Morreu, neste início de ano, o tradicionalista Paulo Sérgio Medeiros, conhecido como São Borja, participante ativo do Programa Galpão do Nativismo da Rádio Gaúcha, apresentado por Dorotéo Fagundes no amanhecer dos domingos. O bom humor e a cativante gargalhada transmitia cheiro de campo, isto é, remetia-nos aos autênticos gaúchos, tal qual nossos ancestrais. Lembrei imediatamente do Telmo, Válter, Nei e Nélson Quadros, Antoninho Serena, Antônio Dutra, Brambilla, Eluir Rescke, Nelson Petry, Heitor machado e Antônio Gasparetto, entre tantos – campeadores do grande CTG Lalau Miranda, uns que já partiram, outros que permanecem – e que me dão a impressão, talvez saudosista, que já tivemos melhores momentos em relação à cultura de nossas tradições.
E, ali, naquele leito de CTI, na luta pela vida, está o grande Alcides Guareschi. Gigante na cultura, no envolvimento social e comunitário, homem de ação e de exemplos. Sempre que podia ía às missas das noites de domingo para ouvi-lo, não porque acreditava em desideratos de fé, eu que sou agnóstico, mas porque ele acreditava no que dizia. Suas palavras positivas, homem viajado, extremamente culto, fazia meu pensamento voar. Nada mais significativo do que ouvir pessoas que falam com o coração, assim como também se expressam o inigualável Padre João Corso e o Padre Paulo Augusto Farina.
A liga entre os dois parágrafos anteriores é a minha subjetividade. Sempre ouvia na Rádio Planalto, quando faltavam cinco minutos para as sete da manhã, as mensagens religiosas, sublimadas de ética e moral do Recolhimento, na cândida voz de Paulo Farina. Sempre ouvia, nos sábados pela manhã, na Gaúcha o programa Brasil Grande do Sul, na arte de Jayme Caetano Braun. A esse pajador missioneiro encontrava familiaridade, afinal, ele viveu em Cruz Alta e Passo Fundo, tal qual Jorge Anunciação. Isso, ingenuamente, tornava-me próximo ao pajador, dava a impressão que sentávamos a mesma mesa. Jayme, certa feita, receitando como varrer os corruptos – corruptores e corruptados – do Brasil, acenava com o simples canetaço, não votando mais nessas gentes (não seria à bala/pois, faltaria cartucho/nem no estilo gaúcho/ dando de mango e de pala).
São Borja e Jayme sempre nos remeteram aos imemoriais orgulhos riograndeses, dos gaúchos de cepa, independentes de serem prós às causas do Império, tal qual Flores da Cunha ou rebeldes, simpáticos a um Rio Grande independente como Honório Lemes, o Leão do Caverá. Sobre Honório contavam-se frases folclóricas como – se a bala vier por baixo, nóis pulemo/se vem por cima, nóis se agachemo/se vier pelo meio, nóis se caguemo. Há outra, essa sim, verdadeira – dizia: sonho em viver em um país governado por leis e não pelos homens. Sobre Flores da Cunha, certa feita, teria dito que havia perdido muito dinheiro apostando em cavalos lerdos e mulheres ligeiras. Notas folclóricas, talvez.
O fato é que quando Flores da Cunha rendeu Honório Lemes este entregou suas armas. Flores mandou devolvê-las ao Leão do Caverá com a justificativa de que – assim, somente assim, poderiam conversar como iguais.
São Borja e Guareschi, atualmente. Flores, Honório e Jayme, ainda ontem. É, a gente tem muito por lutar, se não para construir legado, pelo menos para manter o já constituído.