OPINIÃO

Gente fina

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Quinta, quase 20 horas e estou olhando para a modesta estante de livros variados a pensar em quem me acompanhará no plantão 493 no São Vicente, desde 2008. Glauco Carneiro? (sobreJoão Batista Lusardo), Richard Dawkins? (A magia da Realidade), livros de Pondé-Cortella-Clóvis de Barros Filho?Betty Milan?(Paris Não Acaba Nunca), protocolos de atendimento de Trauma? Estou com os livros sobre Lusardo, Jango, JK e Getúlio em leitura parcelada e me sinto em débito com os diversos autores que vieram morar em meu apartamento. Ao ler os periódicos do dia-a-dia percebo que aprecio todos os estilos dos jornalistas: esportes, política, ficção, história. Há, no entanto, necessidade imperiosa de separar subjetividades de informações fidedignas quando o tema é futebol e política, separar comentários ideológicos daquilo que se apresenta. Vivemos uma mixórdia política e econômica no país mas, percebe-se um novo tempo em que a sociedade abandona o velho e se abraça no novo. Se for assim, se o novo é o espelho dos nossos filhos, por exemplo, estamos bem servidos porque eles querem justiça, humanidade e um tecido social asséptico. Vamos lá, gurizada, fazer o que os velhotes deixaram passar batido.
Da estante, então, puxei Ruy Castro e o livro sobre Hermínio Bello de Carvalho (Taberna da Glória e Outras Glórias). Hermínio foi de tudo para seus ídolos – produziu seus discos, montou seus shows, compôs-lhes músicas, cantou com eles, foi grande amigo e ajudou-os de todas as maneiras. Taberna da Glória é onde Noel Rosa e Araci de Almeida passaram a tomar chope diuturnamente na década de 30. O livro apresenta Hermínio aglutinador e escritor. Ao lê-lo entenderemos um pouco mais de Nara Leão, Araci de Almeida, Paulo Tapajós, Jacob do Bandolim, Donga, Dona Zica e Cartola, Nelson Cavaquinho, Nelson Sargento, Elisete Cardoso, Pixinguinha, Nana Caymi, Chico e Martinho, entre tantos. Principalmente compreender a universalidade de Pixinguinha e do gênio gaúcho Radamés Gnatalli. Esse foi o universo íntimo de Hermínio e ninguém consegue se aprofundar na MPB e chorinho sem conhecê-lo. Ouça Pixinguinha, não somente por Carinhoso (1916-17) mas, também por Ingênuo (1947). Araci cantava maravilhosamente Noel Rosa e era, embora raquítica e cheia de joanetes, a maior estrela da música brasileira desde os anos 30. Sua trajetória musical e pessoal daria um delicioso filme, suas tiradas espontâneas são o máximo. Ela é muito mais do que aquela jurada mal-humorada do Programa Sílvio Santos. Hermínio anotou que perguntado a Araci se fosse Jesus quais seriam os apóstolos da MPB que convidaria para sentar-se à mesa ela respondeu: Denner (costureiro), Caetano, Noel, Wilson Baptista, Carlos Imperial e o maestro José Fernandes. Como diz Ruy Castro – leia o livro e morra você de inveja.
Tenho o cuidado de oferecer aos meus esparsos leitores uma leve distração ou pensamento de energia para as lutas do cotidiano. E, nesse sentido, senti-me engrandecido uma vez mais ao bater papo descontraído com o grande Renato Miranda nesta última quarta, antes do jogo do imortal tricolor. Conversamos sobre os anos 60 e sua vida em Paris. Falamos de Roger Vadim-Brigite Bardot, Godard-Truffaut, Ives Montand-Delon, Jean Louis Trintignant-MirelleMathieu. Faltou tempo para o franco-belga Salvatore Adamo e Jean-Paul Belmondo-Caterine Deneuve. Trocamos algumas palavras sobre Sartre.Saudamos Paris. A vida é isso, também, troca de experiências. O mais bacana é que pude me desculpar pessoalmente ao salientar que pela senilidade troquei seu nome pelo do seu irmão Fernando na crônica de há duas semanas em que exaltei a importância sociocultural de Boka e Edu. Gente fina, fui oficialmente perdoado.

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