Li esta semana uma excelente análise sobre o fenômeno dos livros de colorir em artigo escrito por Bernardo Carvalho, um dos escritores expoentes da nova geração brasileira.
Foi a opinião mais lúcida e contextualizada sobre o tema, longe da divisão maniqueísta entre o bom e o ruim.
O escritor relaciona os livros de colorir a um vídeo do encontro entre Juergen Boos, diretor da Feira de Frankfurt, e Paulo Coelho. O editor Boos estava deslumbrado ante um “escritor” de 160 milhões de exemplares vendidos no mundo. Boos, como bom empresário, não se importava em não ter um novo Nobel ao seu lado. Mas como bom negociante, estava babando por um sucesso editorial para a indústria do livro. Livros e literatura não são a mesma coisa:
“Tanto os livros de Paulo Coelho como os de colorir estão interessados em manter o leitor na sua zona de conforto. São livros relaxantes. Os de Paulo Coelho, fazendo o leitor acreditar que está descobrindo, como pérolas de sabedoria, aquilo que no fundo ele sempre pensou. São livros que, no lugar do conhecimento (que pressupõe o risco de se perder, o risco de resistir ao senso comum para se aventurar no incerto), confirmam o lugar-comum.”
Enquanto ainda padecemos o luto da não realização da Jornada Literária de Passo Fundo, há uma reflexão dolorosa para ser feita. É necessário aderirmos à verdade de que os culpados pela falta de dinheiro necessário à Jornada não é o poder público, nem as empresas que não aderiram ao mecenato, nem o reitor da UPF, nem a crise econômica. O culpado pela não realização da Jornada é o lugar-comum, ou seja, nós.
A Jornada não fracassou como bem cultural cuja contribuição é incontroversa, nem fracassou na formação de leitores, nem fracassou como espaço para a arte. A Jornada apenas não será realizada porque não é necessária, ao mercado. E quem somos os consumidores?
Se as empresas decidiram não investir na Jornada Literária, preferindo gastar com outdoors, camarotes de carnaval, rodeios com música sertaneja, programas de auditório, é porque nós, os consumidores, preferimos ficar na zona de conforto.
Comprar livrinhos de pintar mantém o mercado do livro, mas não da literatura, - que praticamente não vende -, e acaba por não interessar nem aos editores como Boos, nem às empresas que investem em eventos literários e culturais.
Enquanto continuares comprando livrinhos de colorir, que já venderam mais de um milhão no Brasil, e não comprares Milton Hatoum, que mal vendeu dez mil, não discurses pela Jornada de Literatura. Pega teus lápis de cor e vai se distrair. Sabes de nada, inocente!