Li durante meu último plantão, em um só fôlego, o excelente livro de Marcos Eduardo Neves chamado Heleno em que se conta a trajetória de vida de Heleno de Freitas, um dos maiores e controvertidos jogadores de futebol produzidos no Brasil. Conta a genialidade e mágica de seu futebol, conta sua maneira de viver, sua fineza, sua cultura, seus hábitos milionários, seus sucessos com as mulheres e tiradas anedóticas do mundo do futebol. Tudo isso é contextualizado no Rio de Janeiro entre 1935-1955, épocas que antecederam o nascimento de quem tem hoje em torno dos cinqüenta anos de idade. Mais do que um livro sobre um raro jogador de futebol que faria Edmundo, o animal e Adrian, o imperador parecerem seminaristas é um livro histórico porque situa músicas, hábitos, esperanças, aspectos políticos de uma era conturbada.
É bom que se leia esse tipo de livro porque a história é que dá o norte dos nossos caminhos. Em um dado momento de minha vida senti necessidade de ler e compreender os caminhos do Brasil. Estabeleci como estratégia ler o que havia desde 1930 até os dias atuais; depois mergulhei no período entre a Proclamação da República até 1930. Ou seja, fui lendo a história do fim para o começo. Busquei a história do Rio Grande e de Passo Fundo. Agora ensaio-me para descortinar Cruz Alta. É assim, somente assim, que a gente não é engambelado porque quem conhece a história e a cultura dos locais não é facilmente manobrado. Há um livro do Dr Madalosso sobre a história médica de Passo Fundo e é bom que se leia-o. Há tanto para ser descrito, há tanto para ser contado e deixado como butim.
Há as mil e uma noites do Boka, as mil e uma festas da Boite Cacimba, há os embalos da Boite Urso Branco e das Boites do Juvenil e do Caixeiral cujo nome insiste em me fugir. Há as aventuras e deleites do Kako e Bicão, mas estes somente poderão ser contados postumamentes. Lembro que certa feita, o falecido artista de teatro Pedro Alexandre comunicou a Raul Lângaro que iria editar um livro de memórias da época boa das noites passofundenses. O simpático Raul falou, então, ali no bar do Turis Hotel: me avise do dia do lançamento que quero me mudar para Buenos Aires. Essas coisas deliciosas, essa aventuras que permearam nossas ruas e casas é que fazem o encanto das existências. Veja você o restaurante do Gageiro, do melhor chope que já tivemos, foi demolido e a gente não derrubou nenhuma lágrima e não escrevemos nenhuma das histórias. Veja você, o tempo vai passando e não vamos resgatando. Por isso é bom ler o livro sobre Heleno, sobre um Rio de glamour. É preciso saber do passado para entender o presente.
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