Missa na rodovia lembra morte de agricultores

Como parte do protesto, agricultores interromperam a rodovia várias vezes ao dia

Por
· 2 min de leitura
Celebração no quilômetro 248, em Ciríaco, reuniu agricultores de diversos municípios da região norte do EstadoCelebração no quilômetro 248, em Ciríaco, reuniu agricultores de diversos municípios da região norte do Estado
Celebração no quilômetro 248, em Ciríaco, reuniu agricultores de diversos municípios da região norte do Estado
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

Uma missa realizada sobre o asfalto da BR 285, no município de Ciríaco, ontem à tarde, foi a maneira que produtores rurais encontraram para chamar a atenção das autoridades sobre a disputa de terra na região norte do Estado e também homenagear a memória dos irmãos Alcemar de Souza, 41 anos, e Anderson de Souza, 26, mortos por índios caingangues no município de Faxinalzinho. O duplo homicídio completou 30 dias ontem. 

O caso está sendo investigado pela Delegacia da Polícia Federal de Passo Fundo. Cinco índios permanecem presos. Outros três suspeitos já foram identificados. A PF estima um prazo de 45 dias para conclusão do inquérito. Na semana passada, uma espingarda e um espeto, provavelmente usados nas mortes dos irmãos, foram encontrados distantes cerca de 100 metros do local do crime. As armas já foram encaminhadas à perícia.

As manifestações no quilômetro 248 iniciaram por volta das 10h. A rodovia foi bloqueada por tratores e o trânsito liberado em intervalos de 10 minutos. Organizada pela Comissão de Agricultores de Ciríaco, o protesto chegou a reunir cerca de 1 mil pessoas, incluindo prefeitos, vereadores e lideranças sindicais de toda a região.

Durante o ato, no início da tarde, o deputado estadual Gilberto Capoani (PMDB) voltou a criticar a falta de isenção nos laudos antropológicos realizados pela Funai e disse que a Constituição Federal é claríssima no que diz respeito às demarcações de terras indígenas a partir de 1988. Já o ex-prefeito do município de Marau, Vilmar Zanchin, afirmou que a situação só não foi resolvida ‘por falta de vontade dos governantes’. “É só cumprir a lei. Se uma escritura, um documento, não tem valor, ninguém mais tem poder sob sua propriedade” declarou.

O objetivo dos moradores de Ciríaco é evitar o início dos estudos para futuras demarcações de uma área estimada em 9,7 mil hectares, o que atingiria 250 famílias, responsáveis por 70% da arrecadação do município. “Não tem negociação nas nossas áreas. Ninguém está disposto a sair daqui” declarou Joldério Moresco, integrante da Comissão de Agricultores de Ciríaco.

Inusitado
Há 25 anos no ofício, o padre Valcir Rizzardi disse que a decisão inusitada da comunidade em rezar a missa sob a rodovia é a maneira de manter viva a memória dos dois agricultores mortos em Faxinalzinho. O religioso defende a permanência dos agricultores nas propriedades e disse que a resolução da disputa agrária deve ocorrer de maneira pacífica e ágil. “Precisamos evitar sofrimentos para ambos os lados. Esta demora só acirra os ânimos” observou.
Logo após o ato, os moradores iniciaram a montagem do altar sobre o asfalto. Os bancos da igreja existente no local também foram enfileirados sobre a pista. “Nunca vi algo assim, mas se for para manter nossas terras, vale a pena” disse um agricultor. Durante a missa, o padre Rizzardi lembrou por várias vezes o episódio de Faxinalzinho e questionou a indefinição dos governantes sobre a questão. Ao final, duas pombas simbolizando a paz foram soltas. As homenagens pelo primeiro mês dos dois agricultores encerraram às 17h, com um toque simultâneo dos sinos em toda a região norte do Estado.

Gostou? Compartilhe