OPINIÃO

A viagem do TED em busca da felicidade

Por
· 3 min de leitura
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

Chris Anderson, dono do TED (sigla para Tecnologia, Entretenimento e Design), em entrevista das páginas amarelas da revista Veja (edição 2378 – ano 47 – nº 25, de 18 de junho de 2014), destacou que, entre as palestras da popular rede de debates na internet, para ele, as mais marcantes foram aquelas que trataram de “felicidade”; especificamente de como podemos alcançá-la. Incrível que um empreendedor multimilionário do calibre de Anderson, que se destacou por apostar em coisas relevantes no mundo dos negócios, mostre-se inclinado para um tema que soa bem ao estilo autoajuda: a busca da felicidade. 

São muitas as receitas de felicidade. A de Platão, posta na sua celebrada República, vista hoje, soa como um manual de sadismo. A de Santo Agostinho, em A Cidade de Deus, prega o triunfo da alma sobre o corpo, na outra vida evidentemente, ao realçar que o prazer de morrer sem dor é bem maior que a dor de viver sem prazer. Eu, mesmo sabedor de que se trata de algo impossível, prefiro a tese de Eduardo Punset, que, no livro “The Happiness Trip”, advoga que felicidade é simplesmente a ausência de medo.

Eduardo Punset, um intelectual de escol internacionalmente reconhecido, pela carreira que construiu como advogado, economista, político, escritor e comunicador científico, possui credenciais de sobra e goza de credibilidade pública mais que suficiente para escrever um livro tipo “The Happiness Trip” sem ser rotulado de engajamento com qualquer causa ou resvalar em clichês autoajuda. Inclusive, a obra em questão foi avalizada por Antonio Damaso, professor de Neurociência e diretor do Instituto do Cérebro e Criatividade na University of Southern California, em Los Angeles/EUA, que assina o prefácio. Damaso argumenta para justificar o livro que a área das emoções é a última fronteira do cérebro que falta ser cruzada para o melhor entendimento do comportamento humano e que foi sábio Eduardo Punset ao enfocar emoções pelo lado positivo (felicidade) e não pelo negativo (tristeza), que costumeiramente damos maior peso.

Viver sem medo pode ser uma quase utopia (um lugar que não existe, conforme a clássica definição de Quevedo). Ainda que a maioria de nós não espere encontrar um leão em cada esquina que dobrar, viver sem estresse nesses tumultuados dias do século 21 não parece ser fácil e nem simples. E, por mais incrível que pareça, algo que torna o mundo um lugar um pouco pior, é que muita gente descobriu uma forma de aliviar o estresse fazendo os outros infelizes. Descarregando a sua agressividade e frustrações sobre as outras pessoas. É o popular “evitar desenvolver úlceras à custa de causar úlceras nos outros”.

Viver um estado psicológico de antecipação permanente, não raro de coisas ruins, pode ser desastroso e dar causa a infelicidade pessoal. São exemplos: quantos dias ainda faltam para a minha morte?; lamentar por algo que ainda não aconteceu; e viver em estado de introspecção excessiva.

Um dos aspectos realçados por Eduardo Punset é que, fisiologicamente, para o cérebro, estresse e prazer são idênticos. Apenas com bases nos sinais vitais de um indivíduo, possivelmente, um atendente da SAMU, por telefone, não saberia diferenciar (ou teria dificuldade para tal) se esse paciente estaria tendo um orgasmo (o prazer fatal, conforme se insinua sobre os não tão raros enfartes durante o ato sexual) ou entrando em luta corporal com um assassino em série. E mais, que o oposto do amor não é o ódio, como muitos supõem, pois, fisiologicamente, para o cérebro, esses sentimentos são similares. O oposto do amor é a indiferença ao sofrimento dos outros, como bem frisou Elie Wiesel, sobrevivente dos campos de concentração nazista e agraciado com o Nobel da Paz de 1986 pela obra dedicada ao resgate da memória do holocausto.

Talvez a felicidade esteja mais próxima de todos nós do que imaginamos. Possivelmente, para o seu alcance, sejam dispensáveis os manuais de autoajuda e as palestras do TED, por melhores que sejam. E, é bem provável, também, que seja inócua a receita do sexo, drogas e rock-and-roll. Eu, depois da leitura de “The Happiness Trip”, por pragmatismo e precaução, procurarei manter o distanciamento seguro dos FDPs, que, para aliviar seus estresses ou dar azo as suas frustrações pessoais, não medem esforços para infernizar a vida dos outros.

 

Gostou? Compartilhe