O descontentamento com um modelo de política altamente institucionalizado como o existente no Brasil, onde as decisões são tomadas entre a esfera pública e privada, longe dos interesses do povo e sacramentadas pela grande mídia, é apontado pelo doutor em filosofia, Ângelo Cenci, um dos combustíveis para a onda de protestos que tomou conta das ruas em todo o país esta semana.
Professor dos cursos de filosofia e educação da Universidade de Passo Fundo, Cenci diz que esses ‘acordos de gabinetes’ fazem parte de uma herança muito forte no Brasil. “As coisas sempre funcionaram assim. É um modo de democracia sem povo, excludente. Acordos feitos de cima para a população acatar. As manifestações, sobretudo a partir dos jovens, mostram uma insatisfação com esse sistema” afirma.
Com base nessa constatação, Cenci justifica a postura dos ativistas em rejeitar bandeiras de partidos políticos durante os protestos; a critica aos meios de comunicação e, ainda; a ampliação da pauta de reivindicação, a partir da luta comum pela redução da tarifa de ônibus. “O cidadão se sente distante do acesso ao poder de decisão. Os protestos mostram que isso chegou ao limite” explica, enfatizando a capacidade que o sistema político tem em institucionalizar os representantes do povo. “É uma máquina que tende a tragar as pessoas para dentro de sua lógica”.
Na avaliação do filósofo, a explicação para os protestos também passa pela situação atual da classe média brasileira. Sem desfrutar dos programas sociais do governo federal, considerados corretos por ele, e distante das benesses da classe alta, esta parcela da população acaba penalizada. “Na verdade quem carrega o piano é a classe média. Ela não tem como fugir do pagamento dos impostos, paga duas vezes pela saúde, educação, transporte caro, no entanto, não recebe serviços de qualidade. Estão carregando um peso muito grande. As manifestações mostram isso” aponta.
Mesmo reconhecendo avanços sociais significativos nos últimos anos, como melhoria na distribuição de renda, Cenci diz que ela ainda está muito distante da realidade, fator que, segundo ele, reflete nos altos índices de violência. “O Brasil é um país de economia oligopolizada. Isso ajuda a explicar porque as coisas são tão caras. Não é só em razão das taxas de impostos. O cidadão paulistano gasta 18% em média do salário para se deslocar pela cidade. No Japão, o trabalhador gasta 9% com um sistema de transporte infinitamente mais eficiente” acrescenta.
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