Há uma passagem bíblica em que Jesus mencionaria: não vos preocupeis com o dia de amanhã, cada dia merece o seu cuidado. Como sempre é um grande convite à reflexão sobre como se deve viver a vida de hoje. Pretende demonstrar que os devaneios sobre o futuro que ainda não há e o pretérito que deixou de ser deveriam ser secundários ao que é.
E o que é, além daquilo que hoje se estampa? O que é, é exatamente hoje porque hoje é sábado. E parece ao cidadão mundano que nem eu, que os melhores dias da semana começam na quinta-feira porque aí começam os doces sorrisos, proliferam as ideias de encontros e congraçamentos. Isso é a vida, um eterno brinde que se não for por motivos grandiosos, que seja pelo simples fato de permanecermos nela, sem que ninguém tenha tido o propósito de deletar a gente.
Viver o dia como se não houvesse amanhã, Carpe Diem, de Horácio, ou o brinde a nós mesmos, heroicos sobreviventes de mazelas da sociedade ou da limitação das nossas condições de saúde. Brinde ao time que perdeu hoje e que vencerá amanhã ou ao seu inverso. Brinde ao amor que foi embora ou ao que virá, ou mesmo ao que permanece. Brinde simplesmente porque o amor fez parte de nossa história pois como se pretende dar distinção a uma vida que dele prescindiu?
Não apresse o rio, ele corre sozinho é um livro de copyright 1970, de autoria de Barry Stevens e que propõe uma interpretação daquilo que diz-se mencionado pela figura de Jesus, o ungido sobre a preocupação à cerca do dia de amanhã. Seria um conselho sobre não forçar a barra da vida, deixar os caminhos fluírem naturalmente, buscar o zen, estar absolutamente aberto ao que os acontecimentos do cotidiano tentar ensinar. Há uma passagem em que alguém busca conselhos de um sábio. Este enche a xícara de chá do visitante até que ela transborda. O visitante chama a atenção do sábio porque a xícara está cheia e nada mais cabe nela. Então o sábio conclui: sua mente também está cheia e parece nada mais nela caber. Você, se está infeliz com o que tem vivido, tem que aprender a esvaziar tudo o que lhe é insuficiente, e encher com o que poderá servir de orgulho e plenitude.
Hermann Hesse, em Siddartha (Nobel de literatura em 1946) aborda o mesmo tema. Assim como Hesse e Barry Stevens, timidamente vamos buscando sempre dentro de nós mesmos as perguntas que erradamente fazemos aos psicólogos, psiquiatras, pais-de-santos, aos deuses. Dizem que há numa garrafa de vinho mais filosofia que em muitos livros. Não é um convite à bebida, é apenas uma consideração sobre livrar-se das amarras, esvaziar a mente e refletir que pode não haver amanhã e que o ontem já nos deixou.