OPINIÃO

Muito estranho

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Muito estranho é uma música eterna de autoria do médico Dalto e que entrou em nossas vidas pela Globo na novela Sol de Verão (1982-1983), em que foi lançada também a Banda Blitz. Além de tema romântico dessa novela, foi tema do início de meu namoro com minha mulher, aliás, perdão, não minha mulher, não minha propriedade, quis dizer sobre a mulher que é casada comigo porque ninguém é de ninguém, apenas estamos, todos nós, por tempo que não saberemos estimar.

Muito estranho é o comportamento da gente, tanto no desempenho quanto à crítica. Estava pensando em dois personagens do nosso imenso Brasil, Ernesto Geisel (militar e ex-presidente) e José Genoíno (ex-guerrilheiro e político). Geisel, que foi presidente do país, era resolutamente ciente dos deveres de um homem, ainda mais um homem público. Seguia absolutamente a cartilha da caserna – disciplina e hierarquia e não acreditava que os casacas (civis) tivessem freios e que uma vez no poder tenderiam a abusar deste, ou tender à inefável busca da locupletação pessoal. Deve ter lido O Contrato Social de Rousseau, em que o homem, incapaz do autogerenciamento, transfere-o ao Estado. Deve ter lido Maquiavel e despreendido as maneiras de um homem público dizer uma coisa e fazer outra.

Mesmo assim articulou com Golbery o encaminhamento da abertura política, a anistia dos velhos políticos estranhos aos militares que estavam asilados no exterior e a retomada do poder aos civis porque entendia, o velho general, que lugar de milico era no quartel. José Genoíno lutou com as armas que dispunha, clandestino, contra a ditadura militar, buscava a restauração do estado de direito. Foi preso e torturado. Agraciado com os tempos da democracia, retornou aplaudido pela maioria juntamente com José Dirceu e uma patota heterogênea. Perfilados estavam o renomado intelectualLuís Gushiken e Zé Dirceu, grande articulador do PT. Zé, romântico inveterado, acha-se injustiçado e entende que desviar recursos públicos para garantir governabilidade não é crime. Genoíno que, pelo que consta, nunca objetivou locupletação pessoal, tratou de esquentar o dinheiro púbico desviado dando-lhe um brilho legal. Antônio Pallocci enriqueceu da noite para o dia, assim como um dos filhos de Lula. Pizzolatto, bancário e petista de carteirinha, recebeu ordens, cumpriu-as religiosamente liberando a grana que seus líderes mandaram e, sabendo que os medalhões serão liberados ou que não ficarão presos, peixe pequeno se mandou. O único inocente dessa estranha, muito estranha história é o chefe que, pelo fato de não saber do que se passava, o que poderia ter feito ?

Muito estranho é que Genoíno, cardiopata grave, cumpra pena enquanto José Sarney, Paulo Maluf e Fernando Collor andem soltos. Não existe corruptor sem corruptos. Parece que a lisura pessoal representa um entrave para administrar a coisa pública. Parece que as tentações aos pecados capitais aumenta tão logo se alcance o êxito político. Talvez seja por estas coisas, entre tantas outras, que muitos têm saudades dos milicos - os da disciplina e hierarquia - os que tinham chefes bem definidos e que assumiam suas atitudes, mesmo as erradas. Geisel cortou na própria carne ao defenestrar o General Sylvio Frota, linha dura do Exército, que era contrário à redemocratização do país. Lula só não cortou a própria carne porque nada sabia. A única coisa que teve cortada foi a ponta de um dedo, o que o tornou inválido ao serviço dos mortais, mas que não o impediu de se tornar um presidente populista. Poderia ter sido mais, mas a fotografia da turma não ajudou. A foto ficou esmaecida e todos parecem iguais, os gatunos e não-gatunos.

 

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