OPINIÃO

O caçador de palavras

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m 1993 Walcyr Carrasco lançou o livro com o título acima narrando a saga de Júlio Malatesta à procura da palavra que mostrasse o significado de toda uma existência. Algo que resumisse tudo e que, ao mesmo tempo, desse o significado da travessia e breve à aventura que chamamos vida. Júlio Malatesta pensou para si mesmo a palavra amor e que tudo de não adviesse disso teria sentido. Uma mãe relatou o drama de a cada dia acompanhar o estado estacionário de seu filho convulsionado aos oito anos e que com lesão cerebral. Agora, aos vinte e cinco se comporta com a mente infantil.

Lembrei de Walter Queiroz, autor de Pode Entrar que Fafá de Belém cantou em 1975. Conta que mora num casa no Rio, com pátio, árvores e pássaros. Não mora só: mas, não me sinto só / tenho um vizinho / que é um bêbado velhinho que acredita no destino / ele mora em cima do arvoredo / ele tem muitos brinquedos / ele sempre foi menino.

Disse à mãe do filho, eterno menino, que o Criador lhe deu a nobre missão de compartilhar a rotina de uma criança, que assim, por criança, certamente teria só doces sonhar e doces palavras. O bêbado velhinho de Walter Queiroz acreditava no destino. No que acreditaria a mãe? Qual seria o significado de sua existência e de seu filho senão o amor ou compartilhamento?
Tenho caçado palavras a vida inteira. Tenho pesquisado junto aos meus alunos a palavra marcante de suas incipientes existências. suas palavras evidentemente são compatíveis com suas idades: Paixão, esperança, otimismo, família, amor, sonhos...
Eu sessentão falaria família, amor, paz, significado, fé...

Paulo Leminski, falecido poeta paranaense, poetizou uma inscrição na solitária lápide de um cemitério qualquer: aqui jaz um grande poeta/nada deixou por escrito/esse silêncio, acredito / é sua obra completa.
Acredito que nossas existências tenham palavras diferentes ao longo dos anos. Tal qual as estações do ano são as estações das nossas vidas. Temos a primavera, onde é tudo colorido e intenso, acreditamos na páscoa e natal e vivemos junto das pessoas que amamos e isso basta. Depois, iniciamos e permanecerá por longo tempo, o verão. Fase hormonal e de luta. No outono vêm os brancos e suas epifanias. Vem a contemplação e os questionamentos, a busca das palavras e seus significados. Por último, o inverno, o frio, a sensação de abandono, da falta de calor. Dizem que os frutos do outono e inverno são os mais saborosos.
Estou nessa transição entre verão e outono, devo admitir. Por vingança estou pensando na palavra intensidade. Viver com intensidade os meus familiares, os momentos todos. Viver com intensidade minhas músicas e livros.

Lemisnki tinha razão, penso. A obra do poeta é sua vida intensa, o cotidiano com seus significados, a intensidade de cada instante. A epopéia da vida não fica presa a palavras. A contemplação do silêncio vale mais que mil palavras. O histórico e o deleite das estações de sua existência é o que justifica se nossas vidas teve significado e se há uma palavra que fielmente resuma cada fase de sua passagem.
Qual seria a palavra que definiria tua existência?

 

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