OPINIÃO

Selma e Griffith

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Impossível não acompanhar a cerimônia do Oscar deste ano sem comparar com a cerimônia anterior, marcada pela forte presença de temas referentes ao racismo e ao preconceito, que premiou “12 anos de escravidão”. Neste ano, muitos criticaram a ausência de atores e diretores negros entre os principais indicados – como se fosse obrigatória que essa margem fosse preenchida todos os anos, independente da qualidade. “Selma”, de Ava DuVernay, estava lá concorrendo a melhor filme, e a apenas mais um prêmio, o de melhor canção (que merecidamente ganhou. “Glory” é uma música formidável). A ausência de outras indicações deixa transparecer que o filme foi indicado mais para constar da lista final e amaciar as críticas do que por méritos. “Selma” é um bom filme, e apenas isso. DuVernay, que poderia ser a primeira diretora negra indicada ao Oscar, não estava concorrendo simplesmente porque... não foi melhor que os outros indicados. É competente – quero ver seus próximos filmes - mas ao mesmo tempo em que demonstra talento na construção de sentido em uma linguagem de enquadramentos incomuns (os personagens continuamente dão as costas ao cenário e aparecem apertados no quadro) também tenta criar sentidos de maneiras que não convencem. “Garota Exemplar” e “O Abutre” mereciam muito mais estar entre os oito. “Selma” concorreu porque sua história é extremamente relevante e pelo legado histórico que deixa, exato meio século depois dos acontecimentos que mostra.

Lembrei de “Selma” porque, em 2015, lembramos do centenário de um filme igualmente importante e polêmico. “O nascimento de uma nação” convive, há 100 anos, com uma mescla de sentimentos. Por um lado é lembrado como, talvez, o filme mais racista da história, uma celebração da Ku Klux Klan como fiel depositária dos valores caucasianos da pura sociedade norte-americana. Por outro lado, é também fiel depositário de uma série de recursos de linguagem cinematográfica que justificam porque seu diretor, D. W. Griffith, é considerado o “pai da moderna linguagem cinematográfica”. Está quase tudo ali: princípios de montagem invisível, narrativa, escala de planos, interpretação. Tal história nem seria filmada hoje, seu roteiro não teria aprovação de nenhum estúdio. É um lixo em termos de conteúdo, e um tesouro em termos de forma e significado histórico. Comemorar os cem anos do filme não deve ser comparado a comemorar o que ele retrata em sua narrativa, portanto, mas conheço gente que não suporta olhar para o filme, nem mesmo com a curiosidade de um historiador.

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Liam Neeson que me perdoe, mas é hora de deixar Bryan Mills finalmente descansar. O personagem principal da série “Busca Implacável” não emplaca mais. “Busca Implacável 3” mostra que a fórmula esgotou. Não basta a história, chupada de “O Fugitivo” (aquele filme em que Harrison Ford interpreta o Dr. Kimble, que é acusado de um crime e precisa fugir enquanto tenta provar sua inocência) a edição deste terceiro filme é um tapa na cara. Nos momentos de ação extrema, temos quatro, cinco cortes em menos de um segundo, com enquadramentos mal escolhidos que só conseguem deixar uma sensação incômoda de tontura em vez de passar a ideia de urgência. Deixem Bryan descansar, já passou da hora.

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A partir desta semana, a coluna, que se chamava Cinefilia, passa a adotar o nome do projeto Ponto de Cinema, que em breve deve divulgar suas atividades para 2015. Já adianto que teremos cursos de compreensão e discussão do cinema, convidados, palestras e mostras com exibições gratuitas direcionadas a grandes clássicos, temas e diretores em praticamente todas as semanas. O Museu de Artes Visuais Ruth Schneider deve ser um dos parceiros nessa empreitada, para que essas mostras sejam acessíveis aos amantes do cinema todos os finais de semana – além, claro, da parceria do jornal O Nacional. Mais notícias em breve.

 

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