Hospitais filantrópicos com dificuldade para equilibrar contas

Atraso constante no repasse de recursos por parte do governo do Estado tem piorado situação de instituições da região

Por
· 4 min de leitura
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

Os atrasos nos repasses de recursos do SUS pelo governo do RS vêm agravando a crise financeira nos hospitais filantrópicos do Estado. Alguns pagamentos estão atrasados desde março de 2016, de acordo com instituições de Saúde. Segundo levantamento realizado pela Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos do Rio Grande do Sul, a dívida do governo do Estado com as instituições é de R$ 108 milhões, relativos a programas que não foram pagos nos meses de março, abril e maio do ano passado. Até o momento, a estimativa da Federação dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, (FEESSERS), é que a dívida chegue aos R$ 144 milhões, de acordo com o presidente da entidade, Milton Francisco Kempfer.

A falta de recursos coloca, em muitos casos, em colapso o orçamento dos hospitais. O resultado é o atraso no pagamento do salário e dos direitos trabalhistas aos funcionários das instituições. Dados da pesquisa da Federação das Santas Casas do RS indicam que 23% das instituições ainda não conseguiu cumprir com o pagamento da primeira parcela do 13º salário, e o mais preocupante, 57% não têm como cumprir com a segunda parcela e nem mesmo têm previsão para tais pagamentos. De acordo com Milton Kempfer, aproximadamente 65 mil famílias dependem do pagamento do salário e hoje “vivem uma situação bem dramática”.

De janeiro a novembro de 2016, 12,20% reduziram leitos, 41,46% enxugaram o quadro funcional (4 mil demissões foram efetuadas), 20,73% reduziram internações e 19,51% atendimentos ambulatoriais. Relativo ao pagamento de salários, de janeiro a novembro do ano passado, 30,49% atrasaram salários e 54,88% atrasaram honorários médicos. Conforme Kempfer, já há pelo menos quatro hospitais paralisados e outros três com indício de greve. Dois deles, são da região: o Hospital de Caridade de Palmeira das Missões e o Hospital São Paulo de Lagoa Vermelha.

Na região
No Hospital São Paulo, em Lagoa vermelha, que tem uma média de 100 atendimentos na urgência e emergência e aproximadamente 170 internações por mês, a dívida é de R$ 350 mil. O diretor do hospital, Valdir Gelain, lamenta que a situação financeira é crítica. De acordo com ele, o principal prejuízo do hospital é em relação a defasagem da tabela do SUS em relação aos serviços prestados pela instituição. Cerca de 90% dos atendimentos são realizados pelos Sistema Único de Saúde no hospital.

Os funcionários do Hospital São Paulo paralisaram as atividades na última dezena do mês passado em razão do atraso dos salários. Após a greve, 75% do salário referente a novembro foi pago. Além do atraso, também falta quitar 50% do 13º salário. Quanto aos salários, o diretor lamenta que está não é situação que gostariam de estar no momento. “Uma situação pela qual quase a totalidade dos hospitais passa”, pontua.

Em Palmeira das Missões, no Hospital de Caridade, a situação foi semelhante. Foram registrados atrasos no pagamento do salário, conforme a presidente do SindiSaúde de Passo Fundo, Terezinha Perissinotto. Os funcionários também paralisaram na terceira dezena do mês de dezembro do ano passado. Terezinha afirmou que a instituição pagou o mês de novembro, mas ainda falta uma porcentagem do 13º salário. A reportagem de ON entrou em contato com o hospital, mas não obteve resposta quanto ao montante da dívida do Estado com a instituição.

Em Soledade, no Hospital de Caridade Frei Clemente, são 2 milhões de atraso, de acordo com um dos administradores da instituição, Adairto Forti. Por enquanto, o salário dos funcionários está em dia até novembro, com o pagamento total do 13º salário. Já o salário dos médicos foi efetuado o pagamento até o mês de outubro. Não há previsão de quando será pago o salário dos meses de novembro, para o caso dos médicos, e dezembro. Na instituição, ao total, são realizados em média 15 mil procedimentos por mês. Destes procedimentos, cerca de 73% são pelo SUS.

Em Passo Fundo
No Hospital São Vicente de Paulo (HSVP) há registro de atraso de alguns recursos desde o primeiro trimestre do ano passado. Até o momento, o hospital vem se organizando financeiramente e até o momento está com o pagamento em dia e não precisou reduzir o quadro de colaboradores. No Hospital da Cidade (HC), os incentivos atrasados são referentes a março, abril, maio, outubro e novembro. No HC, os salários e direitos trabalhistas também está em dia. Mais de 70% dos atendimentos de ambas instituições são através do SUS. Terezinha afirma que como os hospitais de Passo Fundo são maiores, possuem um capital de giro e conseguem sobreviver, mas que não se sabe até quando.

Situação antiga
De acordo com a Federação das Santas Casas do RS, as dívidas dessas instituições são históricas, resultado de uma não atualização de valores da Tabela de Procedimentos do SUS, falta de políticas de remuneração justa por parte do Governo Federal e também pela falta de um calendário linear de pagamentos oriundos do Governo do Estado.

A situação é antiga. Em outubro de 2015 já havia atrasos. Os hospitais conseguiram equilibrar as contas através de um empréstimo feito por eles no Banrisul, conforme Kempfer. Em março recomeçou o problema, uma vez que o dinheiro do empréstimo foi gasto no pagamento das dívidas vencidas e os hospitais ficaram na mesma situação. O presidente da FEESSERS acrescenta que a crise dos hospitais filantrópicos só fica mais intensa ao passo que as prefeituras - que ajudam as instituições com recursos - também têm seus pagamentos atrasados. São mais de 200 hospitais filantrópicos no Estado.

“Como o governo tem deixado de repassar ou repassado atrasado tanto recursos para hospitais quanto para as prefeituras, as prefeituras não conseguem ajudar a sustentar os hospitais. Crise dos hospitais está muito grande. A situação é calamitosa. Senão se achar uma maneira de financiar corretamente os hospitais e as prefeituras, nos programas do governo, vai ter sempre essa questão. Nós vamos viver de crise e os trabalhadores sempre pagando com sua dignidade, com seu esforço pessoal, com privação de bens pessoais e da família para que o SUS funcione”, explica Kempfer.

Gostou? Compartilhe