Dentre tantas coisas que a gente aprende em cursos está que peremptoriamente um palestrante deve evitar a todo o custo falar a palavra “coisa”. Se ele fala coisa o tempo todo pode ser que ele não entenda da coisa, ou que talvez queira dizer uma coisa e seu público entenda outra. Para o exigente público, essa espécie de vício em repetir palavras vira comentários jocosos. Recentemente no intervalo de umas palestras meus colegas não falavam em outra coisa. Vejam que coisa estranha, segundo o Gênesis, Deus criou todas as coisas de um nada qualquer, para só depois criar o homem. Geneticamente falando, tudo o que não era gente, era coisa. Até que em 1963 Vinícius de Morais decidiu elevar também o ser humano à condição de coisa: “olha que coisa mais linda, mais cheia de graça...”. No entanto, coisa é uma expressão muito vaga e que pode dizer muito ou pouca coisa. Por exemplo, uma conhecida foi a um motel como o novo namorado e relatou que quando viu o tamanho da coisa, sentiu uma coisa que não sabe explicar, se é que você me entende. Disse, também que, pelo fato de o namorado ser baixinho, esperava uma coisa e constatou outra. Soube, com tristeza imensa que, quando eu levei o pé na bunda da minha primeira namorada, ela se referia a mim como “coiso”. A coisificação das ideias pode transparecer rasgados elogios ou críticas veladas. Outro exemplo sobre o estado das coisas: há críticas severas sobre o que está acontecendo no nosso país na área da saúde pública. As três esferas – municipal, estadual e federal – enfrentam severos desafios e todos reconhecem que a coisa está preta. Dizem que a coisa não funciona e que depois que colocaram aquela coisa no comando a saúde virou caso ou coisa de polícia. Alguns mandatários ao receberem os relatórios dos problemas a serem resolvidos teriam comentado: coisa de louco. Os que defendem as atuais políticas de saúde pública recebem desconfiança da população como o seguinte comentário: aí, tem coisa. Há, decididamente, muita coisa a ser feita. O pessoal que deixou o poder fala reservadamente que da atual gestão não dá para esperar muita coisa. Por outro lado, os administradores eleitos teriam comentado que a melhor coisa que os perdedores podem fazer é ficar quieto porque a tal aliança política comprovadamente foi coisa que não deu certo e que esse tipo de comentário é coisa de fofoqueiro mais interessado em ver a coisa pegar fogo. O maior cuidado em política é não misturar coisas privadas com coisas públicas porque se sabe que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa e que quando se mistura uma coisa com outra coisa, não dá nem uma coisa e nem outra. De todas essas coisas da crônica, pois eu não tinha outra coisa para escrever, gostaria de lembrar aos administradores os três principais conceitos de uma gestão corporativa: entender como a coisa funciona, fazer a coisa certa e falar coisa com coisa.
Esse artigo foi parcialmente plagiado de uma coluna publicada na revista Você SA de 2003, de autoria do extraordinário Max Gehringer.
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