No começo dos anos sessenta era costumeiro faltar luz em Cruz Alta, é o que o breu da noite, que observo sentado à cama do quarto de meu filho Ramon, faz-me lembrar. Minha mãe acendia uma vela sobre um pires colocado sobre a mesa de madeira que preenchia quase toda a cozinha de nossa casa lá na Marechal Floriano 454. Então, contava causos de fantasmas e lobisomem para o estremecimento de eu e meus irmãos. Dona Neca providenciava, então, que dormíssemos, os seis, na mesma cama de casal, abraçados. Antes de dormir tinha uma oração de pedido de proteção para o Papai do Céu e para os anjos da guarda. A gente ainda ouvia os latidos e ou uivos da cachorrada e Dona Neca alertava com o dedo para cima: Oh! O trem apitava às vinte e três em ponto...hora de dormir.
Meus pais eram PTB (janguistas) porque suicídio de Vargas ainda impactava enormemente, afinal ele era gaúcho, valente, injustiçado e brioso, como a gente e lutava pelos pobres. Jango era seu sucessor político, meus pais adoravam Jango. Nada como um cadáver para atrair simpatias. Na entrada política de Getúlio na vida nacional foram servidas três fatias para a convulsão nacional: os mineiros entraram com a grana, os gaúchos entraram com o líder e os paraibanos entraram com o cadáver (João Pessoa). Getúlio e Jango eram populistas e a gente era o povo a ouvi-los.
Não lembro nenhuma eleição que tenha escancarado tamanha preferência de votos como a de Luciano Azevedo. Os ambientes em que circulo mostravam, aparentemente que Luciano venceria. Mas, o pensamento dos médicos quase nunca representa o que o povo pensa, dizem por aí. E não é que deu na tampa? Algo de profundas mudanças está a acontecer em Pindorama. Ele fez, foi Luciano que fez. Como se poderia argumentar o contrário?
Veio-me uma lembrança do ano de 1986 em que, por três meses, trabalhei em Severiano de Almeida. Estava entristecido lá, havia terminado um noivado e tudo o que queria era estar em Passo Fundo. Numa de minhas vindas parei no posto de combustível de Coxilha e percebi o Del Rey de Jaime Debastiani estacionado. Jaime foi meu colega de faculdade e trabalhamos juntos algumas vezes. Neste domingo comecei a percorrer a lista dos vereadores eleitos e imaginei que ali estaria Jaime, mais uma vez, na cabeça. Ele era homem de mais de quatro mil votos. Se ele estivesse por aqui teria vencido. Na noite da vitória, onde andaria Jaime? Fácil: pronto-socorro do Hospital César Santos porque ele nunca foi homem de férias, feriados e comemorações. Trabalhava incessantemente pelo seu povo, pelos humildes e sempre sobreviveu ao escárnio de políticos e colegas que não enxergavam suas virtudes. Trabalhar para o povo não é tarefa para muitos. O oportunista sai a abraçar e beijar o povo em períodos eleitorais. O autêntico faz isso permanentemente. Saudades de Jaime.