Os desafios da escola pública

Medidas anunciadas pelo governo do Estado resultam em redução de turmas, escolas trabalhando em turno único e possibilidade de fechamento de educandários em Passo Fundo e região

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A diminuição do número de crianças e jovens em idade escolar motivou o governo estadual, por meio da Secretaria de Educação, a adotar uma série de medidas de reorganização. Apesar de algumas delas serem administrativamente necessárias, elas causam inquietação. O fechamento de turmas e salas de aula com alunos de diferentes anos dividindo o mesmo espaço são algumas dessas situações. Além disso, as perspectivas de aposentadoria de professores da rede estadual causam incerteza sobre a falta de professores no início de mais um ano letivo. Entre as consequências destas condições enfrentadas pela rede estadual muitos pais estão dando preferência por matricularem os filhos na rede municipal que se fortaleceu nos últimos anos, especialmente em Passo Fundo.
De acordo com os dados divulgados pelo governo do Estado, a população educacional no Rio Grande do Sul registra queda nos últimos 12 anos. De acordo com dados do Censo Escolar, em 2004 eram 2,7 milhões de alunos. Em 2015, o Censo registrou 2,3 milhões de estudantes em todas as redes (federal, estadual, municipal e privada).
Conforme o coordenador da 7ª Coordenadoria Regional de Educação (7ªCRE), Santos Olavo Misturini, nos municípios da região esse processo já existia e, atualmente, tem 108 salas com classes multisseriadas. A única diferença com as novas medidas é que nove escolas passarão a funcionar em turno único. No entanto, ele ressalta que essa mudança não representará nenhum prejuízo tendo em vista que todas as atividades que eram desenvolvidas em dois turnos, terão continuidade em um turno só. “Da mesma forma não ocorreu fechamento de salas de aula, a única diferença é que como existe uma parceria entre governo do Estado e prefeituras, em algumas escolas que têm poucos alunos nos anos iniciais estamos fazendo parceria e a rede municipal recebe esses alunos”, explica.
Essa mudança dos estudantes da rede estadual para a municipal acaba deixando salas de aula ociosas na rede estadual. Misturini destaca, no entanto, que isso não é visto como um problema, levando em consideração que as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional preveem um processo, iniciado ainda na década de 1990, de que os municípios sejam responsáveis pelo ensino fundamental e o estado pelo ensino médio. “Esse processo está antecipando o que deverá acontecer em 2024, ou seja, todas as escolas que têm ensino médio terão ensino médio em tempo integral, iniciamos o processo de passagem, onde é possível, dos anos iniciais para a rede municipal, sempre de acordo com prefeituras e famílias”, esclarece o coordenador.


Aposentadoria dos professores
Para o coordenador da 7ªCRE, duas situações preocupam às vésperas do início do ano letivo. A primeira delas se deve aos pedidos de aposentadoria dos professores. “Temos muitos professores encaminhando aposentadoria e se todos fizessem agora teríamos previsão de demanda, mas muitos colegas fazem o encaminhamento no último dia para aproveitarem as férias, provavelmente teremos problemas em função disso”, reforça. A segunda preocupação está relacionada aos pais que esqueceram ou não buscaram fazer as inscrições e matrículas dos filhos na rede estadual no período estabelecido. Conforme Misturini, apenas em Passo Fundo, pelo menos 160 alunos estão nessa situação. “Eles não fizeram a sua inscrição para sair da rede municipal e ir para a estadual, principalmente alunos que vão ingressar no ensino médio”, pontua.
Nos últimos cinco anos a 7ªCRE tem registrado uma diminuição anual que varia entre mil a 1,5 mil no número de alunos que buscam a rede estadual. Um dos fatores que contribuem para isso é o aperfeiçoamento das redes municipais e o consequente aumento da preferência dos pais por matricular os filhos nestas escolas. Além disso, a evasão escolar, especialmente no ensino médio também é um problema a ser enfrentado. O mesmo acontece com a Educação de Jovens e Adultos (EJA).


Escolas municipais
O secretário de Educação de Passo Fundo, Edemilson Brandão, explica que essa migração de estudantes da rede estadual para a municipal tem sido observada especialmente nos dois últimos anos. Da mesma forma, há uma migração de estudantes de escolas particulares para a rede municipal. “Isso decorre de duas situações. Primeiro uma situação que é cíclica, que ora o Estado está melhor que o município e ora o município está melhor. Isso depende muito de políticas públicas que são implementadas. Hoje, Passo Fundo tem uma série de elementos que fazem com que as pessoas optem pelo município ao invés da rede estadual”, introduz o secretário.

A estrutura física e de pessoal das escolas municipais são exemplos de fatores que fazem aumentar o interesse dos pais por matricularem os filhos na rede municipal. Isso inclui as condições de trabalho dos professores em termos de salário, formação continuada, o ambiente de trabalho, o equipamento das escolas, os recursos didáticos e pedagógicos disponibilizados. Além disso, programas municipais como o do uniforme escolar que representa economia para as famílias contribui para isso. Da mesma forma, a merenda escolar e o transporte escolar gratuito são fatores importantes.

Brandão esclarece que embora haja um grande contingente de pais com interesse em matricular filhos nas escolas municipais, há limites legais que precisam ser respeitados, como o número de crianças por sala de aula e também de contratação de profissionais. “O que é feito, de modo geral, é uma redistribuição. Temos, no caso de Passo Fundo, uma rede estadual que atende muito bem os alunos de modo geral. Temos alunos que não deixam a escola estadual de jeito nenhum. Embora o Estado às vezes tenha dificuldade de repassar recursos, o gestor público das escolas consegue dar qualidade”, pondera.

A rede municipal de Passo Fundo tem registrado crescimento anual, mas ainda dentro do limite suportado e sem haver esvaziamento em escolas estaduais. Além disso, segundo Brandão, o que ocorre com frequência são migrações internas entre os bairros em função de programas habitacionais ou oportunidades de emprego que se criam em determinadas regiões. Isso também contribui para o movimento migratório dos alunos entre as redes estadual e municipal. “Em Passo Fundo temos aumentado a qualidade da educação municipal e é lógico que as famílias querem os filhos numa escola de melhor qualidade. Temos escolas públicas com Ideb acima até de escolas particulares”, complementa.

Má distribuição
Para o diretor-geral do 7ºNúcleo do CPERS Sindicato de Passo Fundo, professor Orlando Marcelino da Silva, o que vêm acontecendo nos últimos anos têm representado o fechamento de turmas, muitas vezes em lugares que têm demanda, mas não têm escolas com capacidade de atender a essa população. Isso resulta, em vários casos na necessidade de deslocamento das crianças para poderem estudar.

O CPERS está realizando um levantamento com as escolas para verificar a real situação da rede estadual. Silva destaca que a Escola Aberta de Passo Fundo é uma das que corre o risco de fechar em função dessa reestruturação e da alegação de que não existe clientela. Da mesma forma, ele acrescenta que na Escola Wolmar Salton não haveria a necessidade de enturmação tendo em vista a população que poderia ser atendida pela escola. Ele pontua que também foram fechadas turmas de EJA em escolas e o fechamento de oficinas do ensino fundamental, no caso da Escola João de Césaro.

Na região, ele destaca que vários municípios como Vila Lângaro, David Canabarro, Água Santa e Ernestina estão com problemas em relação à formação de turmas, fechamento de turmas e multisseriação. “Há possibilidade, a médio prazo, de fechamento de escolas”, alerta. Para o professor, o objetivo do governo estadual é o de reduzir número de professores e reduzir despesas, jogando a responsabilidade para os municípios. “Em Passo Fundo tínhamos em 2006 mais de 1200 professores em sala de aula, hoje não chegamos a 900, em sala de aula. Há uma redução drástica”, argumenta. Ele destaca que a há a necessidade de abrir mais turmas em algumas regiões da cidade, como na Santa Marta, na Petrópolis e Integração, principalmente no ensino médio. “Achamos fundamental que se abrissem escolas com tempo integral, que é uma necessidade principalmente por parte dos pais que não tem com quem deixar as crianças”, opina.

Escola Aberta
Conforme o coordenador da 7ªCRE a metodologia que a Escola Aberta de Passo Fundo utiliza é a única do Estado que permanece em atividade dentre aquelas criadas na década de 1990. “Essa tipologia de escola, hoje, pelo avanço e organização da sociedade, não tem sentido de se manter”, salienta Misturini. Segundo ele, hoje a Prefeitura tem toda uma rede de assistência social para atender às crianças e às famílias e que elas podem ser inseridas na rede regular de ensino. “Estaremos modificando a metodologia da Escola Aberta. Os alunos continuarão estudando lá e serão preparados para voltarem a se integrar na rede regular municipal ou estadual”, esclarece ressaltando que essa mudança deve ocorrer até o final do ano. A Escola Aberta funciona em parceria entre o governo do Estado e o município. A Prefeitura cede o espaço alugado para que ela possa funcionar e a administração é feita pelo Estado.

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