Há dois anos sendo alfabetizada no método braile, Dilce Canabarro Terres, 49 anos, ainda não sabe quando poderá retomar as aulas para finalmente aprender a interpretar a pontuação e os numerais. A Associação Passo-fundense de Cegos (APACE) decidiu, através de assembleia na semana passada, suspender todas as atividades por falta de um espaço seguro e adequado. A direção deve participar hoje à tarde de uma reunião com o prefeito Luciano Azevedo para tratar do assunto.
Assim como Dilce, outros 160 associados, incluindo 20 crianças, deixaram de participar das nove atividades oferecidas pela entidade. A medida, segundo o vice-presidente Sebastião Loreno do Prado Couto, foi tomada em razão das péssimas condições do prédio, cedido pela prefeitura e localizado nos fundos da Secretaria Municipal de Desporto e Cultura, centro da cidade.
“É um imóvel muito antigo. Quando chove entra água pelas paredes. O assoalho está cheio de buracos. Não tem acessibilidade nenhuma. Para chegar até a cozinha, é preciso descer uma escada perigosa. Várias pessoas já caíram e se machucaram nela. Estamos convivendo com ratos e baratas” explica.
Além das condições precárias, a falta de espaço físico tem limitado o desenvolvimento de projetos, como orientação e mobilidade, atendimento psicológico, aulas de leitura, cinema adaptado, terapia em grupo e individualmente, informática e oficina de estimulação para crianças.
A pequena sala, onde funcionava a biblioteca, aulas de braile e atendimento psicológico, virou depósito. Em razão da falta de estrutura, diversos brinquedos terapêuticos adaptados, repassados ainda no ano passado pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (Comdica), no valor de R$ 17 mil, permanecem encaixotados. Praticamente não há acesso aos livros, depositados no alto de uma prateleira, nem espaço para o recebimento de novas doações.
“Sem espaço fica difícil desenvolver um trabalho de qualidade. As crianças precisam ser estimuladas precocemente para não apresentarem sintomas autistas. Pessoas com baixa visão precisam aprender a usar o resíduo visual. Não temos estrutura física e nem de pessoal” comenta a psicóloga Luciana Cairos, que iniciou na entidade como voluntária, e realiza atendimento aos associados desde 2005. Ela e um professor de orientação e mobilidade são mantidos através de convênio com a prefeitura municipal que repassa uma verba anual. A entidade conta ainda com o trabalho de voluntários.
Para realizar o sonho de aprender a ler, Dilce frequentava duas aulas semanais, de uma hora cada. Carga horária que poderia ser ampliada, caso houvesse disponibilidade de mais profissionais especializados. Atualmente, a Apace conta com apenas um professor do método braile, cedido pelo governo federal pelo projeto Brasil Alfabetização.
“Estou sentindo falta das aulas. Estava num ritmo bom, pronta para iniciar a pontuação e leitura de numerais. Não é um aprendizado fácil. Agora terei de retomar algumas coisas” comenta a associada.
Segundo Couto, a prioridade da Apace é conseguir um novo espaço até que a sede definitiva seja construída. Através do Orçamento Participativo de 2012, a entidade conquistou uma verba de R$ 140 mil para construção de um Centro de Atendimento, mas a falta de um terreno impede que o projeto saia do papel. “Precisamos da doação de uma área e de uma contrapartida. Com os recursos disponíveis poderemos construir o primeiro módulo” argumenta.
Alfabetização interrompida
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