OPINIÃO

Os novos videntes

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Os cientistas pensam e vislumbram o futuro por meio de conhecimentos adquiridos em trabalhos experimentais ou via concepções teóricas de mundo. E, embora conscientes que imaginar o futuro é correr o risco iminente de errar, os cientistas sabem, que, para algumas coisas, é possível distinguir entre o previsível e o imprevisível, enquanto, para outras, as respostas somente virão no decurso dos acontecimentos.

A capacidade para criar experimentos, fisicamente materializados ou teoricamente concebidos, cujos resultados, para merecerem a denominação de experimentos, não sejam antecipadamente conhecidos, e, de fato, gerar respostas interessantes, é o que distingue o cientista de um técnico especializado.

A humanidade, em algumas áreas do conhecimento, alcançou avanços substanciais. Em outras, os grandes saltos epistemológicos, ainda estão a aguardar novos desdobramentos. Em biologia, por exemplo, desde Darwin e Mendel, no século 19, passando pela descoberta da estrutura do DNA, no começo da segunda metade do século 20, até nossos dias, muito do que se sabe hoje permite especulações.

O mapeamento do genoma humano, talvez, venha ser a base para uma nova medicina. Em que a terapia genética, adicionando e reescrevendo genes, por meio da inserção de material genético funcional em células germinativas (espermatozóides e óvulos), poderá revolucionar a prática médica, determinando mudanças para sucessivas gerações. Darwin (seleção natural) será deixado para trás e, então, poderemos fazer uma revisão deliberada e consciente da evolução humana (uma evolução volitiva). Viveremos a época das “crianças projetadas”, em que, teoricamente, seria possível escolher tudo, da cor dos olhos ao nível de inteligência. Especula-se sobre a criação de super-pessoas, humanos geneticamente modificados, com talentos e características muito superiores as nossas (morais, de preferência). Nesse embate, entre a clonagem humana e a reescrita genética, sabe-se que a clonagem somente poderia produzir cópias de um experimento já realizado, enquanto, pela reescrita genética, para o bem ou para o mal, pode surgir um novo experimento.

O estudo da mente (como funciona a consciência humana) permitirá unir passado e futuro, biologia e cultura, natureza e sociedade, matéria e consciência e as ciências naturais e humanas, na opinião de Richard Dawkins. Todavia, Dawkins é, em resumo, não mais que um ultradarwinista, cujas idéias, centradas na hipótese de uma entidade egoísta (o gene), que funciona para preservar e propagar a si mesmo, não faz outra coisa que repetir a teoria de Darwin da evolução pela seleção natural operando no nível do gene e não de grupos, espécies ou indivíduos. A questão é que, fundamentalmente, não compreender nosso inconsciente talvez signifique o preço da nossa liberdade (ou sentimento de liberdade).

Outro ponto que buscamos respostas e, possivelmente, obteremos, diz respeito ao mecanismo gerador de novas formas de vida. A teoria de Darwin, centrada nas espécies ou nos genes (como quer Dawkins), não explica toda a evolução da diversidade da vida na Terra. Visões alternativas, como as da bióloga Lynn Margulis, ligadas a simbiogênese, que prega, pelo compartilhamento da vida, a partir de bactérias, o surgimento de novos organismos, serão comprovadas ou refutadas. Em resumo, não seria a molécula inerte do DNA a partícula fundamental da vida, como supõem os biólogos moleculares, mas as células bacterianas. Nosso triste destino talvez seja ver comprovado que não somos a obra-prima de Deus, como apregoam e gostaríamos de ser, mas o resultado de centenas de milhões de anos de interação entre micróbios.

Vivenciamos, na condição de protagonistas principais, alguns grandes experimentos. São eles: a explosão demográfica humana, o aquecimento global, o progresso da tecnologia e a evolução das espécies. Modelamos a evolução dos seres que nos servem de comida (animais e plantas) e, não satisfeitos, começamos o grande ensaio da evolução volitiva de nós mesmos. Onde isso vai parar? Por enquanto, ainda são experimentos em andamento. Um dia teremos de analisar os resultados.

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