OPINIÃO

Uma breve história recente do trigo brasileiro

Por
· 2 min de leitura
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

Foram tempos difíceis para a triticultura brasileira aqueles da virada dos anos 1980 para os 90. Após a queda do muro de Berlim (novembro de 1989) sobreveio o fim da Guerra Fria e com ele a internacionalização da economia (globalização). Nesse rastro, a revogação da intervenção estatal no complexo agroindustrial do trigo no Brasil, com a Lei nº 8.092, de 21 de novembro de 1990, que substituiu o Decreto Lei nº 210, que desde 27 de fevereiro de 1967 conferia ao Banco do Brasil o papel de único comprador e único vendedor de trigo no País, o Tratado de Assunção (26 de março de 1991), que, em 1995, com a adoção da Tarifa Externa Comum (TEC), consolidaria a união aduaneira entre Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai, que chamamos de Mercosul, tiveram reflexo imediatos. Apesar de toda evolução em genética (cultivares) e em tecnologia de produção não estávamos preparados para competir com países que tinham vasta tradição no mercado mundial de trigo, especialmente em qualidade tecnológica para uso industrial. Sequer, na ocasião, havia no País uma norma de identidade e qualidade voltada à comercialização do trigo brasileiro.
Antevendo os novos tempos, por ocasião da XV Reunião Nacional de Pesquisa de Trigo (RENAPET), que aconteceu de 19 a 23 de setembro de 1988, em Passo Fundo, na sede da Embrapa Trigo, foi construída uma inciativa, capitaneada pelo economista Reino Pécala Rae, sob os auspícios dos grupos Santista e J. Macêdo, contando com representantes de instituições brasileiras de pesquisa de trigo e do CIMMYT, com o objetivo de avaliar a qualidade dos trigos nacionais em relação ao desempenho industrial de suas farinhas. Eis o embrião do esforço que resultaria na proposição de aperfeiçoamento da nossa, propriamente dita, primeira norma de identidade, qualidade, embalagem e apresentação do trigo destinado à comercialização interna no Brasil (a Portaria nº 304, de 19 de dezembro de 1990).
A iniciativa da RENAPET de 1988 envolveu a coleta de cerca de 600 amostras (entre 400 e 500 g) de trigos produzidos no Brasil, na safra de 1989, que foram enviadas ao laboratório do Moinho Fortaleza. O resultado principal dessa primeira avaliação industrial dos trigos brasileiros foi que havia diferença acentuada de qualidade tecnológica entre os nossos trigos. Todavia, não foi possível, nessa ocasião, a caracterização individual de cultivares, por insuficiência de amostras. Essa constatação justificou a criação do projeto “Mapeamento do Trigo Brasileiro”, também financiado pelos grupos J. Macêdo e Santista, quando foram coletadas, na safra 1990, ao redor de 1000 amostras, de cerca de 2 kg de trigo, e enviadas, desta feita, para análise nos laboratórios da Embrapa Agroindústria de Alimentos, no Rio de Janeiro, aos cuidados do pesquisador Rogério Germani, via contrato firmado em 20 de março de 1991.
Antes disso, visando à normatização de identidade, qualidade, embalagem e apresentação do trigo brasileiro, o Ministério da Agricultura e Reforma Agrária (MARA) emitiu a Portaria nº 304, de 19 de dezembro de 1990, que classificava todo o trigo brasileiro como “Tipo único”, desde que atendesse aos requisitos de 13% de umidade, o limite de 1,0% para impurezas, matérias estranhas, grãos germinados ou verdes e peso do hectolitro (PH) mínimo de 65.
Terminadas as análises de qualidade dos trigos brasileiros, safra 1990, nos dias 10,11 e 12 de dezembro de 1991, apoiada pelos grupos Santista e J. Macêdo, foi realizada uma reunião em Curitiba, com 22 representantes de instituições. Foi nesse encontro que saiu a malfada proposta de classificação preliminar dos trigos brasileiros como de baixa, média ou alta qualidade, que, inadvertidamente ou não, tendo vindo a público, suscitaria, no começo de 1992, discussões acaloradas, entre representantes da indústria moageira, pesquisadores e triticultores; especialmente após a publicação em jornais do artigo “A tragédia do trigo BR 23”, assinado pelo vice-presidente da Abitrigo. (continua...)

 

Gostou? Compartilhe