Em 1966, tinha eu nove anos de idade e curtia Roberto-Vanderlei Cardoso, Hermann’s Hermits. Mas, era amarrado mesmo em Chico e a Banda...estava à-toa na vida e o meu amor me chamou prá ver a banda passar tocando coisas de amor. Nada sabia, nem poderia saber, dos desideratos que a vida poderia me apresentar. Sabia que seria feliz e deveria lutar para isso vir a ser. Cruz Alta, bucólica com acessos de estrada de chão por todos os lados, ônibus com correntes nas rodas para os dias chuvosos. Um ano antes tinha conhecido a neve. O Grêmio e Inter nem existiam para a gente, nosso negócio era Guarani-Nacional-Riograndense contra São Luiz-Gaúcho-Tamoio-Elite.
Nesse mesmo ano, cá em Passo Fundo, aportava o jovem médico Paulo Lamaison Santos para sua carreira de sucesso, também na esfera política. Dr Paulo me brinda com sua leitura às crônicas e me oferece uns escritos à mão, escritos com sangue e de desalento ao que vemos, ao que constatamos. Nem me refiro à classe política e seus acertos com o empresariado, nem me refiro à falta de opções para o comando moral e ético que necessitamos. Não nos iludimos mais ao messianismo, percebemos com enorme tristeza que A Revolução dos Bichos, de George Orwell permanece atual, em que ao ascendermos ao poder ficamos todos nivelados, por baixo.
O desalento de Paulo Santos, ele que é tão brincalhão e otimista, não é pelos políticos, é pelo cidadão comum, entristecido e que confunde isso com depressão, é pela insegurança da sociedade cada vez mais afeita aos bandidos que vão nos enclausurando dentro das grades das nossas casas e dos muros. O desalento também vem pelo fato de pensarmos um mundo de lisuras de conduta, lisuras que parecem ilhas diluídas num mar de irregularidades em busca daquilo que parece ser o verdadeiro end-point das existências: o dinheiro e a consequente ascensão social a qualquer preço, a qualquer ato.
Todos têm pressa para a riqueza, muitos atropelam o que pode ser atropelado, perdemos os valores da vida, perdemos os valores familiares. Nem sabemos se deixaremos algum legado sem que pareçamos ultrapassados. Tenho um vantagem sobre meus filhos: sou filho de pai pobre. Meus filhos não são filhos de pais pobres, o que significa que as lições que as estradas de chão, que a falta de luz e de água, que a aridez financeira que a mim calejaram, graciosamente não calejaram meus filhos. Que bom que pudemos alcançar um mundo mais confortável as nossas criança, que ruim que comer iogurte não fortalece os dentes.
O alento é que muito do que serão nossos filhos depende, da mensagem que transmitiremos. O alento é que a vida não é somente TV, políticos e maracutaias, o alento é que podemos, no aconchego de nossas casas, ninar nossos filhos e brindá-los com as nossas histórias aquelas, das estradas da vida.
Caro Paulo Santos, Paulo Festa, precisamos do teu alento porque de desalento estamos contemplados cada vez que lemos, ouvimos e assistimos TV.
Obrigado pela leitura e pelos escritos.