A figura da ursa faz parte do nosso imaginário. Pela maneira como trata os filhotes e também por desaparecer nas cavernas no inverno e reaparecer na primavera, a famosa hibernação, tornou-se símbolo de cuidado, mas também de resistência e transformação.
Várias culturas veneravam os ursos como divindades. Os celtas, por exemplo, veneravam a deusa-ursa Artio cultuada por sua proteção maternal. Já na mitologia grega, Artemis aparece como ursa ou acompanhada de uma ursa que, assim como o cervo, é seu animal de identificação.
Na animação Valente, da Pixar, inspirada em uma lenda escocesa,uma mulher é transformada em ursa. A Princesa Merida, heroína da história, pede a uma feiticeira que a ajude a fazer sua mãe mudar de ideia quanto a seu casamento. Merida não quer casar. Pelo menos não por enquanto. E também não acha importante aprender as tarefas “femininas”, dignas de uma princesa, que sua mãe valoriza e tenta lhe ensinar. A mãe, por sua vez, frustra-se muito com a falta de interesse da filha e, em sua determinação de dar à moça uma educação adequada com sua posição social, não leva em conta os desejos de Merida, a menina que a adorava na infância, mas que a desafia constantemente na adolescência. O estranhamento entre as duas abre espaço para mágoa, rancor e obstinação, dos dois lados, de fazer sua palavra valer. Típico conflito entre mãe e filha que se amam.
A feiticeira dá a Merida um doce mágico que transforma Elinor, a mãe, em ursa. Ela sabe que para mãe e filha se entenderem é necessário que uma consiga se colocar no lugar da outra. Merida precisa aprender a cuidar dos outros para entender a carga de responsabilidade que pesa sobre sua mãe, e Elinor precisa reencontrar a jovem impetuosa dentro de si mesma para entender o que significa para a filha abrir mão de sua liberdade para embarcar em um casamento arranjado.
Muitas vezes, lisonjeadas com a identificação que nossas filhas têm conosco na infância, ficamos tentadas e sucumbimos ao desejo de criar miniaturas de nós mesmas. As vestimos, penteamos e decoramos seus quartos de acordo com nosso gosto, damos a elas os brinquedos que gostaríamos de ter possuído, fazemos festas de aniversários que gostaríamos que tivessem sido as nossas, as matriculamos em atividades que gostaríamos de ter feito.
Oriundas de vários tipos de mães, repassamos a nossas meninas as coroas que nos foram entregues: rainha do lar, do trabalho, da beleza, da popularidade. Fingimos não ver, lá no fundo de nossa memória, a jovem adolescente que fomos, com nossos questionamentos e dúvidas e também com nosso medo do futuro.
Para que não sufoquemos nossas filhas com as mesmas amarras, cobranças e ilusões que nos tiram o fôlego, nós, mulheres, precisamos fazer um caminho diferente. Precisamos encontrar nossa mãe. Não a mãe que mora na outra quadra, em outra cidade, ou até já se foi, mas a mãe-origem que mora em alguma caverna dentro de nós. Como os ursos, precisamos de um tempo dentro das rochas, quando está frio, cuidando de nós mesmas com tranquilidade.
É no abrigo materno de nosso próprio interior, protegidas dos bombardeios sociais diários, que vamos nos abastecer de carinho e de cuidado. É ao conhecermos e identificarmos nossos próprios anseios, desejos e sonhos que vamos libertar nossas filhas para viverem suas próprias vidas e assumirem suas próprias responsabilidades: nossas jovens ursas, amadas, começando a aquecer suas próprias cavernas.
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