Há crônicas que são escritas com alegria, com indisfarçável sorriso, com entusiasmo, com otimismo. Outras, são escritas com sangue, com lágrimas, em desalento. Umas batem na rosada vida que deveria ser, aquela que imaginávamos ser possível quando, como adolescentes, conhecemos a paixão e pensamos um mundo que flutuava sobre os comezinhos da vida. Outras, escancaram a realidade, da dureza dos tempos, dos desacertos, das fraquezas de nós, tão comuns, tão falíveis e frágeis. Um sujeito, quando acometido de uma tragédia pessoal, como quebrar a perna, por exemplo, costuma maldizer os tempos em que ficará de molho. Dirá que é tempo perdido, odiará a inércia e fará contas sobre o dinheiro que deixará de ganhar ou das oportunidades que passarão em branco. Essa é a regra. Outros, como Pollyanna (Eleanor Porter – 1913, ou O Jogo dos Contentes) aproveitarão o tempo de molho para reprogramar a vida, para meditar sobre os rumos, aproveitarão para ler, observar a chuva e contemplar os passantes, de passos rápidos ou lentos, pensará nos relacionamentos latentes, nas oportunidades que passaram em branco. Diante das desgraças pode-se estrebuchar em choros incontidos ou fazer do limão uma limonada. Todos dizem que é como se enfrenta um problema que se mede o tamanho de um homem. Mano Lima diz que cavalo se conhece em rodeio e o homem na causa que abraça.
Quando vou ao cemitério Memorial Vera Cruz, nunca volto sem sequelas, embora pareça um lugar de paz. Caminho pelos corredores, olhando as fotos e mensagens de familiares daqueles que nos deixaram, uns tão jovens, outros nem tanto. Olho para os meus velhos pais, eternizados em fotos de quando tinham perto de quarenta anos e sinto saudades imensas porque são eternas também suas mensagens de vida e de lutas. Eles eram cantantes, sim, cantantes de histórias de amor, de luta e de sangue, de suor, de tenacidades daqueles que tiveram de lutar diariamente pelo ganha-pão. São histórias muito ricas para serem esquecidas, para serem desprezadas porque são histórias de gente comum, do povo, de um povo que luta, de quem trabalha porque trabalhar, além de ser necessário traz a honra, a honra de ser imprescindivelmente necessário. O que fica, o que será eterno, é a trajetória, é a rede de relacionamentos, é a construção ou a busca de um mundo melhor.
Há uma mensagem num destes filmes de nossas tardes em que uma conselheira diz para uma jovem: não busque o melhor homem, busque o homem que fará de você uma mulher melhor. As boas companhias são isso, aquelas que podem acrescentar qualidade as nossas vidas. Nossos pais, de berços comuns, que sofreram e esconderam de nós, filhos, a maior parte de seus desalentos, fincaram um mundo , se não melhor, mais cômodo a seus descendentes. A maioria deles, construiu história, construiu honra. As ações de nossas vidas, todas elas, deveriam, por decreto, ser mostradas aos pais, mesmo que mortos. É como se fosse uma eterna prestação de contas. Eles investiram na gente, talvez tenham partido sentindo orgulho daquilo que cuidaram com tanto denodo. Eles sempre esperaram, como todos os pais, que a gente fosse gigante. Se a gente não puder ser maior que eles, o mundo seria bem melhor se, nem que, por instantes, fôssemos como nossos pais.