Foi uma grande sacada a palestra de Percival Puggina esta semana no auditório da Academia de Medicina, sessão presidida pelo grande Carlos Madalosso. Percival (71) tem um histórico interessante, demonstra simplicidade e clareza de pensamentos e conduz suavemente a plateia apresentando suas contestações acerca de valores, educação e o delicado momento político e econômico do nosso país. Onde começariam as mudanças para retomarmos o orgulho, o sentimento de nação? Nas nossas casas, através do exemplo de conduta de pai e mãe, no resgate da ideia de família. Os valores são simples, são ensinados religiosamente ou não através da prática diuturna: honradez, compartilhamento-reciprocidade, responsabilidade social mesmo nas pequenas coisas. Esta semana vi uma mulher de idade acendendo um cigarro e jogando a carteira vazia no chão, na calçada. Deu vontade de pedir licença a ela para colocar a carteira na lixeira. Esse é o povo, ou alguns de um povo que reclama do governo, de qualquer governo. A gente não faz o tema de casa, mas cobra que outros o façam.
Percival Puggina merece ser lido e ouvido. Quanto mais velho a gente fica, mais interessantes são as palestras, a gente aprende a agregar pensamentos. Percival diz que não gosta de conversar com quem não sabe a verdade. Ele não gostaria de conversar comigo, portanto, porque estou permanente em busca dela (pensei chegar alcançá-la no estágio de índio rude / mas nunca na plenitude porque essa deusa baguala, aos andejos embuçá-la, ninguém nunca alcançou / bisneto, nem bisavô / nos pensamentos mais brutos / labareda de minutos / que o vento forte apagou). Onde está a verdade? Isso teria sido perguntado por Poncio Pilatos a Jesus e a resposta é pura filosofia. A filosofia não oferece respostas, que bom. A filosofia é busca de respostas.
Percival, além de tantos, não aprecia Paulo Freire. Aliás, detesta-o. Que pena, enquanto escrevo essa coluna olho o exemplar Pedagogia da Autonomia que comprei na Saraiva há alguns anos. Não gostar de Paulo Freire é porque não leu ou não entendeu a mensagem. O cara foi o brasileiro mais premiado no mundo inteiro e tem gente no país que o detesta. Suas ideias de libertação de um povo oprimido e ignorante são muito interessantes. Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém. Um dia, no Brasil, a esquerda se apossou das ideias de Paulo Freire, assim como os nazistas se apossaram do pensamento de Nietzsche. Paulo Freire e Nietzsche não escreveram suas lógicas para esse ou aquele grupo, escreveram para as pessoas. A ideia é somente uma ideia até que alguém se aposse dela e inicie uma transformação, aí pode até virar fato político. Seria bom lê-lo sem o viés da filiação partidária ou de qualquer doutrinamento político.
Nesse particular Percival me pareceu sectário e o sectarismo não deveria fazer parte de quem tem cabelos brancos pois quanto mais longevo mais claro fica a sensação de que estamos muito longe de sermos conhecedores da verdade.