Ao observar-se a narrativa dos evangelhos, podemos chegar à conclusão de que nenhum tratado sobre as relações humanas tem alcance tão profundo. Dos sábios, ou aculturados histriônicos ou donos efêmeros do saber da moda, sempre a mais tocante e profunda lição está na Bíblia. Mesmo que não pareça, num primeiro momento, a mais lógica. No evangelho de Lucas (7, 36-50), o jornalista de época escandiu uma das feridas sociais do bullying contra as mulheres, ao mesmo tempo em que inscreve uma das mais comoventes páginas da humanidade a respeito da grandeza, que se diz perdão. Um fariseu convidara Jesus para a refeição em sua casa. Foi a história emocionante de Maria Madalena que entrou porta adentro e ungiu os pés do mestre Jesus com perfume, lavando com suas lágrimas e enxugando com seus cabelos. Homenagem ao estilo cordial da época. Vendo a cena, o anfitrião fariseu cogitou para si: “Se este homem fosse o Profeta, saberia que é e de que classe é a mulher que o toca, pois é uma pecadora”. O fariseu não contava com o fato de Jesus ler seu pensamento. Comentou, Jesus, sobre a gratidão sempre maior quanto mais se perdoa. Cristo não enaltece o erro, mas o valor do ato de perdoar a quem demonstrara gentileza e arrependimento beijando seus pés. E, ao final perdoou seus pecados, para espanto de todos os que ouviram. “Quis est hic qui etiam peccata dimittit?” (quem é esse que até os pecados perdoa?). Pare-nos que o Natal e o advento trazem a noção do perdão mútuo nesta perigosa travessia do mundo que cultiva ódios pelo ar e pelo mar.
A corrupção dantesca
O olhar do brasileiro parece nem acreditar no que acontece. São muitas e pesadas acusações de corrupção, urdidas nos gabinetes pagos pelo povo para defender o povo. É alta traição. E mais, agora, em Brasília, os chefões do poder se voltam contra a Polícia Federal e Ministério Público. Renan e o próprio presidente Temer avisam que é preciso mais cautela. O presidente do Senado elege a lei de Abuso de Autoridade, como maior urgência do país. Convenhamos, é indisfarçável safadeza. Está bem que, num segundo momento sejam examinados limites de algumas cenas de holofotes que poderiam ser evitadas pelo MP, já que nada resolvem. Daí a inverter os papéis e visualizar as instituições (Judiciário e Ministério Público) como culpadas pela roubalheira, isso é demais. Seria a vitória do horror. Sem fazer apologia da desgraça, a obliteração da relação democrática quer tornar o episódio mais agudo de nossa história recente em cena dantesca da política.
Ainda o teto
E vem aí um assunto que não deveria polemizar o Parlamento, mas toca nos mega-salários. O teto salarial, se for mesmo fixado em R$ 34 mil, vai gerar a revolta dos marajás. O assunto não pode ser adiado, quando os menores salários e aposentadorias sofrem o aperto. Se Temer mexer com os graúdos melhora o prestígio.
Vazamento
Desde que nasceu a imprensa no Brasil, os delitos que apontem gente humilde são publicados amplamente antes de qualquer julgamento. Os erros de investigação desaparecem na poeira do tempo, e as penas, devidas ou não, voam levadas pelo vento. Até hoje nunca se viu projeto de lei para regular eventuais excessos acusatórios. Isso porque as denúncias de crimes comuns afligem a maioria pobre. Agora, quando se fala em nomes de quadrilheiros no poder, os deputados e senadores, em causa própria, querem imediata revisão. Inventaram a nova nomenclatura do vazamento para a imprensa. Querem responsabilizar e punir quem divulga. É claro que esses descuidos (excessos) ocorrem, adrede ou não. Mas não é o principal que justifique a decretação inviolável do segredo de justiça para a Operação Lava Jato. Querem manchete policial só para os famigerados ladrões de galinha!