OPINIÃO

Razão & Fé

Por
· 2 min de leitura
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

Blaise Pascal representa uma síntese perfeita de duas coisas que muitos julgam irreconciliáveis: a razão e a fé. Esse francês, nascido em 19 de junho de 1623, em Clermont-Ferrant, escreveu, quando tinha 16 anos, o clássico “Ensaio sobre as cônicas” (Éssai pour les coniques), que assombrou o grande Descartes. Foi o inventor do que se pode chamar de primeira calculadora manual. Realizou experiências com a pressão atmosférica, escreveu um tratado sobre o vácuo, inventou a prensa hidráulica, o carrinho de mão e a seringa, aperfeiçoando, ainda, o barômetro de Torricelli. Também ficaram célebres as suas teorias sobre probabilidades e o seu tratado do triângulo aritmético. E, apesar de tudo isso, há quem considere mais relevante a obra do teólogo e escritor que a do cientista, identificando Pascal, pelo seu estilo elegante e breve, como o primeiro grande prosador da literatura francesa.

Em 1639, com problemas de saúde, Blaise Pascal começou a abraçar a causa jansenista. Essa doutrina, criada pelo teólogo holandês, Corneliu Jansen, surgiu no seio da Igreja Católica, no século 17, e acabou condenada em várias bulas papais. Era, no fundo, uma pregação das idéias de Santo Agostinho, vista com olhos calvinistas, e reafirmada por Santo Tomás de Aquino. O jansenismo atribuía a salvação da alma ao juízo prévio e insondável do Criador. Seus principais adversários eram os teólogos da Companhia de Jesus que, influenciados pelo iluminismo, passaram a pregar a importância do livre-arbítrio e da colaboração da vontade humana na salvação.

As ideias jansenistas foram acolhidas com especial fervor por Jean Duvergier de Hauranne, diretor espiritual da abadia de Port-Royal. Preso por oposição à política de Richelieu, Hauranne foi sucedido por seu discípulo, Antoine Arnauld, que popularizou a doutrina ainda mais. Um grupo de intelectuais influentes estabeleceu-se em Port-Royal. Entre eles, Blaise Pascal. Port-Royal foi destruída em 1710, e os jansenistas adotaram uma postura mais política que religiosa, sofrendo investidas até a Revolução Francesa, quando praticamente desapareceram. Para alguns, os jansenistas eram os porta-vozes do progresso e da liberdade, e, para outros, não passavam de um bando de conservadores, que se escondiam no ascetismo místico e na ênfase da predestinação, para fugir das mudanças.

Após a morte de seu pai (1651), do casamento de sua irmã Gilberta e da entrada de Jacquelina, sua outra irmã, para a abadia de Port-Royal (1652), Pascal ficou só. Reaparece então um Pascal cristão, que aos 32 anos converte-se à religião definitivamente. Entra na luta de Arnauld contra os jesuítas. Publica, de 1656 a 1657, uma série de 18 cartas anônimas, atacando duramente os jesuítas, as quais compõem a monumental obra “As Provinciais” (Les Provinciales) que, junto com o “Livro dos Pensamentos” (Pensées), reafirmação da sua fé cristã, são as suas obras mais conhecidas.

Pascal acabaria morrendo em Paris, aos 39 anos, no dia 19 de agosto de 1662. Foi sobretudo um homem genial. Talvez sua frase mais popular, repetida por muitos, sem identificar autoria, seja esta: “O coração tem razões que a própria razão desconhece”.

Gostou? Compartilhe