Alguém disse, certa vez, que a alma da gente se manifesta pelo olhar, que uma pessoa falsa não consegue fixar o olhar, que um olhar transforma nada em tudo e tudo em nada. Renato Teixeira (Romaria) descreve o caboclo que revela “como eu não sei rezar, só queria mostrar meu olhar”; Guilherme Arantes (em Cheia de Charme) “investi tudo naquele olhar”; Paulo Ricardo (RPM) apresenta um olhar tipo carta na manga “olhar 43”; O Rei (Olha) “olha dentro dos meus olhos, vê quanta tristeza de chorar por ti”; Adoniran (Tiro ao Álvaro) “de tanto levar frexadas do teu olhar”. Meu pai me “frexou” um olhar de despedida (ele sabia, eu não) tão carregado que até hoje dói-me no peito. Estou pensando num olhar para o derradeiro momento, que espero demore acontecer, pelo menos até o meu Grêmio ganhar alguma coisa, para que meus filhos não percebam que estarei cagado do desconhecido aliado à possibilidade do reencontro com os que me deixaram. O olhar, o simples olhar, o significado dele é a razão que permaneço lendo lentamente o livro A Noite do Meu Bem. Refere-se aos anos 1940-1950 e aos grandes cantores de rádio. Ao ler estou vivendo as mesmas histórias que minha mãe viveu porque necessito compreender o meio-olhar de minha mãe, olhar melancólico tipo cachorro que caiu da mudança, tipo olhar de quem foi abandonado. Deve haver ao menos uma explicação e eu a quero possuir porque o olhar da velha me acompanha permanentemente A meia-idade tem dessas coisas, tentar compreender os significados.
Um professor da odontologia disse-me não entender como os alunos estudam tão pouco ou não demonstram interesse semelhante ao que tínhamos há trinta anos. A gente passava o dia estudando, pesquisando, com os pesados livros para lá e para cá. Madrugada, café, memoriol, repetição e repetição, ler em voz alta, resumos intermináveis. Hoje não, a turma parece estudar pouco e é possível que sejam mais inteligentes que nós. Minha mãe dizia as suas amigas que eu era estudioso e meu peito estufava; Mas, ser estudioso não é o mesmo que ser inteligente. O inteligente lê e compreende em uma hora o que o estudioso pode levar duas ou mais horas para captar. Minha mãe poderia estar querendo dizer, elegantemente, que eu era mais para estudioso do que para inteligente. Sempre que te chamarem de estudioso fique ligado, a palavra burro pode estar subentendida. O fato é que para encantar os alunos de hoje é preciso saber o que, porque e para que ensinar ao invés de como ensinar. A turma não aceita mais decorar a fórmula de Báskara, eles querem saber porque deveriam decorar essa coisa estranha aí. Eles também querem compreender os significados. Se forem estudiosos prestarão atenção em ti, se forem inteligentes consultarão o celular ou i-pad com um simples olhar.
