No início da década de 90, um pequeno grupo de jovens passa a se reunir pelas praças de Passo Fundo, em busca de informações sobre uma nova doença que começava a chamar a atenção no mundo todo. Em poucos meses, a situação se agrava. O número de pessoas infectadas pelo HIV aumentava assustadoramente. Sem medicamentos e tratamentos adequados, a Aids fazia suas primeiras vítimas no município. Dos 78 integrantes do primeiro grupo, em três meses, a maioria já havia perdido a batalha para a doença.
Disseminada principalmente entre homossexuais e consumidores de drogas, o preconceito em relação aos chamados grupos de risco, como foram denominados, crescia na mesma proporção. Diante deste cenário nebuloso, surgia o Serviço de Solidariedade à Aids, o Sosa. Uma entidade criada pelos próprios portadores e voluntários. Passados 24 anos, a ONG que virou referência no Rio Grande do Sul, e seguiu atendendo filhos e netos daquela primeira geração, além de novos portadores, anunciou esta semana que está fechando as portas.
Por mais de duas décadas, a entidade lutou em busca de um espaço para instalação de sua sede. Nos últimos cinco anos, funcionou em quatro salas disponibilizadas pela Prefeitura Municipal, nas dependências do antigo quartel do Exército. No local, atendia semanalmente 209 pessoas, entre elas, 69 crianças. O trabalho era desenvolvido por uma equipe de 11 pessoas, incluindo psicólogas, assistente social, administradora e monitoras.
A difícil decisão de fechar as portas foi tomada durante assembleia geral realizada na semana passada, com a presença das famílias atendidas. Presidente da ONG desde a sua fundação, Marlene Brittes relatou que o Sosa havia recebido um comunicado para desocupar o prédio. Segundo ela, a secretaria de saúde do município chegou a oferecer outro espaço, mas a entidade não teria condições de manter os custos.
A ONG vinha enfrentando dificuldades financeiras desde 2014, quando encerrou o convênio de 10 anos, com entidade alemã Kinder Not Hilfe, da cidade de Duisburg, responsável pelo repasse de aproximadamente R$ 100 mil ao ano.
Desde então, passou a se manter através de um convênio com a prefeitura, no valor anual de R$ 55. “Esta parceria é assinada em janeiro e o dinheiro chega em agosto. O recurso não é suficiente para mantermos toda a estrutura. Mesmo recebendo uma sala, teríamos que arcar com várias despesas, como água, luz, entre outras. Se em 24 anos, não reconheceram a importância do nosso trabalho, isso não acontecerá agora” desabafa Marlene.
Com o fechamento da sede, o Sosa deixa de realizar um trabalho destinado para crianças e adolescentes focado no enfrentamento do preconceito, exclusão e situações de vulnerabilidade social. Parte delas perderam os pais para a Aids e estão sob os cuidados das avós. Cada família atendida na ONG recebia mensalmente uma cesta básica. “ O sentimento é de que faltou respeito com o nosso trabalho” diz Marlene. Para ela, uma das principais missões do Sosa ao longo de mais de duas décadas, foi mostrar ao portador a importância da adesão ao tratamento. “Para conseguir isto é preciso ganhar a confiança e o respeito do portador, olhar no olho dele, e fazer acreditar que é possível” comenta.