os amigos, a mãe se deu conta de que conhecia outras pessoas que passavam pela mesma situação. Convidou uma psicóloga para acompanhar a primeira reunião do grupo, onde compareceram 12 mães. Destas, quatro permanecem até hoje.
Com o passar dos anos, o número de casos foi aumentando, e o espaço foi ficando pequeno. As reuniões que antes eram realizadas na casa de Zenaide foram transferidas para um lugar maior, uma sala na Secretaria de Cidadania e Assistência Social. Hoje o grupo recebe assistência de uma psicóloga e uma estagiária da área. Na última palestra, 32 mães foram convidadas. As experiências compartilhadas sobre a perda dos filhos, nos mais diversos casos, como acidentes, homicídios, suicídios e doenças, ajuda que as mães dêem força umas às outras. “Sabemos que sair de casa para vir falar sobre esse assunto não é fácil. Acabamos nos fechando muito. Mas o grupo ajuda bastante a confortar a dor, e transformá-la em saudade”, destaca. A partilha de sentimentos é um modo de entender o que aconteceu e relembrar os momentos bons passados com os filhos.
Psicologia
A recém formada psicóloga Sara Vassoller acompanhou voluntariamente o grupo desde sua criação até o ano passado e utilizou o grupo como assunto em sua tese. Ela explica que a reunião funciona como um grupo de escuta, onde as mães se reúnem, conversam sobre as vivências e trazem o sentimentos fortes à tona. “Com isso eu tentava aplacar a angústia e invertia a situação. Através de conversas fazia questionamentos. A perda do filho é como se fosse perder um pedaço delas”, fala.
Nas conversas, histórias eram reconstruídas e a identificação de sentimentos começava a ser feita. Os exemplos de superação serviam de base para a mãe novata saber o que fazer e até como agir. “Algumas mães que há pouco tinham perdido os filhos trocam informações com as outras que já superaram o período de luto. Aparentemente parece uma troca incompatível, mas é muito importante”, ressalta.
Sara diz que o período de luto é comum. Parece que coisas simples passam a não ser significativas, como o sol que brilha ou uma flor que cresce. Passado o período de seis meses é que começa a cair a ficha de que o filho não está. “É normal que ela continue procurando o filho nas rodas de amigos ou na rua, colocando o prato na mesa esperando que ele venha ou até arrumar a cama”, diz. Mas depois de um ano isso já pode ser considerado patologia. A identificação de sentimentos funciona como uma maneira saudável de entender o que aconteceu. “Vi que dá um resultado positivo na forma de transformar aquela dor, dependendo do caso até mesmo revolta, em saudade”, diz.
Próxima reunião
Os encontros do Grupo Renascer acontecem uma vez por mês na sala dos Conselhos, na Secretaria de Cidadania e Assistência Social. O próximo encontro será no dia 16 de maio. Mais informações podem ser obtidas com Zenaide, pelo telefone 3313.3539.