Discussão Jurídica sobre taxa do lixo confunde contribuinte

Judiciário ainda não discutiu se a taxa retroativa é válida ou não. Até agora as decisões se basearam apenas na legitimidade dos autores das ações

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Natália Fávero/ON

Depois de inúmeras decisões judiciais sobre a cobrança retroativa da taxa do lixo a população está confusa. Por mais que a prefeitura não tenha divulgado o balanço de quantos contribuintes pagaram, acredita-se que mais da metade já tenha quitado a taxa, devido ao movimento nas agências bancárias e lotéricas. De fato, especialistas da área explicaram que nenhuma das decisões até agora analisaram o mérito da ação, ou seja, se a cobrança é legal ou não. Os resultados judiciais só julgaram a questão processual (legitimidade dos autores da ação). O que se sabe é que alguns membros do Judiciário entendem que ação civil pública pode discutir tributos e outros não. Outra parte acredita que a ação popular é mais adequada para tratar dessa questão. Resumindo, há entendimentos diferentes no judiciário. Cada juiz é livre para dar a sua interpretação da Lei.

Cronograma das decisões judiciais

03/06: A juíza Débora Sevik, da 1ª Vara da Fazenda Especializada Pública indeferiu a petição inicial e extinguiu a ação civil pública movida pelo Ministério Público. Conforme a decisão, o MP não teria legitimidade para mover uma ação civil pública para questionar tributos.

13/06: Taxa retroativa é suspensa - A juíza Alessandra Couto de Oliveira, da 1ª Vara da Fazenda Especializada Pública concedeu liminar determinando a suspensão de parte da taxa retroativa do lixo entre julho de 2008 a fevereiro de 2010, referente a ação civil pública movida pela Abracc. Segundo ela, a entidade teria legitimidade para mover esse tipo de ação.

16/06: Suspensão é derrubada pelo TJ - O Tribunal de Justiça do Estado acatou o recurso do município e derrubou a liminar que suspendia a cobrança da taxa. Conforme decisão da desembargadora, Mara Larsen Chechi, que não analisou o mérito da ação, a Abracc não teria legitimidade para mover esse tipo de ação. Abracc recorreu e aguarda decisão do TJ.

21/06: Suspensa pela segunda vez taxa retroativa - Uma ação popular foi movida pelo vereador Rafael Bortoluzzi (PP) e assinada pelo advogado Flori Francisco Barreto do Amaral Wegher questionando a legalidade da cobrança entre julho de 2008 a fevereiro de 2010 e pedindo a suspensão da taxa retroativa nesse período. A juíza da 1ª Vara da Fazenda Pública, Alessandra Couto de Oliveira, deferiu o pedido.

O que é ação popular
Foi recepcionada pelo artigo 5ª, inciso LXIII, da Constituição Federal de 1988. Assim, a antiga lei 4717/1965 está em plena vigência e confere a qualquer cidadão a legitimidade para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao interesse e a patrimônio público. Conforme o advogado, Osmar Teixeira, a ação popular é a que melhor atende aos interesses coletivos e individuais do cidadão, nela não há custas judiciais ou ônus de sucumbência - é uma garantia da cidadania.

O que é ação civil pública
A ação civil pública, sob nº 7.347/24.07.65, sofreu ao longo da sua existência várias alterações, mas, não revogou, em nenhuma hipótese as regras da ação popular, com a qual pode conviver juridicamente.  Ela define a responsabilidade por danos ao meio ambiente, consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e paisagístico. Esta ação tem legitimidade específica determinada a alguns órgãos, como o MP, a defensoria pública, a União, Estados, Municípios, Distrito Federal e associações. Em relação a ação civil pública, Teixeira disse que há respeitáveis divergências quanto ao  objeto jurídico, por isso, às  vezes, legitimamente, alguns Juízes a repelem.

Qual a diferença entre os dois instrumentos

A presidente da Subseção da OAB, Patrícia Alovisi esclarece que a diferença entre elas está basicamente na parte autora da ação. Na ação popular é o cidadão que moverá a ação e na ação civil pública são entidades. Mas há uma grande diferença segundo a doutrina e jurisprudência majoritária que coloca que a ação civil pública não pode discutir tributos. “Quem decidiu isso bem é o Superior Tribunal de Justiça (STJ) que tem decisões que definem que não pode se discutir tributos por ação civil pública. Já a ação popular pode discutir tributos sem problema nenhum, porque a cobrança ofende a moralidade administrativa”, explicou Patrícia.

Na questão da taxa retroativa, a advogada explica que ninguém discutiu a legalidade ou não da cobrança. Até agora só analisaram a questão processual. Com a ação popular movida pelo vereador Bortoluzzi, o Tribunal de Justiça finalmente discutirá o mérito e não será possível extinguir a ação como nas outras vezes sem julgar se é válida ou não a cobrança.
O advogado Osmar Teixeira, acredita que os dois instrumentos são extremamente úteis para a atualidade colocados a disposição do cidadão. “Infelizmente, por desconhecimento ela é muito pouco utilizada. O agente público de qualquer natureza deve ser fiscalizado e responsabilizado pelo cidadão nas suas omissões e atos ímprobos e esses sãos os instrumentos, que não diferem em muito no seu alcance”, explicou o advogado.

Contribuinte que pagou

Segundo a presidente da OAB, a decisão de suspender a taxa retroativa depois do prazo do pagamento da taxa, não prejudica o objeto da ação, porque caso fique declarado que o tributo não é devido, a prefeitura deverá devolver o dinheiro ou compensar.

Município recorre da decisão

O Município de Passo Fundo, por meio da Procuradoria Geral do Município (PGM), recorrerá da decisão da Juíza Alessandra Couto Oliveira, da 1ª Vara da Fazenda Pública, que concedeu liminar na ação popular movida pelo vereador Rafael Bortoluzzi, suspendendo a cobrança da taxa do lixo.

Um agravo de instrumento será protocolado no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul até a próxima segunda-feira (28). Segundo o procurador geral adjunto da PGM, Júlio César Pacheco, a taxa do lixo não é matéria idônea a ser discutido no âmbito da ação popular, por se tratar de questão de interesse pessoal, subjetivo, não podendo ser alcançada por uma ação constitucional que visa o interesse coletivo e difuso, onde os sujeitos são indeterminados.
Pacheco acrescentou que a taxa do lixo foi instituída em 2001 e ratificada em 2009, através de leis complementares, como determina a Constituição Federal.

O secretário de Finanças, César Bilibio disse que o balanço com o número de quantos contribuintes já pagaram a taxa retroativa do lixo ainda não foi finalizada. Esses dados só serão disponibilizados na segunda-feira. “Quem já pagou, pagou. Quem ainda não pagou deve aguardar a próxima decisão do Tribunal de Justiça”, disse o secretário.

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