Quem atentar minimamente para as noticias sobre as tempestades dessa primavera – vendavais, granizadas, chuvas intensas, etc. - espalhando desabrigados e prejuízos materiais vultosos no meio urbano e rural por todo o Rio Grande do Sul, além da imponderável morte de inocentes e a justificativa do até então sempre questionado muro da Mauá em Porto Alegre, erguido sob os auspícios da histórica enchente de 1941, que têm sido reprisadas quase à exaustão pelos veiculo de comunicação, não pode deixar de perceber que em muitas das suas nuanças tem um ar de dèjá vu; especialmente em relação ao El Niño de 1997.
No meio urbano, o drama dos desabrigados avulta os problemas de defesa civil e clama por solução ao poder público, que não raro, nessas situações, apela e conta mais com a solidariedade humana, via doações, que propriamente com recursos financeiros das esferas municipais, estaduais e federal. Esse é um surrado script que se repete, e será repetido a cada nova calamidade climática, enquanto a verdadeira causa dessas tragédias não for efetivamente atacada. Só não percebe quem não quer ver, que, por trás dos dramas vividos pelos atingidos pelas anomalias do clima, estão, em maior ou menor grau, cada qual com a sua parcela de culpa, a vulnerabilidade econômica que predispõe muitos a viverem sob extrema pobreza, a sanha pelo lucro fácil de especuladores imobiliários e autoridades públicas inoperantes, por omissão ou por incapacidade de fazer frente, com os orçamentos disponíveis, à dimensão do problema de desigualdade social que se apresenta ou a necessidade de construção de obras estruturantes. A solução definitiva exige o banimento da pobreza extrema do País e investimentos públicos em infraestrutura básica. Algo que, na atual conjuntura, soa utópico.
Na agricultura, a exemplo do que tem acontecido nos centros urbanos, os problemas e as dificuldades não são menores: animais (bovinos) mortos por raios, ovinos atingidos por granizadas fatais, aviários destruídos e frangos mortos; além de lavouras, especialmente de trigo e cevada, com problemas de doenças de espiga (giberela, especialmente) agravados pelo excesso de umidade, com indicativos, em alguns casos, de comprometimento da qualidade tecnológica dos grãos pela germinação em pré-colheita. E sem contar a destruição de estradas no interior e os problemas de erosão de solos.
Mesmo que os problemas mais graves de alagamentos estejam acontecendo nas regiões baixas do Estado, não se pode ignorar que boa parte desses, apesar do excesso de chuvas associado ao El Niño, poderia ser contornada por uma melhor conservação da água que cai nas regiões altas, onde estão as nascentes dos nossos principias caudais hídricos. Em síntese, nessas situações extremas, sobressai-se a necessidade de melhores práticas de conservação e solo e água nas áreas de lavoura do Planalto gaúcho, por exemplo. O plantio direto não é panaceia para a solução de todos os problemas de conservação de solo água em agricultura, como alguns imaginam e advogam. Há necessidade de adoção do manejo integrado dos solos e da água, inclusive com a criação de políticas públicas destinadas a esse fim, pois as consequências são sentidas muito além dos contornos das lavouras.
Quanto ao atual evento El Niño, todos os sinais são de que permanecerá atuando pelo menos até o final do verão de 2016. E se isso serve de alento, pelo menos, para a agricultura, os indícios são de uma perspectiva favorável para a produção d e soja e milho no sul do Brasil.
Sobre o impacto do El Niño nos preços das principais commodities agrícolas, há quem entenda que o seu efeito seja predominantemente local, uma vez que o mercado global está bem abastecido. Nesse tipo de situação, fatores nacionais específicos, podem ter impacto mais forte sobre os preços locais. Por outro lado, uma condição de clima favorável para a soja numa ampla região, abarcada pelo sul do Brasil e boa parte da Argentina, pode influir em maior oferta de grãos dessa oleaginosa na safra 2015/2016; que não pode ser ignorada.