OPINIÃO

Entre lobos e cordeiros

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Criou-se a expectativa que com o fim da ditatura, eleições livres e diretas com uma nova constituição seria possível pagar a enorme dívida social com o povo brasileiro, isso foi propagado em comícios memoráveis na campanha pelas “Diretas Já”. Por lideranças políticas e intelectuais do mais alto gabarito, palanques compostos, por Tancredo Neves, Brizola, Lula, Ulisses Guimarães, Pedro Simom, Fernando Henrique Cardoso, Franco Montoro entre tantos outros que registraram seus nomes na história brasileira.
A reabertura democrática se deu por meio da eleição de Tancredo Neves para Presidente e de José Sarney para Vice Presidente, as esperanças dos brasileiros se renovavam na figura de Tancredo, que conseguiu costurar a reabertura democrática, sem derramar uma gota de sangue e sem grandes traumas para a sociedade brasileira. A vida pregou uma grande peça em Tancredo que não pode assumir a presidência da república, em razão de uma grave doença que levou a falecer. Em seu lugar assumiu seu Vice José Sarney.
José Sarney, egresso da ARENA partido que sustentou a ditadura, serviu ao governo dos militares a participou da costura da aliança com Tancredo. Ao assumir a presidência, propôs medidas populares, como a moratória da dívida brasileira, congelamento de preços o que possibilitou com que as famílias brasileiras pudessem comer carne, esse foi um dos grandes símbolos do milagre econômico. Durante seu mandato, foram restabelecidas as eleições diretas para presidente, prefeito e governador. Foi aprovado pelo Congresso o direito de voto dos analfabetos e foi promulgada a Constituição brasileira de 1988 por uma Assembleia Nacional Constituinte.
Sarney, não reformou e nem aperfeiçoou as instituições públicas brasileiras, muito pelo contrário, criou uma grande rede de apadrinhados nos segundos e terceiros escalões da república que o sustentam no poder mesmo sem mandato até o momento.
Nas eleições diretas de 1989, Lula atacou Sarney de maneira dura e consistente, afirmando que Sarney “foi incapaz” e que Sarney era “adversário político e ideológico”. Ofendido e espezinhado pelo PT, Sarney do PMDB aliado de FHC em seus dois mandatos, só se converteu ao lulismo quando um episódio policial inviabilizou de vez a manutenção da parceria com os tucanos. Em março de 2002, durante investigação sobre desvios de recursos da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), a Polícia Federal invadiu a sede da empresa Lunus, pertencente a Jorge Murad, marido de Roseana Sarney, então governadora do Maranhão. Foram apreendidos no local cerca de R$ 1,3 milhão em dinheiro. Roseana, que na época ensaiava se lançar candidata a presidente pelo PFL.
A guinada de Sarney, para os braços de Lula, viabilizou a sua eleição em 2002, e decretou um novo jeito de fazer política na curta história da democracia brasileira “esqueçam o que falei nas eleições passadas”. Tal afirmação encontrou amparo no escândalo dos atos secretos de 2009, onde um levantamento feito por técnicos do Senado detectou cerca de 300 decisões que não foram publicadas, muitas adotadas há mais de 10 anos. Elas geravam gastos desnecessários e a suspeita da existência de funcionários fantasmas. Sendo que uma grande parte deles foi usada para nomear pessoas ligadas ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) amigos e parentes de Sarney foram contratados pelo Senado.
Passados 20 anos das eleições de 1989, o então Presidente Lula saiu em defesa de Sarney, defendendo um tratamento diferenciado para o presidente do Senado: "Sarney tem história no Brasil suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum", argumentou, sem explicar o tipo de tratamento diferenciado a que se referia.
A redemocratização brasileira, consolidou um enorme poder para o PMDB e a figura de Sarney, nenhum partido ou presidente da republica desde 1989, se elegeu ou governou sem fazer acordos com o PMDB e com Sarney. Passaram-se por Collor, Itamar, FHC, Lula e Dilma e mais recentemente Michel Temer, que mesmo sendo presidente do PMDB e Vice Presidente da República, em sua interinidade como presidente da república, teve que negociar com o PMDB e com Sarney. A divulgação das conversas gravadas por Sérgio Machado com os caciques do PMDB, não são nada mais do que sempre falaram e do jeito que trataram a coisa pública. Em alguns momentos caciques do PMDB diziam “o que é bom para o PMDB é bom para o Brasil”.
O que cria esperanças no interino governo do PMDB, comando por Temer, é a sua equipe econômica. Entre lobos e cordeiros, parece que estamos vivendo um fim de ciclo político e de líderes políticos, a história parece querer cobrar a fatura de tantas alianças, acordos e conchavos impróprios para uma democracia que não permite mais diferenciar o lobo do cordeiro, parecem que todos os cordeiros transformaram-se em lobos. A crise existe e é real. Necessita ser enfrentada, pela via democrática, pois, melhor que a democracia, somente mais democracia.

Adriano José da Silva
Professor Coordenador da IMED Business School

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