Em 2010, um contrato entre Prefeitura de Passo Fundo e Corsan previu que, em 18 anos, o município passaria dos então 20% de esgoto tratado para a universalização do serviço. O projeto dividiu a obra em quatro etapas e a primeira delas estimava que, em três anos, cerca de 55% do esgoto da cidade já contaria com o serviço de tratamento. A projeção não se confirmou: hoje, Passo Fundo trata 25% do esgoto produzido em duas Estações de Tratamento de Efluentes - Araucária e Miranda - gerenciadas pela Corsan, aguarda que outros 10% possam passar pelo serviço a partir da ligação das redes das residências já autorizadas e busca a continuidade das obras, paradas há dois anos. De um lado, empreiteiras que questionam e criticam o projeto. Do outro, a resposta e compromisso da Corsan. No meio, a espera da Prefeitura. Entre tudo isso, o fato: o investimento foi feito e as redes foram construídas; parte delas, no entanto, ainda não funciona.
Cenário do esgoto em Passo Fundo
O mapa abaixo mostra o panorama atual do esgotamento em Passo Fundo: a área em cinza corresponde a 30 quilômetros de redes de esgoto antigas, no Centro, que direcionam os efluentes para a Estação de Tratamento Araucária. Em azul, 40 quilômetros de redes construídas que direcionam os efluentes para a ETE Miranda, localizada nessa região. Em roxo são as redes construídas que correspondem a 130 quilômetros e têm o direcionamento para a ETE Araucária, localizado no ponto laranja. Somando toda a extensão, o alcance do tratamento de esgoto pode chegar a 35% quando todas as residências que foram autorizadas ligarem as redes. Contabilizando as redes construídas, mas ainda impossibilitadas de serem ligadas, o percentual chega aos 55% prometidos. Nesta primeira etapa, foram investidos R$ 35 milhões em cerca de 170 quilômetros de novas redes. A segunda etapa da obra envolve um investimento de R$ 58 milhões e abrangerá o Boqueirão.
Erros no projeto
O processo de coleta e tratamento do esgoto, em Passo Fundo, acontece através de um escoamento por gravidade. Ou seja: todo o esgoto coletado é enviado para um interceptor que percorre a extensão do Rio Passo Fundo, nos pontos mais baixos da cidade. Esse interceptor direciona o esgoto para a Estação de Bombeamento, localizada na Cidade Nova. De lá, o esgoto é bombeado para a Estação de Tratamento de Efluentes Araucária, no Bairro Zacchia. E é, justamente, nesse processo de ligar as redes ao interceptor que alguns problemas surgiram. Uma fonte que não quer se identificar e que teve contato com a construção das redes, revelou ao Jornal O Nacional que, em muitos casos, não foi possível que as redes se conectassem ao interceptor. “As redes construídas são as chamadas redes de esgoto de conduto livre. O esgoto flui por elas por gravidade. O ponto de chegada tem que ser sempre mais baixo que o de saída. O projeto tinha erros de topografia. Erros de até um metro em praticamente todas as cotas altimétricas. O projeto não existiu”, comenta.
Um projeto recheado de falhas
Para as empreiteiras, os erros dificultaram o trabalho e resultaram no não funcionamento de parte das redes. “Em resumo, todas as dificuldades partem de um projeto mal concebido, um orçamento generalista e uma necessidade incessante de apresentar números- quantidade ao invés de qualidade -, aliado à fiscalização despreparada e o custo Brasil, que é o excesso de burocracia”, diz outra fonte, também ligada à obra, e que prefere não se identificar. Tal projeto, citado pelas fontes, foi elaborado ainda em 2008, pela Magna Engenharia e é uma espécie de norte para quem realiza a obra. Nele, além do trajeto a ser construído, estão, também, a metragem necessária de tubos e os locais e quantidades necessários escavar para que a rede funcione. De forma prática, o projeto é quem define a compra de material e, portanto, o preço da obra. “Com um projeto bom você tem duas possibilidades: executar uma obra boa ou ruim. Com um projeto ruim só há uma possibilidade: fazer uma obra ruim”, diz uma das fontes, ao acrescentar, também, que os principais erros estão ligados ao fato de o projeto não retratar a realidade da cidade. Segundo as informações, a teoria da obra indica que as redes deveriam passar por locais em que existem ocupações ilegais, moradias antigas ou, no caso da Vila Annes e Vila Cruzeiro, pela estação férrea. As empreiteiras alegam ter feito o que podiam. “Em muitos casos se implantam redes nestes locais. Falha de projeto, sem dúvida. Nada disto é previsto”, complementa.