Resistir é a palavra de ordem

Após 20 dias da primeira escola ocupada em Passo Fundo, alunos seguem mobilizados. Comando de ocupação foi criado para fortalecer e unificar o movimento

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Entre as reivindicações do Protásio Alves, está o repasse da merenda, a falta de professores e a manutenção da estrutura da escolaEntre as reivindicações do Protásio Alves, está o repasse da merenda, a falta de professores e a manutenção da estrutura da escola
Entre as reivindicações do Protásio Alves, está o repasse da merenda, a falta de professores e a manutenção da estrutura da escola
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Na parede, um cartaz determina as tarefas do dia: Josué, Emily e Nayara são responsáveis pelas refeições e limpeza da cozinha. No portão, o revezamento é de duas em duas horas para garantir que somente apoiadores entrem na escola. Inspirada no movimento que já ocorria em Porto Alegre e São Paulo, a Eulina Braga foi a primeira a ser ocupada em Passo Fundo, no dia 16 de maio. “Nós só queremos que o governo sente com nós e negocie, nos dê um cronograma”, explica Leonardo Menezes, que tem 16 anos e é o líder do movimento. Segundo ele, uma reunião foi feita com a 7ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), mas nenhuma resposta veio por parte do governo. “Está todo mundo perdido. A CRE não sabe mais o que fazer, o coordenador tem ido todas as semanas para Porto Alegre e o governo não tá nem aí”.
Para fortalecer o movimento, dois alunos representantes de cada escola ocupada em Passo Fundo formarão o comando de ocupação. O objetivo é unificar os estudantes e concretizar o protesto, que iniciou no dia 16 de maio e já conta com 11 instituições participantes no município. Em todo o Estado, segundo a página do Facebook Ocupa Tudo RS, são 158 escolas ocupadas. Repasse de verbas, merenda de qualidade, reformas, repúdio ao PL 44/16 e ao PL 190/15 e apoio a greve dos professores fazem parte da pauta de reivindicações de praticamente todas elas. “Até agora o movimento estava mais fraco. No momento em que a gente se reuniu e resolveu se unificar, ele se fortaleceu”, afirma Luísa Bublitz Folle, 17, líder do movimento na Escola Protásio Alves. O comando também unificará as atividades nas escolas, que já contaram com aulões de diversas disciplinas, debates e discussões sobre assuntos escolhidos pelos alunos, como feminismo e questão de gênero.

Até quando?
“Esperamos que dê em alguma coisa. A gente está aqui há mais de quinze dias e não é à toa. Eu acredito que o governo não vá deixar por isso mesmo. Nós paralisamos o Estado. Alguma resposta ele vai ter que nos dar”, desabafa Luísa. A ideia de todas as escolas é continuar com o movimento até receber uma resposta do governo. “Independentemente se tivermos que ficar um mês ou dois, terminar isso sem uma resposta não vale a pena”.
Entre as reivindicações do Colégio Fagundes dos Reis, além daquelas em comum entre todos, está a falta de intérpretes para deficientes auditivos e a não utilização de tecnologia atual dentro das salas de aula. Conforme Carol Binelo da Rosa, 15, a ocupação, que iniciou no dia 18 continua por tempo indeterminado. “Nós continuaremos ocupando porque estamos lutando por nossos direitos e não vamos desistir. Nossa ocupação não tem dia nem hora para acabar”. Guilherme Gil Saldanha, 16, cursa o 2º ano do Ensino médio no Instituto Arcoverde e compartilha da mesma opinião. “A CRE está muda, não ofereceu nenhuma negociação. Não sairemos da escola até termos uma resposta”.
De acordo com o coordenador da 7ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), Santos Olavo Misturini, a Procuradoria do Estado está fazendo contato com as escolas e uma equipe de mediação de conflito está realizando círculos de mediação de paz com os líderes do movimento. “Todas as reivindicações que são específicas dos estudantes, como reformas e melhorias nas escolas, foram encaminhadas. O que diz respeito aos professores, como aumento de salário, não tem negociação no momento”, afirma. Na semana passada, o Ministério Público realizou uma reunião para tratar das ocupações. Representantes das escolas, dos movimentos estudantis e dos setores da educação e Conselho Tutelar estiveram presentes. O objetivo é fazer uma mediação junto ao Estado e orientar os alunos.

Apoio
As ocupações contam com o apoio de algumas entidades, formadas por jovens, como a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e a Assembleia Nacional dos Estudantes – Livre (Anel). Para João Vítor Schaule Marcelino da Silva, 18, representante da ANEL em Passo Fundo, o movimento mostra como a força da juventude continua viva. “Essa geração tem disposição de sobra para lutar pelo que eles querem”. A entidade tem ajudado os alunos a se organizarem, bem como esclarecido dúvidas que surgem. Contudo, a Anel não se envolve na mediação com o governo. “Isto tem que ser feito com as próprias ocupações de conjunto e não com entidade A ou B, pois os protagonistas desta luta são os estudantes que estão ocupando as escolas”, afirma João.
A União da Juventude Socialista (UJS) também apoia as ocupações. “A UJS considera as ocupações como uma demonstração de coragem, comprometimento e responsabilidade social dos estudantes, que se mobilizam contra o sucateamento da educação”, afirma a presidente da entidade, Francieli Teixeira, 20. Segundo ela, a UJS defende as ocupações, mas enquanto entidade, não representa todos os estudantes, por conta disso, não trata da mediação com o governo. “Mas orientamos nossos militantes secundaristas a juntamente com os colegas entregar as reivindicações por escrito e prezar pelo diálogo com representantes do governo. Válido reforçar que cada ocupação tem reivindicações próprias, que dialogam com a realidade das escolas e que a pauta principal e que unifica o movimento, é que o poder executivo retire a proposição da PL 44/2016”.

Movimento apartidário?
Apesar de receber ajuda de alguns vereadores, os estudantes afirmam que o movimento é apartidário. No colégio Fagundes, por exemplo, em cada postagem na página do Facebbok (Ocupa Fagundes) uma tag lembra que não há partidos envolvidos. “Apesar de recebermos ajuda das entidades e tudo mais, não fazemos propaganda de nenhuma”, afirma Carol. Alguns partidos, que se identificam com o movimento, ajudam no envio de alimentos. “Eles ajudam porque querem, não estamos seguindo partido nenhum”, explica Luísa, do Protásio Alves. Para Leonardo, líder do movimento na Eulina, apesar de as ocupações não terem um partido, não há como deixar de discutir política dentro das escolas. “Política envolve tudo”. Por isso, a contrariedade à PL 190, Escola sem partido. “Para nós isso é uma lei de mordaça, isso é ditadura”, finaliza.

Greve dos professores
Diretor do 7º núcleo CPERS de Passo Fundo, o professor Orlando Marcelino, afirma que a adesão da categoria na região é de 60%. Nenhuma negociação está marcada com o governo. Segundo o CPERS, são 11 escolas ocupadas, duas escolas funcionando em período reduzido, quatro escolas com alguns turnos em greve e sete escolas funcionando normalmente, com alguns professores em greve. Orlando ressalta que a contagem da CRE e do sindicato não é a mesma, já que o CPERS considera o número de alunos e professores em greve e a CRE leva em consideração a escola, independentemente do tamanho. Para o coordenador de educação, Santos Olavo Misturini, nem 10% dos professores da região estão em greve, baseado no ponto que não é assinado.
Na quarta-feira, dia 08, um ato está marcado, junto com os estudantes. A iniciativa ocorrerá em Porto Alegre com concentração em frente à sede do CPERS. O Comando de Greve do CPERS orientou os 42 Núcleos do Sindicato a organizarem atividades como vigílias, caminhadas, panfletagens e apitaços envolvendo professores, funcionários de escolas e a comunidade escolar, “para alertar a sociedade quanto ao descaso do governo com os educadores e a educação pública”.

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