OPINIÃO

Abecedário

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Está com Marco Damian o dicionário de Cruz Alta, editado por Rossano Cavalari,  por uma tentativa de organizarmos nosso histórico. Rossano tabulou quase tudo daquela cidade por ordem alfabética, onde narra pessoas, acontecimentos, gírias e locais que fizeram e fazem parte das memórias. Como todo grande escritor, deixou a obra incompleta e remetemos algumas sugestões ao amigo. Daí, que temos que deixar no papel e não somente na falha transmissão oral a epopeia de nossas vidas e de nossos pais. No último domingo enfrentei 41 quarteirões a pé para assistir ao glorioso EC Passo Fundo e enquanto caminhava pelo centro e pela Presidente Vargas ia lembrando os idos tempos iniciais da década de 1970 que, em companhia de meu pai, apreciava nossos valorosos jogadores, do naipe de Santarém, Mariotti, Raul, Roberto, Bebeto. Ontem encontrei Luís Freire e me bateu um saudade por estarmos perdendo o vínculo com o futebol de campo tal qual perdemos com o futsal. O Vermelhão é neutro, a torcida fica muito longe do gramado, não há pressão, não temos o 12º jogador e nem tem mais jogadores identificados com nossa cidade. Dessas centenas de jogos, mal lembro os resultados porque a gente vai lá para encontrar os amigos e tomar cerveja. Mas, precisamos registrar as passagens assim como o fazem Damian, Ivaldino, Monteiro, Ney, Osvandré e outras excelências da Academia.

Organizei minha “biblioteca” por temas e agora ordenarei meus CDs, discos de vinil e filmes. Estava uma bagunça e como tenho memória fotográfica preciso me socorrer da organização. Lembrei de Caetano e Odair José. Odair vendia muito e a gravadora, através do lucro das vendas da chamada música brega, podia bancar os bacanas (Caetano e Gil). Em reconhecimento Caetano chamou Odair ao palco para cantar alguns de seus sucessos, entre eles a proibida Pare de Tomar a Pílula, música que ia de encontro a campanha do controle da natalidade que o governo propagava. A plateia de Caetano vaiou e este valentemente repreendeu a todos exclamando: “nada mais Z do que um público A”.  A música brega, como você sabe, teria ganho esta denominação em razão de uma casa de shows em Salvador que ficava na Rua Padre Manoel da Nóbrega, casa que tocava muitos boleros ou músicas de corno, como queiram. A maresia foi comendo as letras da placa da rua e de todo o nome restou...brega.

De Aa Z tenho meu abecedário da família. De maneira altamente folclórica discorrerei sobre uma prima que se apaixonou por um homem casado usando a letra A, de amor. Começa que ela se sentiu Atraída pelo cara, homem proibido, que retribuiu e ela passou a ser Alvoroçada pelo romance. Cada vez mais Animada, tornou-se Apaixonada. Na correspondência de sentimentos, mesmo fortuitos, sentiu-se Aconchegada e, logo a seguir, diríamos – Amigada. Na repetição amiúde dos encontros amorosos tornou-se Amasiada. Na paixão, o homem casado alugou um muquifo, ninho de amor, ao qual sede das volúpias e do tórrido sentimento. Amigas alertaram que ela nada mais era do que uma garota Amancebada e que deveria querer mais da vida. Para isso, deveria dar pressão no amante. A inútil pressão findou o relacionamento e ele passou a ser uma mulher Abandonada e, com contas a pagar, viu-se Atrapalhada, Atolada e Atormentada. Sua difícil vida Atravancada levou a revelar delírios de uma pessoa Alucinada, talvez Alocsada como dizem suas amigas. Agora Amargurada procura encontrar o trem de sua vida. Ah, os abecedários de nossas tragédias pessoais caberiam bem na caneta de Nelson Rodrigues.

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