Depois de uma via-sacra, na sexta-feira, onde o Papa Francisco questionou, fortemente, sobre a posição dos jovens diante da cruz, a juventude que toma o Rio de Janeiro acompanhou um final de semana de oração, espiritualidade e improviso. A programação, que era para ser em Guaratiba, no Campus Fidei, aconteceu em Copacabana - na praia, nas calçadas, nas ruas.
No sábado, a organização da Jornada Mundial da Juventude previa que os jovens se dirigissem ao local preparado - com segurança e estrutura, já que os jovens passariam a noite de sábado e o dia de domingo por lá - para Campus Fidei. Os 14 km que distanciam o Rio de Guaratiba seriam a verdadeira peregrinação da juventude: a pé, iniciariam a caminhada pela manhã e passariam por pontos que mostram o Rio de Janeiro em sua plenitude. A chuva, no entanto, não permitiu que os planos se concretizassem: Campus Fidei ficou impossibilitado de receber qualquer pessoa; o barro e a lama descartaram qualquer possibilidade de vigília.
A programação, então, foi transferida para Copacabana. Sem estrutura e sem organização os jovens - que antes seriam alojados em lotes separados previamente, com o número certo de pessoas e com a possibilidade de banho e alimentação, além do Kit Vigília - foram obrigados a demarcar território na areia da praia, nas calçadas dos bares, nas ruas, nas ruas laterais da praia. Antes da Vigília, no entanto, os jovens foram convidados a peregrinar, ainda que de forma diferente: os trens funcionaram até a Central do Brasil, depois disso, 9km deveriam ser percorridos a pé e, no caminho, podiam buscar o Kit Vigília - com a comida para os dois dias. As ruas foram fechadas para carros e liberadas somente para a juventude que caminhou durante o dia inteiro.
Em Copacabana, a Juventude do Papa fez o que pôde. Três milhões de pessoas dormiram onde deu: perto do mar, amontoando colchões; entre as grades de contenção; em lonas que tentavam marcar um território que, na verdade, não pertencia a ninguém. A disponibilidade do jovem - que caminhou 9 km com a mochila, o kit que pesava três kg e, ainda, colchonete e saco de dormir - mostra ao mundo a capacidade do jovem em aceitar um chamado, uma convocação. Não se importaram com a segurança, com a saúde, com o desconforto; importaram-se, somente, em estar perto do Papa e daquilo que ele é capaz de transmitir.
Na celebração, Francisco ressaltou essa atitude e a própria transferência das atividades: “Acredito que podemos aprender algo com o que aconteceu nos últimos dias. Tivemos que cancelar por mau tempo o evento no Campus Fidei Guaratiba. Não estaria o Senhor querendo nos dizer que o verdadeiro campo da fé, não é um ponto geográfico, mas sim nós mesmos? Sim. É verdade, cada um de nós e de vocês. Eu e vocês todos aqui somos discípulos missionários. O que quer dizer isso? Que nós somos o campo da fé de Deus”.
Além de falar sobre o campo da fé, Francisco falou sobre o terreno que, na verdade, representa o coração de cada jovem. “A pessoa diz que é uma calamidade: 'não sou boa terra, estou cheia de espinhos, Santo Padre'. Sim, isso pode acontecer. Mas deixe um pedacinho de terra boa, e permitam que ali caia a semente da palavra e verão que ela vai germinar, sim. Eu sei que vocês querem ser terra boa. O cristão quer ser isso, um cristão de verdade, não cristãos de fachada, mas sim autênticos. Sei que querem ser cristãos autênticos. Não cristãos de nariz empinado, pessoas que só parecem cristãos, mas não fazem nada. Tenho a certeza que vocês não querem viver na ilusão de uma liberdade que se deixe arrastar pelas modas e as conveniências do momento. Sei que vocês apostam em algo grande, em escolhas definitivas que deem pleno sentido para a vida. É assim ou estou errado?”, questionou Francisco.
No domingo, logo pela manhã, Francisco acompanhou o maior flashmob do mundo, onde os três milhões de jovens dançaram e colocaram ao Sumo Pontífice a sua alegria em o receber. Depois, os jovens foram convidados a participar da Missa de Encerramento, presidida por Francisco. O Papa falou aos jovens sobre a necessidade de sair das comunidades e transmitir ao mundo a mensagem de amor que a Igreja propõe. “Foi bom estar aqui, mas agora você deve ir. O que nos diz o Senhor? Ide, sem medo, para servir! A experiência desse encontro não pode ficar trancafiada no pequeno grupo da paróquia e da comunidade de vocês. A fé se faz mais viva quanto mais transmitida. Não tenham medo: quando vamos anunciar a Cristo, Ele vai a nossa frente. Ele não os deixa sozinho”, sorria Francisco.
Ao fim da missa, os sentiram a mesma emoção que os brasileiros sentiram em 2011, em Madrid. A próxima Jornada Mundial da Juventude acontece, em 2016, na Polônia, terra daquele que idealizou e presenteou os jovens com a Jornada Mundial da Juventude, João Paulo II.
Diário do peregrino
Acabou. Depois de seis dias de atividades que, por vezes, não puderam ser vistas, ouvidas ou sentidas, a Jornada Mundial da Juventude acabou. O que fica? Fica a perseverança. Fica a fé. Fica a indignação.
A perseverança fica porque a JMJ e um exercício de persistência. Sem perseverar em Cristo não há motivos para estar aqui. Sem persistir na Igreja não há formas de suportar a falta de estrutura oferecida pela Jornada. É preciso ter, na mente e no coração, a certeza de querer construir um caminho, ao lado de Cristo e dentro da Igreja. Sem isso, não há como seguir.
A fé fica porque há a certeza de que com Francisco, a Igreja caminha para um futuro onde a juventude será o rosto da instituição. A fé fica porque é na realidade da cidade que se encontra Jesus e aquilo que ele pede que se faça.
Fica, também, a indignação. Indignação pela falta de organização e estrutura. E que bom se todos os jovens levarem essa ideia consigo. É preciso que se questione o que se faz e o que se oferece. Sem questionamentos, a juventude perde a personalidade. É preciso questionar o porquê de não se pensar em alternativas mais seguras para os jovens.
Fica, acima de tudo, a vontade de ser mais e de tentar mais. Ser mais Igreja e tentar, ainda mais, levar essa Igreja. A Jornada Mundial da Juventude foi, sim, desorganizada, sem estrutura e sem mobilidade, mas foi, acima de tudo, um encontro do jovem consigo mesmo e com a sua missão.