OPINIÃO

Teste o seu conhecimento

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A você que tem se alvoroçado em diatribes sem limites ao desempenho dos estudantes brasileiros no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), denotando até certa “satisfação” em frisar que 529 mil alunos zeraram a prova de redação em 2014, sugiro cautela. Afinal, os jovens de hoje podem saber proporcionalmente menos de um conhecimento que é muito maior do que o de outrora, porém, em termos absolutos, sabem muito mais que os pares do passado. Ou alguém duvida que a ignorância (sobre muitas coisas) também não grassava entre aqueles que, em tempos relativamente recentes (anteriores ao advento do ENEM), chegavam às portas das Universidades/Faculdades brasileiras? Por acaso é lícito assumir, meramente por uma questão de geração, que os estudantes do passado eram mais bem preparados intelectualmente que os de hoje?

Não vou retroceder muito no tempo. Deliberadamente, para não ofender ninguém, usarei o meu próprio caso. Aluno egresso do Segundo Grau (atual Ensino Médio), escola pública (Escola Técnica de Agricultura, Viamão/RS), no final dos anos 1970, e detentor de um nível de conhecimento que seria praticamente nada se comparado com o que sabe um estudante de hoje, esse foi suficiente para lograr aprovação num vestibular relativamente concorrido da UFRGS, no começo dos anos 1980. Com o que eu sabia na época, estou convicto disso, não tiraria uma nota elevada no ENEM atual. Então: seriam mesmo as gerações passadas melhores preparadas pela escola de antigamente que a atual? Tenho cá minhas dúvidas, pois, assim como eu, quem sabe você, prezado leitor, também encontre certa dificuldade para responder questões relativamente simples, quando essas exigem fundamentação teórica um pouco mais robusta; tipo: quem veio primeiro, a galinha ou ovo? Ou: por que a água do mar é salgada?

A perguntinha aparentemente cretina – galinhas versus ovo –, apesar do que supõem muitas pessoas, tem resposta. E estou falando em resposta com fundamentação em teorias cientificamente aceitas desde a segunda metade do século 19. Admitindo-se que não é o criacionismo e nem o seu avatar contemporâneo, a teoria do desígnio inteligente, mas sim o evolucionismo que é ensinado nas aulas de biologia, a resposta esperada, digna de um ser pensante, seria embasada nas obras de Charles Darwin (Origem das espécies, 1859) e de August Weisman (O germoplasma, 1893). Foi Weisman quem, condicionando sua teoria na herança, estabeleceu o contraste entre o que se herda (germe) e o que não se herda (soma), não deixando espaço para dúvida que é a célula germinal que dá origem a um novo indivíduo. Portanto, a resposta lógica é que o ovo, provindo como uma forma nova de ovo, a partir de um animal ancestral imediato da galinha, apareceu antes do que a galinha.

Quem, quando criança ou depois de adulto mesmo, já tomou um “caldinho” nas águas geladas e revoltas do Atlântico Sul, sabe, por experiência vivida, que a água do mar é salgada. Mas, por que essa água é salgada? A resposta não é difícil, basta uma breve rememoração das aulas de química (dissolução e separação de misturas). De fato, são as águas doces dos rios e riachos que correm para os mares que, no seu longo percurso cruzando os continentes, vão dissolvendo rochas e carregando sedimentos e solutos para os mares. Os sedimentos acabam sendo depositados no fundo desses cursos de água e dos mares e os sais permanecem dissolvidos nas águas. E mais: lembre-se que um dos componentes do ciclo hidrológico é evaporação, que, nos caso dos mares, apenas a água mudando de estado físico e sendo essa, na forma de vapor, arrastada pelas correntes atmosféricas, serve para elevar a concentração de sais nos oceanos. Pense nisso ocorrendo por milhares e milhares de anos (um bilhão de anos, pelo menos) e entenda porque os oceanos que, um dia, foram de águas doces hoje são salgados.

Antes que você não consiga mais refrear a vontade de cortar os pulsos ou de mandar o escriba para a P.Q.P., por precaução, deixo de formular qualquer questão (estilo ENEM) sobre a obra de Shakespeare.

 

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