Leonardo Andreoli/ON
As quatro paredes erguidas no bairro Bom Recreio representam o sonho interrompido de um filho e de uma mãe. Os espaços deixados pela falta de piso, telhado e mesmo das aberturas são a materialização de um espaço vazio também no coração da mulher de 53 anos. O sonho do filho era dar aos pais e irmãos uma moradia digna. Ele trabalhou o quanto pode para transformar isso em realidade, no entanto a morte precoce aos 25 anos interrompeu a realização. Antes de morrer, o filho deixou a ela a missão de cobrir a residência.
Sem ter condições para concluir a obra iniciada, a família ainda moram em uma casa precária a poucos metros da obra interrompida. No dia das mães o coração de Ernestina Camargo não saberá como lidar com a falta de alguém tão especial. As fotos de Adriano Camargo estão espalhadas pela casa de madeira na tentativa de diminuir a dor da perda.
Os olhos de Dona Ernestina se enchem de lágrima toda vez que ela toca no nome do filho. Em frente a casa que ele não conseguiu concluir ela conta um pouco da história da família. Adriano já a ajudava no trabalho desde os oito anos. Eles saiam à rua para vender verduras e legumes produzidos por eles. “O dinheirinho que era dele ele ia guardando. A primeira casa que ele fez foi aquela lá. O sonho dele quando fosse homem era trabalhar pra fazer essa casa”, conta.
Aos 17 anos, um mês depois de começar a trabalhar, Adriano ficou doente. “Desde os nove anos ele se queixava muito de dor de cabeça e a gente sempre levava pro médico. Os médicos diziam que era sinusite, internavam. Quando tinha dez anos ficou três meses no hospital. Pra ele trabalhar do jeito que trabalhava por dia os bolsos dele eram cheios de comprimido pra dor de cabeça. Quando ele caiu no hospital em agosto do ano passado apareceu o câncer”, lembra.
Missão
“Quando ele tava muito mal, antes de morrer ele disse pro Thailor: o mano vai morrer, não tem mais o que fazer, mas o mano vai te dar aquela casa. Ele disse pra mim: mãe me promete que cobre a minha casa, não deixa minha casa apodrecer. Eu disse: meu filho a mãe não tem de onde tirar, mas a mãe te promete que um dia a mãe vai achar um filho de Deus que cubra essa casa”, recorda a mãe enquanto chora abraçada ao filho menor de nove anos.
O sonho de Adriano era tão grande que ele sempre falava na casa. Dona Ernestina recorda que em qualquer lugar que ele estivesse o assunto principal era a obra. “É difícil um rapaz novo ter tanto sonho como meu filho tinha”, afirma. O jovem ainda ajudava a mãe a criar os irmãos.
Casa dividida
A casa possui divisão para quatro quartos. O primeiro seria o de Adriano, o segundo do irmão mais novo ao qual era muito apegado, o terceiro para o outro irmão e o quarto para os pais. Mesmo no tempo em que ele ficou encostado do trabalho devido a doença parte do dinheiro era destinada aos remédios e a alimentação e o restante para a obra.
O irmão mais novo, Thailor, lembra do irmão com carinho. Na parede do quarto da casa de madeira um desenho da mãe e do irmão está preso na parede. “Ele dava as coisas pra mim, e sempre que eu tinha os temas que não conseguia, ele era o único da casa que sabia me ajudar. Sempre ele pedia pra mim ir na cidade. Ele não gostava de ir ‘solito’ e pedia pra mim ir e eu ia junto com ele”, recorda.
Enquanto a casa não pode receber móveis e a família pela falta de cobertura, de piso e aberturas, ela serve de depósito para os materiais recicláveis recolhidos por dona Ernestina.