OPINIÃO

Coluna Meneghini

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Santa Cecília
Tenho algumas memórias do ambiente em que vivia na minha terra natal, vilarejo de Santa Cecília, hoje município de Santa Cecília do Sul. Guilherme, meu pai, mantinha estabelecimento comercial, num prédio de madeira, que me parecia enorme. Um sobrado completava os quartos de hóspedes. Era a bodega, com várias mesas. Também uma espécie de rodoviária e hotel. Havia linha de ônibus para Passo Fundo, duas vezes por semana. Um galpão, ao lado, era a estalagem, estrebaria, pois a maioria andava a cavalo. Carroças para o transporte de produção e aranhas (charretes) para transportar mulheres e crianças. Caminhões eram raros, salvo reboques que transportavam toras, muitas toras dos pinheirais. Intensa extração de madeira, agricultura e criação de gado, eram a referência da economia. Meu pai era liderança na localidade, sempre foi homem de iniciativas. Também na Igreja, construída no alto do campo, uma organização obrigatória das comunidades.

O velho hotel
Ali no hotel de madeira, funcionava gabinete dentário que recebia visita mensal de um dentista para atendimento. A cancha de bochas e o bolão, além das mesas de carteado eram atração do domingo. O padre que oficiava a missa, vinha aos domingos de Água Santa, e o povo era chamado pelo repicar de um sino potente que ressoava longe, até as imediações do Roncador.

Diferença no funeral
A comunidade de Santa Cecília era povoada basicamente por colonizadores de origem italiana. Mas nos campos havia fazendeiros e pequenas propriedades afrodescendentes e descendentes portugueses. O estabelecimento de meu pai era aberto e todos, que eram recebidos e tratados da mesma forma. Alguns gringos não gostavam de se misturar com os chamados “braziliani”. Vivia ao redor da casa um homem solitário, quase andarilho e sem nome. De quando em vez parava lá em casa para algum trabalho temporário e refeições. Mas, homem de bem. Este andrajoso cidadão, negro, veio a falecer. Meu pai e algumas pessoas providenciaram tudo para o enterro do pobre sem parente. Inclusive mandou avisar ao encarregado da igreja para tocar o sino nas tradicionais badaladas fúnebres, o que acontecia durante alguns minutos, variando a insistência de acordo com a “importância” do finado. Veio um lacônico recado dizendo que não haveria toque do sino durante o séquito por se tratar de pessoa pobre e que não pagava dízimo. O velho se irritou com a ofensa. E, aos brados, puxou dinheiro da gaveta e entregou ao mensageiro advertindo que era o suficiente para tocar o dobro do tempo dedicado a cortejo de média duração. E empunhou seu relógio de bolso, para marcar o tempo exigido e pago. O tom desafiador não deixou dúvida, e o pobre homem foi sepultado de roupa nova! E o sino dobrou generosamente! O acontecimento causou espécie no povaréu, especialmente entre os mais abastados. Cada vez que seu Guilherme relembrava o fato, percebia o brio nos olhos azuis daquele homem altivo, alma nobre, de bondade, senso de justiça e igualdade, indócil aos simulacros de aristocracia.

Formandos de 1975
No próximo sábado, dia 28, haverá celebração dos 40 anos de formatura do Direito da UPF (diplomados em 1975), na Sede da Subseção da OAB de Passo Fundo, às 15hs. Em seguida, visita à Faculdade de Direito e às 19hs o jantar, na residência do Dr. Rudah Jorge. Se alguém da turma deseja confirmar, deve telefonar para o coordenador Dr. Ivens Ribas, pelos fones (54) 3313-4552 e (54) 99760167. Esta é a primeira turma que iniciou aulas no Campus da UPF, em 1973.

Retoques:
* Este mês marca o falecimento do jornalista Marcos Antônio Coelho, aos 89 anos. Teve uma vida literária brilhante versando sobre a história da mineração, onde advertia sobre o perigo de desastre causado pelo desleixo no Rio Doce. Dedicou uma vida ao bem da comunidade, mesmo depois de preso e torturado (1975), pela coragem e resistência à ditadura. Editou “Voz Operária” jornal do PC do B.

 

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