OPINIÃO

Luiz Inácio (300 Picaretas)

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Escrevi a coluna de hoje incrédulo, após o pronunciamento da Presidente Dilma Rousseff em rede nacional de rádio e televisão. A lembrança de uma música dos Paralamas do Sucesso atravessou meus pensamentos sem esperanças: "Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou/ são trezentos picaretas com anel de doutor". Essa música foi composta em 1994 e tinha como base uma frase, dita por Lula, em 1993 sobre a maioria de Congressistas que defendiam seus próprios interesses. Ao tornar a frase conhecida em seus versos, os Paralamas foram proibidos pelo Ministério Público de executá-la em um show em Brasília.

O discurso de Lula e do Partido dos Trabalhadores sobre o Congresso Nacional sofreu uma transformação quando estes trocaram a oposição pelo governo. Se, em 1993 ele declarou que, “de todos os Deputados no Congresso, pelo menos 300 são picaretas”, crítica repetida em 1994 – “Aquilo que eu falei de 300 é um pouco mais”, e posteriormente em 1998 – “Uma vez falei que havia uns 300 picaretas no Congresso, mas a coisa só piorou”, em 2002, com a vitória à vista, a retórica mudou.

O apoio agora vinha dos até então considerados “grileiros”, ladrões e impostores, tudo pela tal governabilidade. Explico, em 1986, Lula disse que “Sarney não vai fazer reforma agrária coisa nenhuma, porque ele é “grileiro” no Estado do Maranhão”. Em 1987, declarou que, “Adhemar de Barros e Maluf poderiam ser ladrões, mas eles são trombadinhas perto do grande ladrão que é o governante da Nova República”. E assim, chamou Sarney de impostor, pois este “chegou à Presidência assaltando o poder”. Na sua campanha à reeleição, Lula fez uma autocrítica: “Eu me dei conta de quantas vezes nós cometemos injustiças contra pessoas. Uma coisa eu tenho tranquilidade, Sarney: nunca lhe ofendi”.

Em 2015, primeiro ano do novo governo ou, 5º ano do governo Dilma, o Ministro da Educação, Cid Gomes, do PROS (Partido Republicano da Ordem Social), critica os Deputados da República, declarando que todas as forças políticas que têm “compromissos sociais” se opuseram à eleição do Deputado Eduardo Cunha do PMDB para a presidência da casa. O Ministro lamenta: “Tem lá uns 400 deputados. 300 deputados que quanto pior, melhor para eles. Eles querem é que o governo esteja frágil porque é a forma de eles achacarem mais, tomarem mais, tirarem mais dele, aprovarem as emendas impositivas”.

A música ainda passa em meus pensamentos: “eles ficaram ofendidos com a afirmação/ Que reflete na verdade o sentimento da nação/ É lobby, é conchavo, é propina e jeton/ Variações do mesmo tema sem sair do tom/ Brasília é uma ilha, eu falo porque eu sei/ Uma cidade que fabrica sua própria lei/ Aonde se vive mais ou menos como na Disneylândia/ Luiz Inácio falou, Luiz Inácio avisou”. O PT falou, o PT avisou, mas foi o primeiro a ultrapassar seus valores e contribuir com a mistura que se desenhou a partir 2003.

O fato é, que ao longo dos últimos vinte anos, evoluímos e incorporamos ao mundo político novas expressões: picaretas, mensaleiros, petroleiros, achacadores. Como um copo de chopp que transborda, a crise política começa a invadir as ruas: assistimos atentos ao movimento dos caminhoneiros e agricultores com suas reivindicações que estacionaram o país. Nessa semana, no dia 13 de março, o movimento em apoio ao governo Dilma, à Petrobrás, a taxação das grandes fortunas e o fim do financiamento empresarial para as campanhas políticas, e, no outro lado, o ato contra o governo no dia 15 de março que promete parar o Brasil.

Enfim, entre picaretas e achacadores, precisamos manter nossos sentidos em nossa maior conquista: a democracia. Esta jovem que ainda está amadurecendo, precisa crescer e ampliar a consciência para que antigos paradigmas se quebrem. Não podemos permitir que a música termine com mais 300, 301 ou 302 picaretas. “Pra fazer justiça uma vez na vida/ eu me vali deste discurso panfletário/ mas a minha burrice faz aniversário/ ao permitir que num país como o Brasil/ ainda se obrigue a votar por qualquer trocado/ por um par de sapatos, um saco de farinha/ a nossa imensa massa de iletrados/ Parabéns, coronéis, vocês venceram outra vez/ O Congresso continua a serviço de vocês.”

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