Dois gigantes na história da biologia geral (e da medicina em particular), Robert Remak (1815-1865) e Rudolf Virchow (1821-1902), foram protagonistas de uma discussão sobre a autoria da principal descoberta que deu sustentação teórica ao famoso experimento de Louis Pasteur, responsável por sepultar de vez a teoria da geração espontânea, ainda vigente no mundo até o começo da segunda metade do século 19.
Em 1854, Rudolf Virchow foi taxativo na afirmação de que “não havia vida exceto por meio de sucessão direta”, traduzida, um ano mais tarde, no moto latino “omnis cellula e cellula” (todas as células provêm de células) e posteriormente incluída no seu famoso compêndio “Die Cellularpathologie”, que o tornaria famoso mundialmente. O fato é que Rudolf Virchow não fez qualquer menção ao trabalho de Robert Remak, colega da Universidade de Berlim, que apesar de ter sido o responsável pela maior parte do trabalho que dava sustentação a essa afirmação, não havia recebido o merecido crédito. Dizem que, tomado de fúria, Remak escreveu a Virchow sobre o sumário em latim: “Ele aparece como seu sem nenhuma menção a meu nome. Que o senhor se torne ridículo aos olhos dos instruídos, uma vez que não possui nenhum conhecimento embriológico especializado evidente, é algo que nem eu nem ninguém podemos impedir. Entretanto, caso deseje evitar uma discussão pública da questão, eu lhe pediria para reconhecer imediatamente minha contribuição”; conforme transcrição literal dessa passagem, que pode ser encontrada no livro de Adam Rutherford, “Criação: a origem da vida” (Zahar, 2014, p. 27.).
Remak e também Virchow, apesar dos pesares pelo suposto plágio, estavam absolutamente certos: a vida é feita de células, e as células são geradas unicamente a partir de outras células. Mas, o episódio mencionado, que trata da compreensão da origem de novas células, faz com que alguns considerem Robert Remak uma espécie de herói esquecido da biologia, que ainda aguarda o merecido reconhecimento internacional pela sua contribuição seminal sobre o processo de divisão celular. Outros vêm nesse acontecido um típico caso de discriminação política e racial. Vejamos por que: Robert Remak era um judeu polonês, ainda que tenha vivido a maior parte da sua existência em Berlim. Para obter o cargo que almejava na Universidade de Berlim, teria que deixar de lado suas raízes judaicas ortodoxas e batizar-se cristão. Isso ele nunca fez. E pagou um preço elevado, pois, embora tenha conseguido assumir como assistente e conferencista na Universidade de Berlim, esses eram cargos que não lhe asseguravam laboratório próprio e nem salário. Quase ao mesmo tempo, Rudolf Virchow, nascido no seio de uma abastada família prussiana, ingressou na Universidade de Berlim, onde ambos tornaram-se “colegas”, gozando de todos os direitos e prerrogativas do posto. Virchow não foi um “obscuro plagiador de Remak”, como alguém apressadamente pode depreender desse episódio. Fez sucesso como médico, cientista, politico, escritor e estadista, tendo sido descrito como “o Papa da Medicina”, no século 19.
Remak e Virchow foram, cada qual a seu modo, pessoas que deixaram legados relevantes, especialmente na área médica. Rudolf Virchow, ainda que tenha insistido na negação da causa biológica das doenças, com mais notoriedade no caso da tuberculose e o bacilo de Koch, goza de reconhecimento pelo trabalho em epidemiologia e saúde publica. E Robert Remak é autor de contribuições memoráveis em embriologia e na área neurológica, tendo o seu nome associado com estruturas de neurônios, fibras nervosas não mielinizadas e células nervosas do coração.
O filho de Remak, Ernest Juliusz Remak (1849-1912), seguiria a profissão do pai e se tornou um neurologista de relativo prestígio. O seu neto, também chamado Robert Remak (1888-1942), foi um matemático que, lamentavelmente, morreu vitimado pelas atrocidades dos nazistas em Auschwitz.
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