Meus filhos duvidam, mas nossa TV de infância era de 14 polegadas de imagens em preto e branco. O celofane tentava dar cores e o Bombril nas antenas tentava captar aquilo que nem era gerado. Telefone era para poucos e os passeios motorizados aconteciam aos domingos quando Tota, nossa tia mais velha, levava a gente para passear a tarde inteira nos ônibus de Cruz Alta. Quer dizer, faltava quase tudo ao que chamamos conforto, mas sobrava tempo.
Confesso que andava sucumbido à celeridade da atualidade, sem me dar conta e sem precisar se o vivido era absolutamente necessário. Minhas preocupações como dirigente da Unimed e com os debates na Rádio Planalto obrigavam a uma atualização permanente. Então, debruçava sobre mil exigências da Agência Nacional de Saúde e sobre o dia-a-dia das centenas de atendimentos, queixas de colegas, de clínicas, ao mesmo tempo em que era preciso inovar, era preciso administrar e planejar. Mas, não há nada de errado nos relacionamentos que não possa ser solucionado com o que há de certo nos relacionamentos.
Para manter a atualização me dedicava diariamente à Folha, Zero Hora, O Nacional, O Estadão, Carta Capital, Veja, Isto É, Globo e Clic RBS, além de devorar os livros sugeridos pela FAAP (São Paulo), onde minha filha cursa Relações Internacionais.
De repente, a turma que comanda a cooperativa foi democraticamente trocada, a Rádio Planalto trocou a gerência e a grade de programas e começou a sobrar aquilo que tinha demais na infância – o tempo. Quem tem tempo pode filosofar e eu adoro fazer isso, mesmo surfando na superficialidade típica de leigo.
O que importa realmente na vida boa se não fazer as coisas todas pelo prazer de fazê-las ou por amor? Se agente não é capaz de demonstrar o amor de Jesus, o incondicional, o que oferece a outra face, pelo fato da nossa animalidade peculiar talvez devêssemos considerar empreender amor de Aristóteles, ou pelo aquilo que possuímos. Exemplo, eu tenho o mês inteiro para dispor ao invés de condicioná-lo somente ao dia de receber o salário. Não poderia e nem deveria abdicar do dia presente, vivê-lo intensamente, pois navegar é preciso. Os filósofos definem que vivemos a escola da tristeza, aquela que transfere os melhores momentos para o dia que há de vir. Amanhã vai ser outro dia, cantam por aí.
Ao reobter o que soneguei a mim mesmo, o tempo, percebi que a felicidade é agora, quando percebo que amo esses momentos de preguiça pelo simples fato de que gostaria que eles se eternizassem, que jamais acabassem. Isso é o que se pode definir como felicidade, ou seja, que o que estamos vivendo fosse a regra de nossas existências. Agora, há tempo para exercitar o melhor, sem apegos, sem pressas. E, talvez, o melhor que se tenha seja o de praticar a filosofia, mesmo que sobre ela tenhamos entendimentos tão pífios.